A Sabedoria Dada a Salomão
Nós devemos iniciar o comentário do 3º capítulo de I Reis com o seu terceiro versículo, porque nele se diz que Salomão amava ao Senhor, e andava nos estatutos de Davi.
Contudo, se diz também que ele oferecia sacrifício e queimava incenso nos altos.
Salomão, assim como o povo de Israel, continuavam sacrificando nos altos contra as prescrições contidas na Lei de Moisés.
E é dito no verso 4 que ofereceu de uma só vez mil holocaustos no altar que se encontrava em Gibeom.
Todavia, muito contribuiu para esta prática de Salomão, e que era a de muitos israelitas, o fato de o culto do tabernáculo ter sido desestruturado desde os dias do sumo sacerdote Eli.
A arca se encontrava em Jerusalém, na tenda que Davi construíra para ela, e o altar do holocausto e as demais peças do tabernáculo se encontravam em Gibeom (II Crôn 1.3).
O desprezo pelo serviço do tabernáculo, que começou com os dois filhos de Eli em Siló, desestruturou de tal maneira as ordenanças cerimoniais, que o povo de Israel, desde então oferecia sacrifícios nos altares que se espalharam por toda a nação (I Reis 3.2).
Esta prática estava sendo tolerada por Deus, mas o desprezo à Lei viria a custar um alto preço para eles até os dias do cativeiro, porque mesmo depois do templo ter sido construído por Salomão, e ter sido reestruturado tudo o que era determinado na Lei sobre o ofício sacerdotal, a prática de oferecer sacrifícios nos altos estava tão arraigada no povo, que eles nunca foram curados completamente deste mal, e chegaram a ponto de oferecer os seus sacrifícios a outros deuses, como viria a fazer o próprio Salomão em sua velhice (I Reis 11).
Todo o esforço de Deus para reconduzir o Seu povo à prática da Lei, pelo ministério dos profetas, não recebeu a devida atenção, e não Lhe restou alternativa de expulsá-los da sua própria terra, através dos cativeiros assírio e babilônico.
Salomão era ainda muito jovem e amava e andava nos caminhos do Senhor, quando esteve em Gibeom, lhe oferecendo aqueles mil holocaustos no altar de bronze do tabernáculo.
Quando ainda se encontrava em Gibeom, Deus lhe falou à noite em sonhos, e provou o seu coração, dizendo que Lhe pedisse o que queria que Ele lhe desse.
E foi o subconsciente de Salomão que respondeu ao Senhor, porque ele estava dormindo (v. 15).
E ele não pediu nada para si mesmo, senão para o bem do povo do Senhor.
O seu desejo era o de honrar e agradar ao Deus de seu pai, que havia usado de grande benevolência para com ele, e Salomão sabia bem no fundo do seu coração que o modo de servir a Deus está em servir ao Seu povo, e por isso pediu entendimento para discernir entre bem e mal, de maneira a conduzir o povo do Senhor com justiça.
Deus se agradou tanto daquela resposta, que não trazia em si nenhum interesse próprio de busca de grandeza pessoal, que prometeu dar a Salomão não apenas a sabedoria que ele havia pedido, mas lhe daria muito mais do que isto, porque a daria numa maior medida do que a qualquer outro homem sobre a terra, e como o coração de Salomão não estava apegado a longevidade, riqueza e ao desejo de subjugar os seus inimigos, então lhe daria riquezas e glória maiores em seu reino do que as de qualquer outro rei que vivesse em seus dias (v. 13).
E ainda, caso Salomão andasse nos Seus caminhos, lhe daria longevidade (v. 14).
E o modo de andar no Seu caminho foi definido como sendo através da guarda dos Seus estatutos e mandamentos.
Acordado do seu sonho, Salomão se dirigiu a Jerusalém e ofereceu holocaustos e ofertas pacíficas na presença da arca da aliança (v. 15), como forma de gratidão ao que o Senhor lhe havia prometido.
Ele não o fizera na própria localidade de Gibeom onde se encontrava, porque o entendimento que havia pedido a Deus começou a ser despertado imediatamente nele, e compreendeu que os sacrifícios deveriam ser apresentados diante da arca, que simbolizava a presença de Deus.
Mas como o altar do holocausto, bem como o tabernáculo se encontravam em Gibeom, seria necessário construir sem demora o templo, na eira de Araúna, de modo que os sacrifícios e ofertas pudessem ser apresentados regularmente, e da maneira que era requerida por Deus na Sua Lei.
A mãe de Absalão, esposa de Davi, era filha de um rei pagão, de Gesur, da Síria, e com isto, Davi havia deixado um mau exemplo para seus filhos, e Salomão seguiu-lhe os passos casando-se com a filha de faraó (I Reis 3.1), e isto abriu um precedente para que viesse a contrair outros matrimônios com princesas pagãs de diversas nações (I Reis 11), que acabaram desviando o seu coração, na sua velhice, para a prática da idolatria dos deuses que elas adoravam.
Isto nos ensina que é possível ter grande conhecimento e sabedoria relativa à Lei de Deus, à Sua vontade, e ainda assim andarmos desviados da Sua presença.
Que horror é ter uma mente esclarecida quanto às coisas de Deus e pouca ou nenhuma santidade.
Melhor seria não conhecer o caminho da verdade do que em o conhecendo, caminhar por outros caminhos diferentes dele.
Oh! Que possamos nos guardar a nós mesmos deste grande mal.
Cumpre a nós vigiar e orar em todo o tempo para não cairmos nesta e em outras tentações.
Se o fizermos, Deus nos concederá graça para perseverarmos na verdade.
Mas se O abandonarmos Ele também nos abandonará, ainda que não para uma perdição eterna, mas para experimentarmos o Seu desagrado.
Quem lançou a mão do arado não pode olhar para trás.
Quem está empenhado na guerra deve ter previsto e calculado os custos.
Quem começou a construir a casa deve concluir a construção.
Este é o caráter do reino de Deus, e Ele jamais modificará as Suas exigências para acomodá-las às nossas negligências e pecados.
Importava que Salomão permanecesse na mesma fidelidade que havia demonstrado no princípio.
Ele deveria continuar fazendo uso da sabedoria que lhe havia sido dada para ser um modelo, um exemplo de santidade para o povo de Israel.
Afinal, foi para confirmá-lo como um rei sábio e justo perante o povo de Israel e todas as nações, que o Senhor lhe dera o dom de discernir entre bem e mal mais do que qualquer outro homem, e nós podemos ver isto nos Provérbios e no livro de Eclesiastes e Cantares, que ele escreveu, e na demonstração prática da sabedoria, que havia recebido quando agiu como juiz no caso das duas prostitutas que alegavam ser a mãe de uma mesma criança.
O que ele fez dispensa qualquer comentário de nossa parte porque esta estória corre mundo, e quase todos a conhecem, e foi exatamente através dela que Salomão começou a ter renome como um rei sábio e justo (v. 28).
“1 Ora, Salomão aparentou-se com Faraó, rei do Egito, pois tomou por mulher a filha dele; e a trouxe à cidade de Davi, até que acabasse de edificar a sua casa, e a casa do Senhor, e a muralha de Jerusalém em redor.
2 Entretanto o povo oferecia sacrifícios sobre os altos, porque até aqueles dias ainda não se havia edificado casa ao nome do Senhor.
3 E Salomão amava ao Senhor, andando nos estatutos de Davi, seu pai; exceto que nos altos oferecia sacrifícios e queimava incenso.
4 Foi, pois, o rei a Gibeom para oferecer sacrifícios ali, porque aquele era o principal dentre os altos; mil holocaustos sacrificou Salomão naquele altar.
5 Em Gibeom apareceu o Senhor a Salomão de noite em sonhos, e disse-lhe: Pede o que queres que eu te dê.
6 Respondeu Salomão: De grande benevolência usaste para com teu servo Davi, meu pai, porquanto ele andou diante de ti em verdade, em justiça, e em retidão de coração para contigo; e guardaste-lhe esta grande benevolência, e lhe deste um filho, que se assentasse no seu trono, como se vê neste dia.
7 Agora, pois, ó Senhor meu Deus, tu fizeste reinar teu servo em lugar de Davi, meu pai. E eu sou apenas um menino pequeno; não sei como sair, nem como entrar.
8 Teu servo está no meio do teu povo que elegeste, povo grande, que nem se pode contar, nem numerar, pela sua multidão.
9 Dá, pois, a teu servo um coração entendido para julgar o teu povo, para que prudentemente discirna entre o bem e o mal; porque, quem poderia julgar a este teu tão grande povo?
10 E pareceu bem aos olhos do Senhor o ter Salomão pedido tal coisa.
11 Pelo que Deus lhe disse: Porquanto pediste isso, e não pediste para ti muitos dias, nem riquezas, nem a vida de teus inimigos, mas pediste entendimento para discernires o que é justo,
12 eis que faço segundo as tuas palavras. Eis que te dou um coração tão sábio e entendido, que antes de ti teu igual não houve, e depois de ti teu igual não se levantará.
13 Também te dou o que não pediste, assim riquezas como glória; de modo que não haverá teu igual entre os reis, por todos os teus dias.
14 E ainda, se andares nos meus caminhos, guardando os meus estatutos e os meus mandamentos, como andou Davi, teu pai, prolongarei os teus dias.
15 Então Salomão acordou, e eis que era sonho. E, voltando ele a Jerusalém, pôs-se diante da arca do pacto do Senhor, sacrificou holocaustos e preparou sacrifícios pacíficos, e deu um banquete a todos os seus servos.
16 Então vieram duas mulheres prostitutas ter com o rei, e se puseram diante dele.
17 E disse-lhe uma das mulheres: Ah, meu senhor! eu e esta mulher moramos na mesma casa; e tive um filho, estando com ela naquela casa.
18 E sucedeu que, no terceiro dia depois de meu parto, também esta mulher teve um filho. Estávamos juntas; nenhuma pessoa estranha estava conosco na casa; somente nós duas estávamos ali.
19 Ora, durante a noite morreu o filho desta mulher, porquanto se deitara sobre ele.
20 E ela se levantou no decorrer da noite, tirou do meu lado o meu filho, enquanto a tua serva dormia, e o deitou no seu seio, e a seu filho morto deitou-o no meu seio.
21 Quando me levantei pela manhã, para dar de mamar a meu filho, eis que estava morto; mas, atentando eu para ele à luz do dia, eis que não era o filho que me nascera.
22 Então disse a outra mulher: Não, mas o vivo é meu filho, e teu filho o morto. Replicou a primeira: Não; o morto é teu filho, e meu filho o vivo. Assim falaram perante o rei.
23 Então disse o rei: Esta diz : Este que vive é meu filho, e teu filho o morto; e esta outra diz: Não; o morto é teu filho, e meu filho o vivo.
24 Disse mais o rei: Trazei-me uma espada. E trouxeram uma espada diante dele.
25 E disse o rei: Dividi em duas partes o menino vivo, e dai a metade a uma, e metade a outra.
26 Mas a mulher cujo filho em suas entranhas se lhe enterneceram por seu filho, e disse: Ah, meu senhor! dai-lhe o menino vivo, e de modo nenhum o mateis. A outra, porém, disse: Não será meu, nem teu; dividi-o.
27 Respondeu, então, o rei: Dai à primeira o menino vivo, e de modo nenhum o mateis; ela é sua mãe.
28 E todo o Israel ouviu a sentença que o rei proferira, e temeu ao rei; porque viu que havia nele a sabedoria de Deus para fazer justiça.” (I Rs 3.1-28).