O Coração do Evangelho
Por Charles Haddon Spurgeon
Traduzido e adaptado do texto em espanhol, em domínio público na Internet, pelo Pr Silvio Dutra.
“De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus. Aquele que não conheceu pecado ele o fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos justiça de Deus.” (II Cor 5.20,21).
O coração do evangelho é a redenção, e a essência da redenção é o sacrifício substitutivo de Cristo.
A grande doutrina, a maior de todas é esta, que Deus ao ver os homens perdidos por causa de seu pecado, tem tomado esse pecado deles e o tem posto sobre seu Filho unigênito, fazendo-lhe pecado por nós, a Ele que não conheceu nenhum pecado, e como consequência desta transferência do pecado, o que crê em Cristo Jesus é feito justo e reto, sim, é feito justiça de Deus em Cristo. Cristo foi feito pecado para que os pecadores fossem feitos justiça. Essa é a doutrina da substituição de nosso Senhor Jesus Cristo a favor dos homens culpados.
Nosso substituto era sem mancha, inocente, e puro. “Ao que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós.”, Cristo Jesus, o Filho de Deus, se encarnou e foi feito carne, e habitou aqui entre os homens; porém ainda que foi feito em aparência de carne pecadora, Ele não conheceu nenhum pecado. Ainda que o pecado lhe tenha sido imposto, não foi encontrado culpado. Ele não foi, não podia ser um pecador. Ele não tinha um conhecimento pessoal do pecado. Ao longo de toda a sua vida nunca cometeu uma ofensa contra a grande lei da verdade e justiça. A lei estava em seu coração; era sua natureza ser santo. Ele poderia dizer a todo o mundo: “quem de vocês me acusa de pecado?”. Ainda que um juiz titubeante tenha perguntado: “que mal pois tem ele feito?”. Quando toda Jerusalém foi pressionada e subornada para testificar contra Ele, não se pôde achar nenhum testemunho. Foi necessário mudar seus comentários e torcer suas palavras antes de que encarniçados inimigos fizessem uma investida contra Ele. Sua vida o pôs em contato com ambas as tábuas da lei, porém não transgrediu nem um só mandamento. Assim como os judeus examinavam ao cordeiro Pascal antes de que o sacrificassem, assim examinaram ao Senhor Jesus os escribas e fariseus, e os doutores da lei, e governantes e príncipes, sem achar ofensa nEle. Ele era o Cordeiro de Deus sem mancha e sem contaminação.
Nosso Senhor tampouco cometeu nenhum pecado de pensamento. Sua mente nunca produziu sequer um mal desejo. Nunca houve no coração de nosso bendito Senhor uma atração para nenhum prazer maligno, nem nenhum desejo de escapar dos sofrimentos ou da vergonha que estavam envolvidos em Sua missão. Quando disse: “Pai, se possível, passa de mim este cálice”, Ele nunca procurou evitar a bebida amarga à custa do trabalho perfeito de sua vida. O “se” significava: “se é consistente com a completa obediência ao Pai, e a realização do propósito divino.”. Vemos a debilidade de sua natureza horrorizada, e a santidade de sua natureza que decide e conquista, quando acrescenta: “porém não seja como eu quero, senão como tu queres”. Ele tomou sobre si a aparência da carne pecadora, porém ainda que essa carne frequentemente lhe causava cansaço em seu corpo, nunca produziu nele a debilidade do pecado. Ele tomou sobre si nossas enfermidades, porém Ele nunca exibiu uma enfermidade que tivesse o mínimo de culpa censurável ligada a ela.
Porém com respeito a nosso Senhor, era sua natureza ser puro, e reto, e amoroso. Todos seus doces desejos foram para a bondade. Sua vida sem nenhuma restrição era pura santidade. Ele era o santo menino Jesus. O príncipe deste mundo não encontrou nEle combustível para a chama que ele desejava acender. Não somente não fluía pecado dEle, como também não havia pecado nEle, nem inclinação, nem tendência nessa direção. Observem-no em secreto, e o encontrarão em oração; olhem dentro de sua alma e o encontrarão ansioso de agir e sofrer segundo o desejo de seu Pai. Oh, que bendito caráter o de Cristo!
Nosso Senhor Jesus Cristo como homem viveu sob a lei; porém Ele não devia nada a essa lei, porque Ele a cumpriu perfeitamente em todos seus aspectos. Ele foi capaz de estar no lugar que correspondia aos outros, porque não estava sob obrigação própria. Ele estava obrigado somente para Deus porque Ele se havia comprometido voluntariamente para ser fiador e sacrificar-se por aqueles que o Pai lhe entregou. Ele não foi culpado de nada, de outra maneira não poderia haver sido fiador de homens culpados.
E a maravilhosa condescendência do Senhor está no fato de ter se identificado plenamente com os homens quanto à sua formação segundo a descendência de Adão, desde um embrião no útero materno, passando a ser feto, bebê, criança, jovem e adulto. Pois Ele poderia ter sido formado como foi formado o próprio Adão, já adulto e independentemente. Mas, para se identificar plenamente com a descendência de Adão, foi preciso que fosse formado homem como é todo filho de Adão, e assim ele é real e plenamente o Filho do homem, que sendo Deus, se fez também homem, mas sem pecado. Por isso se registra na Bíblia que era da genealogia de Adão (Lc 3.23-38). Era pois nascido sob a lei, conforme qualquer outro descendente de Adão. Fez parte da descendência para que pudesse socorrê-la. Ele socorre efetivamente os que têm fé nEle, e por isso se diz que socorre não a anjos, mas a descendência de Abraão, e que para isto mesmo convinha que em todas as cousas se tornasse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus, e para fazer propiciação pelos pecados do povo. (Hb 2.16,17). Note que se fosse criado independentemente, não teria nascido sujeito à lei, porque esta foi imposta à descendência de Adão. Ele teria sido condenado pela lei, como qualquer outro descendente de Adão, caso tivesse pecado. Mas como não tinha pecado, e estava sujeito à lei, por ter nascido sob ela, Ele nada deveu à lei, ao contrário tinha o testemunho da lei de que era um perfeito cumpridor dos seus mandamentos e assim contava não com a condenação da lei, mas com a sua recompensa para a vida, porque Ele e somente Ele tinha atingido a justiça que é segundo as obras da lei, porque jamais descumpriu qualquer um dos seus mandamentos. Assim, poderia ser ofertado como propiciação pelos pecados daqueles que são transgressores da lei, para satisfazer a exigência da justiça de Deus que determina a morte eterna do pecador.
Ora, se Ele era tão perfeito homem, sem nenhuma mancha ou pecado, quão difícil foi para Ele se identificar com os pecadores. Pode não ser uma desgraça para um homem pecador conviver com pecadores; porém é uma pesada tristeza para alguém de mente pura viver em companhia de infelizes licenciosos. Que abrumadora tristeza deve ter sido para o puro e perfeito Cristo morar entre os hipócritas, os egoístas, os profanos. E pior ainda, que Ele mesmo tivesse que carregar os pecados desses homens culpados. Ele mais do que uma vez suspirou diante desta realidade e indagou até quando deveria suportar uma geração má e incrédula. Sua natureza sensível e delicada deve ter evitado até a sombra de um pecado, e contudo leiam as palavras e fiquem assombrados: “Aquele que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós.”. Nosso perfeito Senhor e Mestre carregou nossos pecados em seu próprio corpo na cruz.
O Senhor Deus colocou sobre Jesus, que voluntariamente o aceitou, todo o peso do pecado humano. No lugar em que repousara sobre o pecador, que o cometeu, o fez repousar sobre Cristo, que não o cometeu, e a justiça que Jesus operou foi posta na conta do culpado, que não a havia realizado, de maneira que o culpado é considerado como justo. Aqueles, que por natureza são culpados, são considerados como justos, enquanto que Ele que por sua natureza não conheceu nenhum pecado, foi tratado como culpado.
Deus se agrada dos transgressores? Ele ama a transgressão, para fazer uma tal obra como esta? De modo nenhum. Exatamente o oposto. Por muito detestar o pecado e a transgressão, condenou o pecado na pessoa do Seu Filho amado, para que aqueles que quiserem ser livrados da escravidão do pecado, possam ser aperfeiçoados na santidade, e também não terem mais qualquer pecado na glória vindoura, e assim participarem da vitória de Deus sobre o pecado, em Cristo Jesus. O pecador não é pois considerado justo pela fé, para continuar na prática da injustiça, mas exatamente para que possa ser agora servo da justiça e não mais do pecado. Cristo foi considerado culpado para que os transgressores pudessem receber o dom da justiça, e serem livrados da condenação eterna, pela graça, mas os benefícios da Sua morte são aplicáveis somente àqueles que viverão um dia em perfeita santidade. Os que pretendem permanecer na prática da injustiça não poderão contar com a expiação do pecado que foi feita por Ele. Porque Ele remove a culpa somente daqueles que viverão para Deus.
É um fato que Deus tenha colocado sobre Jesus a iniquidade de todos nós. Cristo não era culpado, e não poderia ser feito culpado, porém foi tratado como se o fosse, porque Ele queria estar no lugar do culpado. E Ele de fato morreu por todos para que todo aquele que nEle creia possa ter a culpa do seu pecado removida, e ser inteiramente aceito por Deus. Não podemos portanto falar da graça que está em Cristo Jesus como algo fácil, sem valor, barato, pois custou um alto preço para Ele. Bendigo seu santo nome porque para reivindicar sua justiça Ele determinou que, ainda que um perdão gratuito seria proporcionado aos cristãos, teria que estar fundado sobre uma expiação que cumpriria todos os requisitos da lei. Não significa uma pequena coisa quando se nos diz “feitos justiça”. É mais, não somente somos feitos justiça, senão que somos “feitos justiça de Deus.”. Aqui há um grande mistério. A justiça que teria Adão no jardim era perfeita, porém era a justiça do homem, mas a nossa justiça é de Deus. A justiça humana falhou, porém o cristão tem uma justiça divina que nunca pode falhar. Não somente a tem, senão que ele é a justiça, pois é feito justiça de Deus em Cristo. Assim como Cristo foi feito pecado, e contudo nunca pecou, assim também somos feitos justiça, ainda que não possamos afirmar que somos justos em e por nós mesmos.
Contudo pecador que sejas, manchado, deformado, e envilecido, se aceitas ao grande Substituto que Deus te proporciona na pessoa de seu querido Filho, teus pecados são removidos, e a justiça te é dada. Teus pecados foram postos sobre Jesus, a vítima propiciatória; já não são teus, porque Ele os tem removido. Posso dizer que sua justiça é atribuída a ti; porém vou mais além, e digo com o texto: “tu és feito justiça de Deus nEle.”.
Amigo, sem Cristo, estás em inimizade com Deus, e Deus está irado contigo; porém a reconciliação estão ao teu alcance. Ele tem feito um caminho pelo qual pode ter converter em seu amigo – uma via custosa para Ele mesmo, porém sem qualquer custo para ti. Ele não pode renunciar à sua justiça, e dessa maneira destruir a honra de seu próprio caráter; porém Ele renunciou a seu Filho, seu Unigênito, e seu Amado, esse Seu Filho tem sido feito pecado por nós, ainda que Ele não conheceu pecado. Vê como Deus sai ao teu encontro! Vê quão desejosos, quão ansioso está para que haja reconciliação entre Ele mesmo e os homens culpados. Oh senhores, se não são salvos não é porque Deus não possa ou não queira salvá-los, é porque recusam aceitar sua misericórdia em Cristo.
O que Ele tem feito por mim, também está completamente desejoso de fazê-lo por ti. Ele é um Deus que está pronto para o perdão. Tenho pregado seu evangelho há muitos anos, porém nunca me encontrei com um pecador que Cristo tenha se recusado a limpar quando se achegou a Ele.
Silvio Dutra Alves
Enviado por Silvio Dutra Alves em 06/02/2013