O Diálogo de Deus com o Primeiro Casal
“8 E, ouvindo a voz do Senhor Deus, que passeava no jardim à tardinha, esconderam-se o homem e sua mulher da presença do Senhor Deus, entre as árvores do jardim.
9 Mas chamou o Senhor Deus ao homem, e perguntou-lhe: Onde estás?
10 Respondeu-lhe o homem: Ouvi a tua voz no jardim e tive medo, porque estava nu; e escondi-me.
11 Deus perguntou-lhe mais: Quem te mostrou que estavas nu? Comeste da árvore de que te ordenei que não comesses?
12 Ao que respondeu o homem: A mulher que me deste por companheira deu-me a árvore, e eu comi.
13 Perguntou o Senhor Deus à mulher: Que é isto que fizeste? Respondeu a mulher: A serpente enganou-me, e eu comi.” (Gên 3.8-13)
Devemos aprender do que Deus fez no Éden logo depois que o primeiro casal pecou. Aprender do diálogo que Ele teve com o homem e com a mulher logo depois da queda, e que antecedeu a maldição da serpente, da mulher, do homem e da terra por causa do pecado.
Quando Deus confrontou Adão e Eva no Éden depois da queda, e os amaldiçoou, bem como a serpente e toda a terra, não foi por um pequeno motivo.
O pecado conturbaria o propósito de Deus para a criação.
A humanidade sujeitada ao pecado e ao diabo passaria a ser, destrutiva, mentirosa, assassina das coisas boas e eternas, que Deus havia criado e especialmente aquelas que estavam sendo cultivadas no espírito do homem, como o amor, a bondade, a paz, a alegria, o domínio próprio, enfim, todas as virtudes que fazem parte do caráter do próprio Deus.
E quando Adão e Eva ouviram a voz do Senhor Deus, que andava no jardim pela viração do dia, esconderam-se da Sua presença entre as árvores do jardim (Gên 3.8).
Isto representava uma mudança dramática no relacionamento deles com Deus.
O endurecimento produzido pelo pecado se revelou no conteúdo e no modo das respostas que ambos deram a Deus, quando foram confrontados por Ele.
Nenhum dos dois mostrou arrependimento ou lamentou pelo que haviam feito.
Não demonstraram tristeza diante de Deus.
Não assumiram a própria culpa declarando-se culpados, ao contrário, deram respostas evasivas e com troca de acusações.
O pecado faz com que atribuamos os nossos fracassos a outros e não a nós mesmos.
Faz com que tentemos nos justificar condenando a outros.
E foi o que Adão e Eva fizeram quando foram confrontados por Deus. Eles haviam duvidado da bondade de Deus, e agora, no estado de pecado não creram, não confiaram na Sua graça e misericórdia para serem perdoados através do arrependimento e confissão da sua culpa.
Assim, eles ofenderam duplamente a Deus, quando fugiram da Sua presença, quando ouviram a Sua voz no jardim.
Eles o consideraram como alguém mal e disposto a destruí-los, e foi por isso que fugiram.
Eles tiveram medo de Deus porque viram que estavam nus.
Tinham vergonha de estarem nus, porque agora estavam sendo dominados por maus pensamentos.
E eles conheciam a santidade e pureza de Deus.
Na verdade eles queriam evitar Deus, se fosse possível. Mas o Senhor não os deixou entregues à própria sorte, e veio confrontá-los e prestar contas juntamente com eles dos atos que haviam praticado e das coisas que estavam sentindo.
Eles estavam endurecidos pelo pecado, conforme demonstraram em suas atitudes e respostas, e de nada adiantaria Deus argumentar com eles para convencê-los acerca da Sua graça e misericórdia.
Aquela era a hora das trevas, Satanás havia triunfado em seu intento de induzir o homem e a mulher ao pecado, e não restou a Deus senão a alternativa de punir o pecado, naquele momento, com a morte espiritual, pela quebra da comunhão de Adão e Eva com Ele, e pela punição da falta com o proferimento de maldições, e com a expulsão do homem e da mulher do jardim.
O pecado manifestou a sua face terrível e o seu poder de manter escravizada a alma humana.
Uma vez debaixo da escravidão do pecado, o homem fica dependente de que Deus use os meios de graça necessários para conduzi-lo ao arrependimento, para que possa ser libertado.
E somente o poder da graça de Deus pode libertar o homem da escravidão do pecado.
Somente o Filho Unigênito de Deus pode libertar aqueles que são escravos por natureza deste inimigo terrível que conduz o homem tanto à morte física, quanto espiritual e eterna.
O pecado é como um vício terrível ligado à alma humana, e do qual o homem não pode se livrar por si mesmo.
Ele pode entender que o que tem feito é errado.
Pode sentir vergonha da sua condição em pecado, tal como Adão e Eva sentiram.
Pode reconhecer que Deus é santo e que não pode estar em comunhão com Ele enquanto estiver escravizado ao pecado.
Pode saber que há um julgamento de Deus sobre o pecado.
Pode sentir a sua consciência culpada.
Pode fazer resoluções de mudar sua vida e deixar de fazer as coisas erradas que faz, mas não pode parar de pecar, nem pode se arrepender honestamente, porque o poder do pecado é maior do que todos os poderes que existem na natureza humana.
Somente o poder de Deus pode vencer o pecado.
E para tanto, o homem deve se sujeitar a Deus.
Deve pedir-lhe humildemente que o ajude a se livrar dessa escravidão que é mais forte do que tudo o que há no mundo.
Por isso a Bíblia indica ao homem qual é o caminho que ele deve seguir para obter o favor, a graça de Deus. Ele deve lamentar, chorar as suas misérias humildemente diante do Senhor, esperando que Ele estenda a Sua mão poderosa, e o liberte e o abençoe.
Adão e Eva tentaram cobrir a vergonha da sua nudez com folhas de figueira, mas isto não foi suficiente, porque a nudez do pecado é sentida no coração, e não pode ser acobertada.
Somente pela fé e pelo arrependimento é que pode ser coberta pelo sangue de Jesus.
Não há outro modo para se livrar da culpa do pecado, e alcançar uma boa consciência diante de Deus.
Conseguimos esta boa consciência pela certeza de que fomos de fato perdoados de todos os nossos pecados e que toda a nossa culpa foi removida, pelo sacrifício de Jesus, para o ato de justificação que nos reconciliou para sempre com Deus.
Aquele foi o pôr de sol mais triste já testemunhado pela história do mundo.
Pois foi naquele entardecer que a criação foi amaldiçoada por Deus.
E foi quando a amizade foi rompida e toda a humanidade passou a estar debaixo da ira de Deus.
A ira do julgamento do pecado que sujeitou o homem à morte, tal como havia sido alertado anteriormente.
As trevas do pecado receberam a justa sentença divina, e somente por meio do sangue de Jesus, o homem poderia voltar a ter paz com Deus.
“O Filho do homem veio buscar e salvar o perdido.” (Lc 19.10).
O próprio Jesus proferiu estas maravilhosas palavras quando se referiu à conversão de Zaqueu, o publicano.
E esta missão de buscar o pecador perdido começou no jardim do Éden, quando o Senhor Deus veio ao encontro de Adão e Eva depois de terem caído no pecado.
Como Ele lhes havia alertado que no dia em que eles O desobedecessem comendo o fruto, que lhes havia proibido, eles certamente morreriam, é bem provável que ambos tenham pensado que seriam aniquilados pela ira de Deus quando Ele os encontrasse, e por isso fugiram da Sua presença e tentaram se esconder entre as árvores do jardim.
Mas Deus veio buscar o pecador escondido.
E aqui nós achamos a primeira visão da graça, a primeira expressão de misericórdia, a primeira indicação de que poderia haver uma possibilidade para a reconciliação.
No verso 9 nós lemos: “E chamou o Senhor Deus ao homem, e lhe perguntou: Onde estás?”.
Isto não é certamente o que se poderia imaginar, porque se eles desobedecessem a Deus, eles iriam morrer, e pensamos em algum ato imediato de julgamento divino caindo sobre as cabeças deles. Mas ao invés, nós achamos Deus iniciando uma confrontação que começa de uma forma muito branda.
Aqui está revelada pela primeira vez a verdade do evangelho: Deus busca o pecador e lhe pergunta onde ele está.
Há uma sentença de morte sobre o pecador, mas Deus vem buscá-lo para que possa ser salvo desta condenação.
O homem está morto em seus pecados, mas Deus vem buscá-lo para que tenha vida, e a tenha em abundância. E Deus ainda busca os pecadores.
A nossa própria consciência nos acusa e condena acerca do fato de sermos pecadores.
E Satanás é o grande acusador que nos aponta os nossos pecados e tenta nos fazer sentir que Deus não tem qualquer misericórdia para pessoas corrompidas pelo pecado como nós.
Mas neste ato de busca de Adão e Eva, depois de terem pecado, Deus revelou a grande mentira do diabo, e o quanto a nossa própria consciência sujeita ao pecado nos engana e é uma má consciência nos dizendo que não podemos ter confiança em que Deus possa ser bondoso e perdoador em relação a nós, um a vez tendo nós lhe ofendido de maneira tão terrível com os nossos pecados. Seria de se esperar vingança e ressentimento e não oportunidade e perdão.
Mas a graça superabundou onde abundou o pecado. A graça se revelou infinitamente rica, pela primeira vez, por Adão e Eva terem sido poupados pela longanimidade de Deus, apesar de não terem manifestado qualquer tipo de arrependimento em relação ao seu pecado.
A graça reteve a destruição deles.
Quando Deus perguntou a Adão onde ele estava, ele não o fez porque não soubesse onde ele havia se escondido, pois Ele sabe tudo, Ele é onisciente. Ele sabia onde Adão estava. O que Ele queria era que Adão reconhecesse a sua condição atual, e que confessasse o seu pecado, porque é Deus misericordioso, compassivo, longânimo, perdoador, e estava manifestando estes seus atributos a Adão de forma que ele pudesse achar lugar para o arrependimento.
A palavra "chamou", “ikrrá”, no mesmo versículo (3.9), “Chamou o Senhor Deus ao homem”, significa no hebraico o ato de chamar alguém para uma prestação de contas. É usada em várias passagens do Velho Testamento como por exemplo em Gên 12.18; 20.9; 26.9.10. Dt 25.8. Deus chama Adão para responder por seus atos perante Ele, mas é uma aproximação bastante compassiva.
Antes do pecado, Adão falava somente a verdade e amava somente a verdade, mas o engano havia entrado agora no seu coração. Ele não consegue ser inteiramente honesto em dizer em plena sinceridade a Deus tudo o que estava sentindo e pensando.
O pecado tem esta característica de levar o homem a ser indulgente para com as suas faltas, e ser parcial na justa avaliação delas.
E Adão não sentiu repulsa pelo seu pecado. Não ficou entristecido pelo fato de ter desagradado Aquele que tanto o amava e que lhe manifestava diretamente este amor todas as vezes que ia ter com ele no jardim.
E Adão não ficou horrorizado com o próprio pecado, ao contrário ele ficou horrorizado com Deus porque teve medo de Deus.
Ele teve medo das conseqüências, mas não teve nenhum temor em relação ao mal que havia aprisionado a sua mente e coração.
Depois de ter confrontado Adão, Deus confrontou Eva: “Disse o Senhor Deus à mulher: Que é isto que fizeste? Respondeu a mulher: A serpente me enganou, e eu comi.”. Adão não tentou proteger Eva. E cabia a ele, no casamento, a função de proteger a sua esposa.
Ao contrário, ele direcionou a atenção de Deus para ela, procurando achar alívio na sua própria responsabilidade.
Ele fez, como se costuma dizer popularmente: “tirou o corpo fora” e lançou toda a carga sobre sua esposa.
Aquela relação maravilhosa que havia antes do pecado foi inteiramente torcida.
E do mesmo modo que fez com Adão, Deus deu à mulher uma oportunidade para arrependimento quando lhe perguntou o que ela havia feito.
Mas, tal como o seu marido, a mulher não assumiu a sua culpa, e a jogou inteiramente sobre a serpente.
E pensou que poderia ser justificada perante Deus pelo fato de ter sido enganada pela serpente. “A culpa é toda do diabo.”.
É o que muitos pensam erroneamente. Há mesmo cristãos que pensam que tudo o que fazem de errado não é por causa do seu próprio pecado, mas que é sempre por causa do diabo.
“Foi o diabo que me fez fazer aquilo. Não fui eu o culpado. O culpado foi o diabo!”.
É muito comum se ouvir isto. Ainda que não se possa inocentar o maligno que veio realmente roubar, matar e destruir, sendo ele o pai da mentira, nem por isso, não podemos transferir a responsabilidade pelos nossos maus pensamentos e atos inteiramente para a conta de Satanás.
Como afirma Tiago: “Cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz.” (Tg 1.15).
O homem é inteiramente responsável por todos os seus atos. A cura está portanto em exatamente reconhecer esta responsabilidade e confessá-la a Deus. Porque isto é a verdade quanto à nossa condição em relação ao pecado. E é portanto somente confessando a própria culpa que se pode achar o favor e graça de Deus.