Graça e Misericórdia
A eleição não está baseada na justiça ou méritos das pessoas, senão na exclusiva misericórdia e justiça de Deus, que escolhe pecadores, e que chama, portanto pecadores e não justos para comporem as fileiras dos Seus eleitos.
Assim, Deus se provê de filhos dentre pecadores, pois fora de Cristo, não há um só justo diante dEle, pois todos foram encerrados no pecado por causa do pecado original de Adão.
Este caráter da eleição está revelado na própria eleição da nação de Israel, como povo da aliança com Deus, como se lê em Deuteronômio 9.3-6.
Não era por não serem pecadores como os cananeus que os israelitas os desapossariam da terra prometida.
Tal se dá com os eleitos de Deus para a salvação: não é por serem menos pecadores do que as demais pessoas que são reconciliados com Deus, por meio de Jesus Cristo.
Os pecados da nação eleita estavam registrados no livro da Lei, para protestar contra eles, para revelar esta verdade de que estavam herdando a terra pela misericórdia e fidelidade de Deus à promessa que fizera aos patriarcas, mas não por causa de qualquer justiça própria que houvesse na nação.
Por isso Moisés lhes relembrou algumas das ocasiões em que o pecado deles se manifestou em tal grau, que foi submetido a duros juízos da parte do Senhor, como o fabrico do bezerro de ouro (v. 12), e a ira de Deus foi provocada por aquele pecado a ponto dEle ter desejado destruir todos os israelitas, inclusive o próprio Arão, e formar uma nova nação a partir de Moisés (v. 14, 17-20).
Moisés lhes relembrou também a murmuração de Taberá, de Massá, de Quibrote-Hataavá em que os israelitas provocaram a ira do Senhor (v. 22), pecados estes que são citados no livro de Números.
A incredulidade de Cades-Barneia (v. 23) também foi citada por Moisés para que fizesse a seguinte conclusão no verso 24:
“Tendes sido rebeldes contra o Senhor desde o dia em que vos conheci.”
Então, não seria por causa da própria justiça da nação israelita, que aquelas nações seriam vencidas por eles em Canaã.
Assim como não é em razão da própria justiça da Igreja de Cristo, que Ele salva os pecadores e abençoa o Seu povo.
É por causa da justiça dEle e não da nossa, que somos abençoados por Deus.
Ainda que se exija de nós um caminhar na justiça e que tenhamos uma posição bem firme contra o pecado, sempre será por causa dos méritos de Cristo e da Sua justiça que seremos aceitos e abençoados por Deus, e nunca pelos nossos próprios méritos e justiça própria.
Nossas melhores obras sempre estarão de alguma forma, maculadas pelo pecado, e assim não podem ser a causa da bênção de Deus.
O que se requer de nós é que creiamos nEle, que nos disponhamos a obedecer a Sua vontade e que nos empenhemos nisto com toda a diligência, mas nunca será o nosso elevado grau de santificação a causa de sermos abençoados por Ele, e particularmente termos vitórias sobre os nossos inimigos.
Afinal todo o bem espiritual que houver em nós, é puro fruto da Sua graça.
Se falharmos nesta caminhada e pecarmos, devemos lembrar que temos um Advogado junto ao Pai, e um Parácleto para nos ajudar na terra, e a misericórdia e longanimidade de Deus, e a cobertura da justiça e dos méritos de Cristo, e então, com inteira certeza de fé, devemos confessar e abandonar o pecado, sabendo que o Senhor será propício a nós, porque não estamos baseando a nossa comunhão com Ele confiados na nossa própria justiça, senão e unicamente na Sua justiça e misericórdia.
Em sua intercessão em favor dos israelitas, para que não fossem destruídos por Deus, em razão dos seus pecados, Moisés invocava a aliança feita com Abraão, Isaque e Jacó:
“Lembra-te dos teus servos, Abraão, Isaque e Jacó; não atentes para a dureza deste povo, nem para a sua iniquidade, nem para o seu pecado;” (v. 27).
Os cristãos da Igreja de Cristo devem argumentar com Deus para receberem o favor do perdão dos seus pecados, se referindo à aliança que Deus fez com eles através do sangue de Jesus.
Da aliança que Ele fez com o Filho desde antes da fundação do mundo, de que perdoaria nEle a iniquidade do Seu povo.
Há gigantes para serem vencidos neste mundo, assim como os israelitas deveriam lutar com os anaquins em Canaã, mas Deus tem assegurado a vitória ao Seu povo, pela promessa da Sua presença conosco, e é Ele mesmo quem os destrói por amor de nós (v. 3).
Na verdade, todas as conquistas espirituais são operações da exclusiva graça de Jesus.
Sem Ele nada podemos fazer, não somente em relação à nossa salvação, como também em relação à Sua obra.
De onde vem o poder e instrução para se pregar e ensinar de forma a que sejam movidos e convertidos corações?
Isto não está em nós. Vem de Deus, quando quer, onde quer e com quem quiser.
O maior pregador é menos do que palha se o Espírito de Deus não usá-lo como Seu instrumento.
Esta unção nunca será por causa da sua própria justiça, mas pela de Cristo, com a qual está vestido, para que suas obras sejam aceitas por Deus.
Quantos ministros fracassam em seus ministérios porque roubam para si a glória, que é exclusiva do Senhor. Eles pensam que são poderosos em si mesmos, ou que alcançaram isto em Cristo em certo período, para agora não mais dependerem dEle.
Os israelitas foram lembrados por Moisés, que foi pela pura obra da misericórdia que eles não foram destruídos por Deus no deserto. E de igual modo e pelo mesmo motivo os cristãos não são destruídos.
Moisés se esforçou para trazer estas coisas na lembrança dos israelitas, porque somos hábeis em esquecer as nossas provocações da ira do Senhor, especialmente quando cessa a ação da Sua vara de correção.
Mas se temos a humildade de reconhecer que não há nenhum bem na nossa natureza terrena, então somos livrados do pecado do orgulho, que se baseie na nossa própria justiça.
Estes argumentos em favor da justiça de Deus contra a justiça própria. Em favor da graça divina contra as obras meritórias humanas, não tinham logicamente em vista defender a aberração de se pensar em favor de se praticar o pecado para que possa ser manifestada a misericórdia de Deus.
Ao contrário, lembra do dever do povo de Deus de se empenhar na busca de santidade, porque a natureza terrena sempre há de prevalecer, provocando a justa ira do Senhor, quando se deixa de ter a devida vigilância contra o pecado, e uma vida de oração incessante.
A graça e a misericórdia se mostram abundantes, porque Deus conhece perfeitamente a corrupção que há nos nossos corações, e não interrompe o trabalho de santificação e correção por causa destas corrupções, ainda que as abomine, por ser inteiramente Santo e Justo.
Ele sabe como preservar o Seu povo, ainda que constituído de pecadores, e ainda que o furor do atributo da ira divina clame pela sua destruição, entra também em cena os atributo do amor, da misericórdia, e da longanimidade, de modo que assim como fez com Israel, preservando-os da destruição merecida por suas más obras, faz em relação aos cristãos da Igreja de Cristo, prosseguindo pacientemente a operar neles com o trabalho de aperfeiçoamento espiritual.
“Pois quê? Havemos de pecar porque não estamos debaixo da lei, mas debaixo da graça? De modo nenhum. Não sabeis que daquele a quem vos apresentais como servos para lhe obedecer, sois servos desse mesmo a quem obedeceis, seja do pecado para a morte, ou da obediência para a justiça?” (Rm 6.15,16).
Destes versículos da epístola aos Romanos podemos inferir que cristãos fiéis e infiéis não receberão o mesmo tratamento e bênçãos da parte de Deus.
A distinção que é prometida por Deus em honrar os que Lhe honrarem não será vista apenas neste mundo, como por toda a eternidade, pois o galardão será diferente de acordo com as nossas obras feitas no Senhor e para Ele.
Elas indicarão o grau do nosso compromisso com Ele e fidelidade à Sua vontade.
Por conseguinte, mesmo em face da verdade da bênção da conquista de Canaã, que não seria feita com base na justiça dos israelitas, eles foram exortados à prática da justiça, pelo cumprimento dos mandamentos do Senhor, para o Seu inteiro agrado; pois Deus não se agrada da injustiça e do pecado, em quaisquer de suas manifestações e formas, senão da justiça e da verdade.
Tanto que os israelitas foram expulsos da terra de Canaã, por causa do pecado, pelos assírios, babilônios e romanos.
Ainda que tenhamos sido salvos pela justiça de Jesus, e ainda que sejamos também abençoados com base na Sua justiça, é nosso dever viver de modo agradável a Deus, e isto não poderá ser feito sem que nos esforcemos na prática da justiça, conforme visto nos versículos destacados no sexto capítulo da epístola aos Romanos.
Os filhos de Deus devem se santificar porque Ele é santo. Devem praticar a justiça porque Ele é justo. Devem andar na verdade porque Ele é a verdade. Devem amar, porque Ele é amor. Devem odiar o pecado porque Ele é um fogo consumidor que odeia o pecado.
A Canaã celestial será conquistada por pecadores, mas por pecadores remidos, que manterão a posse da herança prometida, por meio do trabalho da graça, que os transformará em pessoas perfeitamente santas e justas, assim como é o Seu Pai celestial.
Mas, enquanto neste mundo, todos os servos de Deus devem lembrar, que do mesmo modo que a ira do Senhor ardeu contra o pecado de Arão, que sem sombra de dúvida, era um dos eleitos de Deus, de igual modo o caráter de nenhum homem, seja cristão ou não, poderá abrigá-lo da ira de Deus, se ele se fizer companheiro das obras das trevas.
Entretanto nunca devemos esquecer que o que qualquer pecador merece, seja cristão ou não cristão, é a justa condenação e maldição de Deus, mas pela Sua exclusiva misericórdia Ele determinou livrar eternamente da Sua ira e maldição a todo aquele que tiver lavado as suas vestes no sangue do Cordeiro, que tira o pecado do mundo, o nosso amado e bendito Salvador e Senhor.
“1 Ouve, ó Israel: hoje tu vais passar o Jordão para entrares para desapossares nações maiores e mais fortes do que tu, cidades grandes e muradas até o céu;
2 um povo grande e alto, filhos dos anaquins, que tu conhecestes, e dos quais tens ouvido dizer: Quem poderá resistir aos filhos de Anaque?
3 Sabe, pois, hoje que o Senhor teu Deus é o que passa adiante de ti como um fogo consumidor; ele os destruirá, e os subjugará diante de ti; e tu os lançarás fora, e cedo os desfarás, como o Senhor te prometeu.
4 Depois que o Senhor teu Deus os tiver lançado fora de diante de ti, não digas no teu coração: por causa da minha justiça é que o Senhor me introduziu nesta terra para a possuir. Porque pela iniquidade destas nações é que o Senhor as lança fora de diante de ti.
5 Não é por causa da tua justiça, nem pela retidão do teu coração que entras a possuir a sua terra, mas pela iniquidade destas nações o Senhor teu Deus as lança fora de diante de ti, e para confirmar a palavra que o Senhor teu Deus jurou a teus pais, Abraão, Isaque e Jacó.
6 Sabe, pois, que não é por causa da tua justiça que o Senhor teu Deus te dá esta boa terra para a possuíres, pois tu és povo de dura cerviz.
7 Lembra-te, e não te esqueças, de como provocaste à ira o Senhor teu Deus no deserto; desde o dia em que saíste da terra do Egito, até que chegaste a este lugar, foste rebelde contra o Senhor;
8 também em Horebe provocastes à ira o Senhor, e o Senhor se irou contra vós para vos destruir.
9 Quando subi ao monte a receber as tábuas de pedra, as tábuas do pacto que o Senhor fizera convosco, fiquei no monte quarenta dias e quarenta noites; não comi pão, nem bebi água.
10 E o Senhor me deu as duas tábuas de pedra, escritas com o dedo de Deus; e nelas estavam escritas todas aquelas palavras que o Senhor tinha falado convosco no monte, do meio do fogo, no dia da assembleia.
11 Sucedeu, pois, que ao fim dos quarenta dias e quarenta noites, o Senhor me deu as duas tábuas de pedra, as tábuas do pacto.
12 E o Senhor me disse: Levanta-te, desce logo daqui, porque o teu povo, que tiraste do Egito, já se corrompeu; cedo se desviaram do caminho que eu lhes ordenei; fizeram para si uma imagem de fundição.
13 Disse-me ainda o Senhor: Atentei para este povo, e eis que ele é povo de dura cerviz;
14 deixa-me que o destrua, e apague o seu nome de debaixo do céu; e farei de ti nação mais poderosa e mais numerosa do que esta.
15 Então me virei, e desci do monte, o qual ardia em fogo; e as duas tábuas do pacto estavam nas minhas duas mãos.
16 Olhei, e eis que havíeis pecado contra o Senhor vosso Deus; tínheis feito para vós um bezerro de fundição; depressa vos tínheis desviado do caminho que o Senhor vos ordenara.
17 Peguei então das duas tábuas e, arrojando-as das minhas mãos, quebrei-as diante dos vossos olhos.
18 Prostrei-me perante o Senhor, como antes, quarenta dias e quarenta noites; não comi pão, nem bebi água, por causa de todo o vosso pecado que havíeis cometido, fazendo o que era mau aos olhos do Senhor, para o provocar a ira.
19 Porque temi por causa da ira e do furor com que o Senhor estava irado contra vós para vos destruir; porém ainda essa vez o Senhor me ouviu.
20 O Senhor se irou muito contra Arão para o destruir; mas também orei a favor de Arão ao mesmo tempo.
21 Então eu tomei o vosso pecado, o bezerro que tínheis feito, e o queimei a fogo e o pisei, moendo-o bem, até que se desfez em pó; e o seu pó lancei no ribeiro que descia do monte.
22 Igualmente em Taberá, e em Massá, e em Quibrote-Hataavá provocastes à ira o Senhor.
23 Quando também o Senhor vos enviou de Cades-Barneia, dizendo: Subi, e possuí a terra que vos dei; vós vos rebelastes contra o mandado do Senhor vosso Deus, e não o crestes, e não obedecestes à sua voz.
24 Tendes sido rebeldes contra o Senhor desde o dia em que vos conheci.
25 Assim me prostrei perante o Senhor; quarenta dias e quarenta noites estive prostrado, porquanto o Senhor ameaçara destruir-vos.
26 Orei ao Senhor, dizendo: ó Senhor Jeová, não destruas o teu povo, a tua herança, que resgataste com a tua grandeza, que tiraste do Egito com mão forte.
27 Lembra-te dos teus servos, Abraão, Isaque e Jacó; não atentes para a dureza deste povo, nem para a sua iniquidade, nem para o seu pecado;
28 para que o povo da terra de onde nos tiraste não diga: Porquanto o Senhor não pôde introduzi-los na terra que lhes prometera, passou a odiá-los, e os tirou para os matar no deserto.
29 Todavia são eles o teu povo, a sua herança, que tiraste com a sua grande força e com o teu braço estendido.“ (Dt 9.1-29).