Forte no Espírito na Velhice
A vida de Davi havia alcançado a noite da velhice, na qual ninguém pode trabalhar, e que lhe impedia agora de fazer as entradas e saídas com o exército de Israel, que lhe haviam tornado famoso.
O seu corpo não gerava o calor necessário para ser retido pelas cobertas que colocavam sobre ele, de maneira que para mantê-lo aquecido foi necessário colocar junto dele uma fonte de calor, que pudesse ser mantido pelas cobertas, e assim, aquecesse o rei.
E acharam esta fonte numa jovem de nome Abisague, da qual se diz que era muito formosa, provavelmente, para revelar a que ponto de debilidade Davi havia chegado nestes últimos dias da sua velhice, pois também se afirma que ele não a conheceu, isto é, não tocou nela.
As condições em que Davi se encontrava são descritas no primeiro capítulo de I Reis para explicar as razões pelas quais Adonias se proclamou rei, pois julgava que o seu pai não teria condições de cuidar da situação, e impedi-la pessoalmente.
Davi ainda estava colhendo, mesmo na sua velhice, o fruto do que havia semeado, porque se diz no verso 6 que nunca havia contrariado Adonias, não lhe pedindo qualquer satisfação dos seus atos, isto é, ele não o disciplinou, e o deixando entregue a si mesmo, Adonias lhe considerou um tolo desprezível na sua velhice, e não o respeitou nem lhe honrou, quer como rei, quer como pai, pois proclamou rei a si mesmo, contra a vontade de Davi, enquanto este ainda vivia, e isto viria a precipitar a sucessão de acontecimentos, que foram necessários para conduzir Salomão ao trono, antes que Davi morresse.
Certamente, Davi esperava que a subida de Salomão ao trono seria feita em paz, depois que ele morresse, em respeito à sua vontade e à de Deus, que havia revelado através de Natã, desde o dia do nascimento de Salomão, que ele deveria ser o futuro rei de Israel.
A questão da sucessão devia estar sendo debatida há muito tempo, à medida que a morte de Davi se aproximava, e não é improvável que muitos devam ter lembrado a Adonias que o direito à sucessão lhe pertencia, por terem morrido Amnom e Absalão.
Então, decidiu seguir no mesmo caminho de Absalão, rebelando-se contra a vontade de Deus e à de seu pai, que ele bem conhecia (I Reis 2.15).
Ele se sentiu ainda mais encorajado a suplantar a própria vontade de Deus porque tinha ao seu lado, não apenas o general do exército de Israel, Joabe, mas o próprio sumo-sacerdote, Abiatar, e se este estava ao seu lado, era bem possível, segundo o seu juízo, que Deus tivesse mudado os Seus planos.
Na verdade, Deus estava levando a cumprimento o Seu plano através daquelas circunstâncias, porque Abiatar seria o último sumo-sacerdote da casa de Eli, ocupando aquele sagrado ofício, por causa da palavra de juízo que o Senhor havia proferido contra Eli e a sua casa.
E Joabe receberia a justa retribuição pelo sangue de Abner e de Amasa, que havia derramado injustamente.
Então, não era o lado aparentemente mais forte que tinha a razão e venceria, mas como não pode deixar de ser, o lado em que Deus estava, independentemente da sua força.
“Conheço a tua tribulação e a tua pobreza mas tu és rico, e a blasfêmia dos que dizem ser judeus, e não o são, porém são sinagoga de Satanás.” (Apo 2.9).
“Conheço as tuas obras (eis que tenho posto diante de ti uma porta aberta, que ninguém pode fechar), que tens pouca força, entretanto guardaste a minha palavra e não negaste o meu nome.” (Apo 3.8).
Não conhecendo isto, e não sabendo que o homem não prevalecerá pela força (I Sm 2.9), Adonias, com o propósito de exibir determinação e força, tal como fizera Absalão antes dele, fazia-se acompanhar de um cortejo de carros, cavaleiros e cinquenta homens que lhe precediam em seus deslocamentos (I Reis 1.5).
Isto tinha por objetivo impressionar o povo e influenciá-lo psicologicamente, quanto a formarem um juízo que ele tinha um porte majestoso, e portanto era a ele que cabia ocupar o trono.
E a beleza física que possuía, muito contribuiu para a formação deste juízo (I Reis 1.6).
Entretanto Deus não olha a aparência do homem, mas o coração, e certamente, o de Adonias não era segundo o Seu coração.
Natã, Zadoque, Benaia e os valentes de Davi permaneceram leais a este e à sua vontade, e não aderiram a Adonias (v. 8).
O fato de não ter ao seu lado os valentes relacionados no capítulo 23 de II Samuel, e os seiscentos homens de Itai, o filisteu de Gate, designados no verso 37, por quereteus e peleteus, que também permaneceram leais ao rei, configuraria um grave empecilho para que Adonias conseguisse subir ao trono, mas na sua exaltação, não mediu as consequências do seu comportamento e prosseguiu levando adiante o seu plano de ser proclamado rei, e para isto ofereceu um banquete em En-Rogel, convocando todos os notáveis do reino, exceto a estes que citamos anteriormente, e que permaneceram ao lado de Davi.
É curioso observar que junto a estes que permaneceram leais a Davi, figura o nome de Simei no verso oitavo, aquele que havia amaldiçoado Davi, quando fugia de Absalão.
Certamente, ele não o estava fazendo por motivo de fidelidade, mas de conveniência, pois sabia do desejo de Joabe de matá-lo, e este havia se colocado ao lado de Adonias, e não de Salomão, assim ele procurou o lado em que, segundo ele, estaria mais seguro, porque Davi havia lhe jurado que não o mataria, quando Simei foi ter com ele, quando voltava de Maanaim para Jerusalém, para reassumir o trono.
A iniciativa para se contrapor a Adonias foi tomada pelo profeta Natã, que pediu a Bate-Seba que falasse ao rei sobre o juramento que fizera a ela de que Salomão seria o seu sucessor, e que logo depois que ela lhe tivesse falado, ele entraria em seguida, e endossaria suas palavras quanto às cousas que Adonias estava fazendo para ser conduzido ao trono, e assim toda palavra seria confirmada pelo depoimento de duas testemunhas, segundo exigido pela Lei, para que o rei pudesse deliberar de forma convicta e decidida sobre o caso.
E se cobertas não conseguiam aquecer o corpo de Davi, o comportamento de Adonias aqueceria a sua ira, a ponto de ter encontrado no Senhor, forças para as providências que deveriam ser tomadas para que Salomão começasse a reinar imediatamente, ainda que o fizesse estando ele em vida, porque Adonias tentou fazê-lo sem sua autorização e desrespeitando não somente a ordem natural das coisas como a sua própria autoridade de pai.
Então, Davi agiu não somente para poupar Natã, Zadoque, Salomão e Bate-Seba da morte, caso Adonias assumisse o trono, em retaliação àqueles que se opuseram a ele, como também para revelar que o Deus vivo agia nele e ainda o fortalecia, quando necessário, para cumprir tudo o que lhe havia ordenado.
Assim, determinou que Salomão fosse montado na sua mula e que fosse conduzido a Giom, escoltado por Benaia, e por todos os valentes do reino, onde Natã e Zadoque deveriam ungi-lo como rei sobre todo Judá e Israel, e depois disso, deveria voltar para Jerusalém com um grande séquito que proclamaria no caminho e na cidade, que Salomão reinava.
Quando todos que estavam com Adonias em En-Rogel o souberam, ficaram apavorados e fugiram, e Adonias foi buscar abrigo junto ao altar do holocausto, segurando os seus chifres, para que não fosse morto por Salomão.
Todavia, logrou achar graça perante ele, que ordenou que sua vida fosse poupada caso não agisse com dolo.
Mas nós vemos adiante, no relato de I Reis, que ele não soube fazer bom uso da graça que lhe foi concedida, e tendo abusado dela veio a dar ocasião, ele próprio, a que fosse morto por Benaia, a mando de Salomão, agora já não apenas na condição de comandante da guarda pessoal do rei, mas na de general de todo o exército de Israel, cargo em que foi empossado por Salomão, logo no início do seu reinado.
São dignas de nota as palavras de Davi registradas no verso 29, que o Deus vivo havia remido a sua alma de toda a angústia, e também o livraria daquela a que estava sendo submetido no final da sua vida.
Elas dão testemunho da sua fé inabalável no Deus que havia cumprido cada uma das promessas que lhe fizera, ao longo do curso da sua vida, ainda que no meio de variadas angústias, das quais o Senhor lhe havia livrado.
Ele sabia que lhe cabia tomar as providências necessárias, para que se cumprisse tudo que o Senhor havia determinado, mas nunca lhe faltou a certeza de que Deus jamais falharia no cumprimento de qualquer uma das Suas promessas.
Assim, nós vemos no final deste capítulo, Salomão e não Adonias, reinando sobre Israel.
“1 Ora, o rei Davi era já velho, de idade mui avançada; e por mais que o cobrissem de roupas não se aquecia.
2 Disseram-lhe, pois, os seus servos: Busque-se para o rei meu senhor uma jovem donzela, que esteja perante o rei, e tenha cuidado dele; e durma no seu seio, para que o rei meu senhor se aqueça.
3 Assim buscaram por todos os termos de Israel uma jovem formosa; e acharam Abisague, a sunamita, e a trouxeram ao rei.
4 Era a jovem sobremaneira formosa; e cuidava do rei, e o servia; porém o rei não a conheceu.
5 Então Adonias, filho de Hagite, se exaltou e disse: Eu reinarei. E preparou para si carros e cavaleiros, e cinquenta homens que corressem adiante dele.
6 Ora, nunca seu pai o tinha contrariado, dizendo: Por que fizeste assim? Além disso, era ele muito formoso de parecer; e era mais moço do que Absalão.
7 E teve entendimento com Joabe, filho de Zeruia, e com o sacerdote Abiatar, os quais aderiram a ele e o ajudavam.
8 Mas Zadoque, o sacerdote, e Benaia, filho de Jeoiada, e Natã, o profeta, e Simei, e Rei, e os valentes que Davi tinha, não eram por Adonias.
9 Adonias matou ovelhas, bois e animais cevados, junto à pedra de Zoelete, que está perto de En-Rogel; e convidou a todos os seus irmãos, os filhos do rei, e a todos os homens de Judá, servos do rei;
10 porém a Natã, o profeta, e a Benaia, e aos valentes, e a Salomão, seu irmão, não os convidou.
11 Então falou Natã a Bate-Seba, mãe de Salomão, dizendo: Não ouviste que Adonias, filho de Hagite, reina? e que nosso senhor Davi não o sabe?
12 Vem, pois, agora e deixa-me dar-te um conselho, para que salves a tua vida, e a de teu filho Salomão.
13 Vai à presença do rei Davi, e dize-lhe: Não juraste, ó rei meu senhor, à tua serva, dizendo: Certamente teu filho Salomão reinará depois de mim, e se assentará no meu trono? Por que, pois, reina Adonias?
14 Eis que, estando tu ainda a falar com o rei, eu também entrarei depois de ti, e confirmarei as tuas palavras.
15 Foi, pois, Bate-Seba à presença do rei na sua câmara. Ele era mui velho; e Abisague, a sunamita, o servia.
16 Bate-Seba inclinou a cabeça, e se prostrou perante o rei. Então o rei lhe perguntou: Que queres?
17 Respondeu-lhe ela: Senhor meu, tu juraste à tua serva pelo Senhor teu Deus, dizendo: Salomão, teu filho, reinará depois de mim, e se assentará no meu trono.
18 E agora eis que Adonias reina; e tu, ó rei meu senhor, não o sabes.
19 Ele matou bois, animais cevados e ovelhas em abundância, e convidou a todos os filhos do rei, e a Abiatar, o sacerdote, e a Joabe, general do exército; mas a teu servo Salomão não o convidou.
20 Mas, ó rei meu senhor, os olhos de todo o Israel estão sobre ti, para que lhes declares quem há de assentar-se no teu trono depois de ti.
21 Doutro modo sucederá que, quando o rei meu senhor dormir com seus pais, eu e Salomão meu filho seremos tidos por ofensores.
22 Enquanto ela ainda falava com o rei, eis que chegou o profeta Natã.
23 E o fizeram saber ao rei, dizendo: Eis aí está o profeta Natã. Entrou Natã à presença do rei, inclinou-se perante ele com o rosto em terra,
24 e disse: ó rei meu senhor, acaso disseste: Adonias reinará depois de mim, e se assentará no meu trono?
25 Pois ele hoje desceu, e matou bois, animais cevados e ovelhas em abundância, e convidou a todos os filhos do rei, e aos chefes do exército, e ao sacerdote Abiatar; e eis que comem e bebem perante ele, e dizem: Viva o rei Adonias!
26 Porém a mim teu servo, e ao sacerdote Zadoque, e a Benaia, filho de Jeoiada, e ao teu servo Salomão, não convidou.
27 Foi feito isso da parte do rei meu senhor? e não fizeste saber a teu servo quem havia de assentar-se no teu trono depois de ti?
28 Respondeu o rei Davi: Chamai-me a Bate-Seba. E ela entrou à presença do rei, e ficou de pé diante dele.
29 Então o rei jurou, dizendo: Vive o Senhor, o qual remiu a minha alma de toda a angústia,
30 que, assim como te jurei pelo Senhor Deus de Israel, dizendo: Teu filho Salomão há de reinar depois de mim, e ele se assentará no meu trono, em meu lugar; assim mesmo o cumprirei hoje.
31 Então Bate-Seba, inclinando-se com o rosto em terra perante o rei, fez-lhe reverência e disse: Viva para sempre o rei Davi meu senhor!
32 Depois disse o rei Davi: Chamai-me a Zadoque, o sacerdote, e a Natã, o profeta, e a Benaia, filho de Jeoiada. E estes entraram à presença do rei.
33 E o rei lhes disse: Tomai convosco os servos de vosso senhor, fazei montar meu filho Salomão na minha mula, e levai-o a Giom.
34 E Zadoque, o sacerdote, com Natã, o profeta, ali o ungirão rei sobre Israel. E tocareis a trombeta, e direis: Viva o rei Salomão!
35 Então subireis após ele, e ele virá e se assentará no meu trono; pois reinará em meu lugar, porquanto o tenho designado para ser príncipe sobre Israel e sobre Judá.
36 Ao que Benaia, filho de Jeoiada, respondeu ao rei, dizendo: Amém; assim o diga também o Senhor Deus do rei meu senhor.
37 Como o Senhor foi com o rei meu senhor, assim seja ele com Salomão, e faça que o seu trono seja maior do que o trono do rei Davi meu senhor.
38 Pelo que desceram Zadoque, o sacerdote, e Natã, o profeta, e Benaia, filho de Jeoiada, e os quereteus, e os peleteus, e fizeram montar Salomão na mula que era do rei Davi, e o levaram a Giom.
39 Então Zadoque, o sacerdote, tomou do tabernáculo o vaso do azeite e ungiu a Salomão. Então tocaram a trombeta, e todo o povo disse: Viva o rei Salomão!
40 E todo o povo subiu após ele, tocando flauta e alegrando-se sobremaneira, de modo que a terra retiniu com o seu clamor.
41 Adonias e todos os convidados que estavam com ele o ouviram, ao acabarem de comer. E ouvindo Joabe o soar das trombetas, disse: Que quer dizer este alvoroço na cidade?
42 Ele ainda estava falando, quando chegou Jônatas, filho de Abiatar, o sacerdote; e disse Adonias: Entra, porque és homem de bem, e trazes boas novas.
43 Respondeu Jônatas a Adonias: Deveras! O rei Davi, nosso senhor, constituiu rei a Salomão.
44 E o rei enviou com ele Zadoque, o sacerdote, e Natã, o profeta, e Benaia, filho de Jeoiada, os quereteus e os peleteus; e eles o fizeram montar na mula do rei.
45 E Zadoque, o sacerdote, e Natã, o profeta, ungiram-no rei em Giom; e dali subiram cheios de alegria, e a cidade está alvoroçada. Este é o clamor que ouvistes.
46 E Salomão já está assentado no trono do reino.
47 Além disso os servos do rei vieram abençoar o nosso senhor, o rei Davi, dizendo: Faça teu Deus o nome de Salomão mais célebre do que o teu nome, e faça o seu trono maior do que o teu trono. E o rei se inclinou no leito.
48 Também assim falou o rei: Bendito o Senhor Deus de Israel, que hoje tem dado quem se assente no meu trono, e que os meus olhos o vissem.
49 Então, tomados de pavor, levantaram-se todos os convidados que estavam com Adonias, e cada qual se foi seu caminho.
50 Adonias, porém, temeu a Salomão e, levantando-se, foi apegar-se às pontas do altar.
51 E foi dito a Salomão: Eis que Adonias teme ao rei Salomão; pois que se apegou às pontas do altar, dizendo: Jure-me hoje o rei Salomão que não matará o seu servo à espada.
52 Ao que disse Salomão: Se ele se houver como homem de bem, nem um só de seus cabelos cairá em terra; se, porém, se houver dolosamente, morrerá.
53 Então o rei Salomão deu ordem, e tiraram Adonias do altar. E vindo ele, inclinou-se perante o rei Salomão, o qual lhe disse: Vai para tua casa.” ( I Rs 1.1-53).