DISTINÇÃO ENTRE O VIL E O PROFANO
Jesus declarou que todos os alimentos são limpos (Mc 7.19), e com isto não estava contrariando a Lei, ao revogar a distinção entre alimentos limpos e imundos, que havia na Antiga Aliança, porque o que se deveria aprender por princípio daquele mandamento era que a santidade exige que se faça distinção entre o sagrado e o profano, entre o puro e o impuro, consiste basicamente em se evitar tudo aquilo que é proibido por Deus, como a prostituição, o roubo, o adultério, enfim todas as coisas que procedem do coração do pecador, e que o contaminam, tornando-o impuro, e por conseguinte, não conformado à santidade que é devida a Deus.
Antes de ser enviado à casa do centurião romano Cornélio, Pedro teve a visão do lençol com vários animais considerados imundos pela Lei, e lhe foi ordenado por Deus que os matasse e os comesse, confirmando assim que de fato, desde a inauguração da Nova Aliança no sangue de Jesus, os israelitas não estavam mais obrigados ao cumprimento das ordenanças cerimoniais da Lei de Moisés, porque o evangelho romperia as fronteiras de Israel e alcançaria as pessoas de todas as nações do mundo, convidando-as a se aliançarem com Deus, nas bases de uma Nova Aliança, em que para alguém ser considerado como integrante do povo de Deus, não deveria mais se circuncidar e guardar todos os mandamentos cerimoniais e civis da Lei, enfim, não seria mais exigido que vivessem como um judeu, conforme era determinado pela Antiga Aliança.
Daí ter Deus dado a visão do lençol a Pedro, antes de enviá-lo à casa de Cornélio, pois queria convencê-lo acerca desta nova realidade, que seria trazida à luz pelo evangelho.
Outro exemplo que podemos destacar é que Jesus não estabeleceu nenhum tipo de traje específico para os ministros do evangelho.
Já na Antiga Aliança, todos os detalhes do traje a ser usado pelos sacerdotes foram prescritos na Lei.
Uma das razões para isto pode ser entendida do fato de que o dito popular “o hábito faz o monge” é uma realidade para os que são do mundo, mas não para os que são de Deus e para o próprio Deus.
No entanto, é inegável que um traje distintivo e vistoso causa impacto nas pessoas.
Como havia muitos incrédulos no meio do povo de Israel, Deus estabeleceu todas aquelas distinções nos trajes dos sacerdotes, exatamente para o fim de produzir tal efeito de temor e reverência nos corações.
Se alguém não desse o devido valor ao ofício sacerdotal, pelo menos demonstraria respeito a eles, e saberia que haviam sido distinguidos dos demais por Deus, pelo traje que usavam.
Então, ao não ter designado um traje específico para os ministros do evangelho, Jesus não lhes deu liberdade para serem descuidados com a sua aparência externa, porque aprendemos pela Lei, quanto ao traje dos sacerdotes, que Deus espera de Seus ministros, que deem a devida honra ao ofício em que foram investidos por Ele.
Deste modo, a lei cerimonial, apesar de ter sido revogada quanto à obrigatoriedade relativa ao seu cumprimento, no entanto continua vigorando quando ao seu papel de nos ensinar em figura, que a santidade que é devida a Deus (v. 44, 45) exigirá do cristão, que renuncie a muitas coisas.
Sua libertação do pecado por Cristo, demandará que pague o preço da sua consagração, não participando de práticas condenadas pelo Senhor e abstendo-se de pensamentos e sentimentos que sejam contrários àqueles que constituem a natureza divina.
Em suma, o cristão deverá se separar de tudo aquilo que é reprovado pela lei moral, como por exemplo, a cobiça, a mentira, a inveja, o orgulho, a injustiça, o ódio, a sensualidade, palavras torpes, gritarias, dissensões, contendas, maledicência, obscenidade, ira, indignação, maldade, prostituição, idolatria, feitiçaria, ciúme, bebedice, glutonaria, adultério e todos os demais tipos de pecados descritos na Palavra de Deus.
A Lei ensina que o cristão é libertado por Deus para não mais viver pecando.
Ele não é livre para fazer tudo o que seja da sua vontade.
Ele é libertado para servir a Deus e ao próximo, e isto em santidade de vida, conforme é ensinado pela Lei.
É, sobretudo para este propósito que a graça lhe é concedida.
Estar sob a graça não significa, portanto estar livre de todo o tipo de jugo.
O cristão está livre do jugo da lei cerimonial e civil, mas não está livre do jugo de Jesus, o qual lhe é imposto e ordenado pelo Senhor, pois quando diz “tomai sobre vós o meu jugo”, o verbo está na forma imperativa afirmativa, indicando uma ordem.
Na verdade o mandamento divino de se fazer distinção entre animais limpos e imundos, como se vê no 11º capítulo de Levítico, que estaremos comentando, remontava até mesmo antes do dilúvio (Gên 7.2), logo, era anterior à Lei de Moisés, em que foi confirmada e reafirmada por Deus, e disto aprendemos que a distinção cerimonial já havia sido dada desde o princípio pelo Senhor àqueles que O amavam, para lhes ensinar acerca da necessidade fazerem distinção entre o vil e o profano, entre a impureza e a pureza, conforme o padrão que Deus institui pela Sua própria natureza santa, em tal sentido.
Os cristãos devem viver de modo singular em seus espíritos, quanto ao curso de suas vidas, não se conformando a este mundo, isto é, não tendo por norma de vida a forma que rege as pessoas do mundo em seus hábitos e práticas, contrários à vontade de Deus.
Mesmo em relação às coisas que são lícitas o cristão deve se abster daquelas que não são convenientes, por deporem contra o amor que é devido a Deus e ao próximo.
Ele deve ser governado pela lei régia do amor, abstendo-se de tudo aquilo que possa produzir escândalos, e, por conseguinte depor contra o seu testemunho e contra a glória de Deus.
A lei cerimonial teria uma função importante na vida dos israelitas, de modo que revelassem nas ações comuns da vida que eles eram diferentes das demais nações, porque serviam ao Deus único e verdadeiro.
O politeísmo e paganismo das demais nações estariam em claro contraste com o modo de vida determinado por Deus para os israelitas, a nação com a qual o Senhor havia se aliançado.
Os porcos eram sagrados para os que cultuavam a deusa Vênus, a coruja para Minerva, a águia para Júpiter, e o cachorro para Hecate, e todos estes animais foram considerados por Deus como imundos na Antiga Aliança, exatamente para marcar este contraste entre os costumes de Israel e o das demais nações.
Assim, o grande propósito destas distinções cerimoniais era o de ensinar em figura, que sem santificação, ninguém verá o Senhor, pois a obra de Cristo no cristão tem a ver com a restauração daquele estado de perfeição e santidade que havia no homem no Jardim do Éden, antes da entrada do pecado no mundo.
Sem isto, ninguém poderá estar no céu, eternamente, na presença do Deus que é inteiramente santo.
A advertência então que se aprende, por princípio, desta lei cerimonial, é que o cristão não deve ser abominável (v. 43).
O ensino é que nos fazendo sócios do pecado, que é uma abominação para Deus, nós nos tornamos abomináveis.
Estas distinções de alimentos foram determinadas por Deus na Lei, para fazer com que os israelitas fossem propositalmente feitos pessoas distintas, revelando em figura que não eram deste mundo, assim como Cristo e os cristãos, não são efetivamente do mundo.
A antiga regra levítica torna impossível que os hebreus se misturem aos costumes das demais nações, sem transgredirem os mandamentos de Deus.
A comida deles era tão restrita, que eles não poderiam manter um relacionamento social com qualquer povo vizinho.
Por exemplo, os cananeus comiam tudo, até mesmo a carne que tinha sido dilacerada por cachorros, e comiam até os próprios cachorros.
Agora, um judeu não deveria sentar à mesa de um cananeu, porque ele nunca poderia estar seguro que não haveria à mesa a carne de alguma coisa imunda proibida pela Lei.
Os judeus não deveriam, nem mesmo, comer com os árabes, porque eles frequentemente comiam a carne de camelos, de lebres, e de outros animais considerados imundos pela Lei.
Assim, era um real propósito de Deus, manter os filhos de Israel separados das demais nações até a vinda de Cristo.
Quando os judeus eram considerados o povo de Deus, durante a dispensação da Lei, então os gentios foram enxertados na oliveira deles, entretanto nós não herdamos as suas cerimônias, nós herdamos todos os privilégios para os quais apontavam as cerimônias.
Assim, todos os que levam o nome de Cristo estão verdadeiramente separados para sempre do mundo.
Não que devam evitar um relacionamento diário com as pessoas.
Jesus não procedeu deste modo.
Ele era santo e separado dos pecadores.
Mas sabemos que sempre estava na companhia de pecadores, sentando à sua mesa, buscando o seu bem, e buscando salvar depois as suas almas.
Estava com eles, mas nunca foi um deles; estava entre eles, mas sempre distinto e separado deles; não se conformando a eles, mas transformando-os.
Ele marcou nisto um exemplo para nós.
Não é a exclusão de um ermitão, nem a exclusão num monastério onde seríamos de nenhum serviço a nossos semelhantes, mas numa separação mais elevada e mais espiritual.
Estamos no mundo, e entre as pessoas do mundo, então devemos nos entrosar com todos os tipos de homens, mas ainda manter a dignidade do caráter de convertidos, e deixarmos que os homens vejam que estamos entre eles como uma luz no meio das trevas, como sal espalhado sobre a putrefação.
Um cristão deve se distinguir pela sua conversação.
Deve fazer uma oração sobre aquilo que outros fariam um gracejo.
Deve ser distinguido pela sua forma de caminhar segundo a sã doutrina.
Ele medita na Palavra para extrair dali a verdade, e não pára nisto, pois sabe que deve aplicá-la à Sua vida.
Assim, não está fechado em suas convicções pelo temor de ter que submetê-las ao julgamento da Palavra de Deus.
Ele terá a coragem e estará disposto a renunciar a tudo o que não se conforma com a sã doutrina, porque o seu desejo não é caminhar segundo o seu próprio juízo ou o dos homens, mas segundo a vontade de Deus, para o seu próprio bem, e o do seu próximo, testemunhando qual é o tipo de procedimento de vida, que nos livra da condenação futura.
“1 Falou o Senhor a Moisés e a Arão, dizendo-lhes:
2 Dizei aos filhos de Israel: Estes são os animais que podereis comer dentre todos os animais que há sobre a terra:
3 dentre os animais, todo o que tem a unha fendida, de sorte que se divide em duas, o que rumina, esse podereis comer.
4 Os seguintes, contudo, não comereis, dentre os que ruminam e dentre os que têm a unha fendida: o camelo, porque rumina mas não tem a unha fendida, esse vos será imundo;
5 o querogrilo, porque rumina mas não tem a unha fendida, esse vos será imundo;
6 a lebre, porque rumina mas não tem a unha fendida, essa vos será imunda;
7 e o porco, porque tem a unha fendida, de sorte que se divide em duas, mas não rumina, esse vos será imundo.
8 Da sua carne não comereis, nem tocareis nos seus cadáveres; esses vos serão imundos.
9 Estes são os que podereis comer de todos os que há nas águas: todo o que tem barbatanas e escamas, nas águas, nos mares e nos rios, esse podereis comer.
10 Mas todo o que não tem barbatanas, nem escamas, nos mares e nos rios, todo réptil das águas, e todos os animais que vivem nas águas, estes vos serão abomináveis,
11 tê-los-eis em abominação; da sua carne não comereis, e abominareis os seus cadáveres.
12 Tudo o que não tem barbatanas nem escamas, nas águas, será para vós abominável.
13 Dentre as aves, a estas abominareis; não se comerão, serão abomináveis: a águia, o quebrantosso, o xofrango,
14 o açor, o falcão segundo a sua espécie,
15 todo corvo segundo a sua espécie,
16 o avestruz, o mocho, a gaivota, o gavião segundo a sua espécie,
17 o bufo, o corvo marinho, a coruja,
18 o porfirião, o pelicano, o abutre,
19 a cegonha, a garça segundo a sua, espécie, a poupa e o morcego.
20 Todos os insetos alados que andam sobre quatro pés, serão para vós uma abominação.
21 Contudo, estes há que podereis comer de todos os insetos alados que andam sobre quatro pés: os que têm pernas sobre os seus pés, para saltar com elas sobre a terra;
22 isto é, deles podereis comer os seguintes: o gafanhoto segundo a sua espécie, o solham segundo a sua espécie, o hargol segundo a sua espécie e o hagabe segundo a sua espécie.
23 Mas todos os outros insetos alados que têm quatro pés, serão para vós uma abominação.
24 Também por eles vos tornareis imundos; qualquer que tocar nos seus cadáveres, será imundo até a tarde,
25 e quem levar qualquer parte dos seus cadáveres, lavará as suas vestes, e será imundo até a tarde.
26 Todo animal que tem unhas fendidas, mas cuja fenda não as divide em duas, e que não rumina, será para vós imundo; qualquer que tocar neles será imundo.
27 Todos os plantígrados dentre os quadrúpedes, esses vos serão imundos; qualquer que tocar nos seus cadáveres será imundo até a tarde,
28 e o que levar os seus cadáveres lavará as suas vestes, e será imundo até a tarde; eles serão para vós imundos.
29 Estes também vos serão por imundos entre os animais que se arrastam sobre a terra: a doninha, o rato, o crocodilo da terra segundo a sua espécie,
30 o musaranho, o crocodilo da água, a lagartixa, o lagarto e a toupeira.
31 Esses vos serão imundos dentre todos os animais rasteiros; qualquer que os tocar, depois de mortos, será imundo até a tarde;
32 e tudo aquilo sobre o que cair o cadáver de qualquer deles será imundo; seja vaso de madeira, ou vestidura, ou pele, ou saco, seja qualquer instrumento com que se faz alguma obra, será metido na água, e será imundo até a tarde; então será limpo.
33 E quanto a todo vaso de barro dentro do qual cair algum deles, tudo o que houver nele será imundo, e o vaso quebrareis.
34 Todo alimento depositado nele, que se pode comer, sobre o qual vier água, será imundo; e toda bebida que se pode beber, sendo depositada em qualquer destes vasos será imunda.
35 E tudo aquilo sobre o que cair: alguma parte dos cadáveres deles será imundo; seja forno, seja fogão, será quebrado; imundos são, portanto para vós serão imundos.
36 Contudo, uma fonte ou cisterna, em que há depósito de água, será limpa; mas quem tocar no cadáver será imundo.
37 E, se dos seus cadáveres cair alguma coisa sobre alguma semente que se houver de semear, esta será limpa;
38 mas se for deitada água sobre a semente, e se dos cadáveres cair alguma coisa sobre ela, então ela será para vós imunda.
39 E se morrer algum dos animais de que vos é lícito comer, quem tocar no seu cadáver será imundo até a tarde;
40 e quem comer do cadáver dele lavará as suas vestes, e será imundo até a tarde; igualmente quem levar o cadáver dele lavará as suas vestes, e será imundo até a tarde.
41 Também todo animal rasteiro que se move sobre a terra será abominação; não se comerá.
42 Tudo o que anda sobre o ventre, tudo o que anda sobre quatro pés, e tudo o que tem muitos pés, enfim todos os animais rasteiros que se movem sobre a terra, desses não comereis, porquanto são abomináveis.
43 Não vos tomareis abomináveis por nenhum animal rasteiro, nem neles vos contaminareis, para não vos tornardes imundos por eles.
44 Porque eu sou o Senhor vosso Deus; portanto santificai-vos, e sede santos, porque eu sou santo; e não vos contaminareis com nenhum animal rasteiro que se move sobre a terra;
45 porque eu sou o Senhor, que vos fiz subir da terra do Egito, para ser o vosso Deus, sereis pois santos, porque eu sou santo.
46 Esta é a lei sobre os animais e as aves, e sobre toda criatura vivente que se move nas águas e toda criatura que se arrasta sobre a terra;
47 para fazer separação entre o imundo e o limpo, e entre os animais que se podem comer e os animais que não se podem comer.” (Lev 11.1-47).