Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
A Vigilância que o Ministro Deve Ter de si Mesmo
Por Charles Haddon Spurgeon (adaptado)
“Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina” (I Tim 4.16)
Todo trabalhador sabe quanto lhe é necessário conservar sua ferramenta em bom estado, porque se os instrumentos se embotassem e não os amolasse, teria que empregar mais forças. É verdade que o Senhor pode trabalhar sem o auxílio de qualquer instrumento, conforme se verifica às vezes, valendo-se de pregadores indoutos para a conversão das almas; e também pode operar ainda sem agentes, como faz quando salva aos homens sem nenhuma classe de pregadores, aplicando a Palavra diretamente por meio do seu Santo Espírito; porém não podemos considerar os atos soberanos e absolutos de Deus, como regra para nortear os nossos. Ele pode, em razão do Seu caráter absoluto, operar como melhor lhe agrade; porém nós devemos fazê-lo, segundo nos preceituam suas mais claras dispensações; e um dos atos mais palpáveis é que o Senhor geralmente adapta os meios aos fins, em que nos dá a lição que é natural que trabalhemos com tanto maior êxito, quanto melhor seja nossa condição espiritual. Em outras palavras: geralmente efetuaremos melhor a obra de nosso Senhor, quando os dons e graças que temos recebido se achem em boa ordem; e o faremos pior, quando não estejam. Esta é uma verdade prática para nossa instrução. Quando o Senhor faz exceções, estas não fazem mais do que provar a exatidão da regra que acabamos de citar.
Nós somos, em certo sentido, nossos próprios instrumentos, e por conseguinte, devemos conservar-nos em bom estado. Se me é necessário pregar o Evangelho, não poderei fazer uso senão de minha própria voz, e portanto, devo educar meus órgãos vocais. Não posso pensar senão com meu próprio cérebro, nem sentir senão com meu próprio coração, e em conseqüência, devo cultivar minhas faculdades intelectuais e emocionais. Não posso chorar e sentir-me desfalecer de ternura pelas almas, senão em minha própria natureza renovada, e portanto, devo conservar cuidadosamente a ternura que por elas abrigava Cristo Jesus.
Será em vão surtir minha biblioteca, organizar sociedades, ou projetar estes e aqueles planos, se me mostro negligente no cultivo de mim mesmo; porque os livros, as agências e os sistemas são somente os instrumentos de minha santa vocação: meu próprio espírito, minha alma e meu corpo são a maquinaria que tenho mais à mão para o serviço sagrado; minhas faculdades espirituais e minha vida interior são meu arsenal. McCheyne, escrevendo a um ministro amigo seu que andava viajando com a intenção de aperfeiçoar-se no alemão, usou uma linguagem idêntica à nossa: “Sei que te aplicarás com todo empenho ao alemão, porém não esqueças do cultivo do homem interior, quero dizer, do coração. Quando diligentemente cuida o oficial de cavalaria de ter seu sabre limpo e afiado, ele o esfrega com o maior cuidado para que não fique nele qualquer mancha. Recorda que és uma espada de Deus, instrumento seu, e um vaso eleito para levar Seu nome. Em igual medida, segundo a pureza e a perfeição do instrumento, será o êxito. Não bendiz Deus os grandes talentos tanto como a semelhança que se tem com Jesus. Um ministro santo é uma arma poderosa na mão de Deus.”.
Para o porta-voz do Evangelho, o estar espiritualmente desorganizado em sua própria pessoa, é tanto para o mesmo como para seu trabalho, uma verdadeira calamidade; e contudo, meus irmãos, quão facilmente se produz tal mal. Quanta vigilância, do mesmo modo, se necessita para preveni-lo. O defeito em uma pequena peça pode para uma locomotiva. A analogia é perfeita: um homem que sob todos os aspectos, possua as qualidades necessárias para ser útil, pode por algum pequeno defeito que tenha, sentir-se extraordinariamente entorpecido, ou reduzido a um estado absoluto de incapacidade. Semelhante resultado é para se sentir ao extremo, por estar relacionado com o evangelho que no sentido mais alto, está adaptado a produzir os melhores resultados. É coisa terrível que um bálsamo curativo perca sua eficácia devido à imperícia do que o aplica. Todos vocês conhecem os efeitos prejudiciais que com freqüência se produzem na água que corre por canos de chumbo; pois de igual modo o evangelho mesmo ao correr por homens espiritualmente enfermos, pode perder seu mérito até ao grau de se fazer prejudicial aos seus ouvintes.
É de se temer que a doutrina calvinista se converta no pior ensino, se for pregada por homens de vida pouco edificante, e que a apresentam como uma capa que pode cobrir toda classe de permissividade; e o arminianismo, por outro lado, com sua amplitude em oferecer a misericórdia, pode causar um sério dano às almas, se o tom superficial do pregador dá lugar a que seus ouvintes creiam que podem se arrepender quando bem lhes aprouver, e que por conseguinte, não haja urgência em acatar desde logo as prescrições da mensagem evangélica.
Além disso, quando um pregador é pobre em graça, qualquer bem duradouro que possa ser o resultado de seu ministério, será fraco no geral, e não guardará nenhuma proporção com o que teria direito de esperar. Uma semeadura abundante será seguida por uma colheita escassa; o interesse produzido pelos talentos será em extremo pequeno. Em algumas batalhas perdidas na guerra pelos americanos, diz-se que as derrotas se deveram à má qualidade da pólvora fornecida por certos vendedores falsários ao exército, pois isso foi a causa de não se ter obtido o efeito desejado pelo canhoneiro. O mesmo pode acontecer conosco. Podemos não atingir nosso alvo, desviar-nos do caminho que intentamos seguir e desperdiçar nosso tempo, por não possuirmos verdadeira força vital dentro de nós mesmos, ou não possuí-la em tal grau que conforme ela possa o Senhor abençoar-nos. Cuidem-se de não serem pregadores falsários.
Um dos nossos principais cuidados deve ser o de que nós mesmos sejamos salvos.
Que o pregador do evangelho seja antes de tudo participante dele, é uma verdade simples, porém ao mesmo tempo uma regar da maior importância. Não vivemos entres os que aceitam a sucessão apostólica dos jovens, tão somente porque estes pretendem assumí-la. Por maiores que sejam os honorários que têm pago aos mais sábios doutores, e por maiores que sejam os conhecimentos que hajam recebido, em troca, não teremos por isso uma evidência de que sua vocação lhes tenha vindo do alto. Uma piedade sincera e verdadeira é necessária como o primeiro requisito indispensável. Seja qual for o chamamento que alguém pretenda haver recebido, se não tem sido chamado à santidade, pode se assegurar que não tem sido chamado ao ministério.
Atavia-te primeiro a ti mesmo, e adorna depois a teu irmão, dizem os rabinos. A mão que trata de limpar algo, disse Gregória, é necessário que esteja limpa. Se o vosso sal não tem sabor, como podereis salgar com ele ? A conversão é uma condição sine qua non em um ministro. É necessário que os aspirantes aos nossos púlpitos tenham nascido de novo. Nem é a possessão desta primeira qualidade uma coisa que possa ter-se concedida por qualquer um, porque há uma muito grande possibilidade de que nos enganemos acerca de se estamos convertidos ou não. Creia-me, não é jogo de crianças o fato de se assegurarem de seu chamamento e eleição. O mundo está cheio de impostores, e os sedutores abundam, e que se agrupam em torno dos ministros com a avidez com que o fazem os abutres em torno dos corpos em putrefação. Nossos corações são enganosos, de maneira que a verdade não se acha na superfície, senão deve ser sacada de seu mais profundo interior. Devemos examinarmo-nos a nós mesmos mui cuidadosa e profundamente, não seja que por algum motivo depois de haver pregado aos demais, resulte que nos achemos na linha dos reprovados.
Quão horrível é ser pregador do evangelho e não estar todavia convertido. Que cada um diga em segredo no mais recôndito de sua alma: “Que coisa terrível será para mim viver ignorante do poder da verdade que estou me preparando para proclamar!”. Um ministro inconverso envolve em si a mais patente contradição. Um pastor destituído de graça é semelhante a um cego elegido para dar aula de óptica, que falará acerca da luz e da visão, estando ele submergido na mais profunda escuridão. É uma posição espantosa em que se coloca um homem que empreende uma obra para a execução da qual é inteira e absolutamente inadequado, porém sua incapacidade não o exime de responsabilidades, posto que deliberadamente as tem desejado assumir. Sejam quais forem seu dons naturais e suas faculdades mentais, nunca será um ministro para uma obra espiritual , se carece de vida espiritual, e nesse caso cumpre-lhe como seu dever cessar sua funções ministeriais enquanto não adquirir a primeira e mais simples das qualidades que para isso se faz necessária.
De igual modo ao ministro inconverso, encontra-se o convertido que é desprovido da sã doutrina, que não a conhece ou que não a pratica. Como pode dar consolo ao povo ? Que fará quando sentar-se para ouvir os lamentos dos penitentes, ou escutar suas ansiosas dúvidas e solenes temores ? O que lhes ministrará ? É natural que se admire ao pensar que suas palavras devem fazer-se apropriadas para conseguir tal fim. A palavra de um homem inconverso poder ser abençoada para a conversão das almas, porque que o Senhor ainda que desconheça a uma homem semelhante, honrará contudo, sua própria verdade. Quão perplexo deverá se sentir um homem assim ao ser consultado sobre as dificuldades que se apresentam aos cristãos maduros. Deve achar-se muito desviado da senda pela qual têm caminhado seus ouvintes regenerados. Como poderá escutar seus gozos no leito de morte, ou unir-se a eles em seus entusiastas regozijos quando se congregam em torno da mesa de Seu Senhor ?
Uma vez fixado o primeiro ponto da verdadeira religião, segue em importância para o ministro de que sua piedade seja vigorosa.
Não deve se conformar com caminhar no mesmo passo que as filas dos demais crentes; é preciso que seja um crente maduro e avançado, porque os ministro de Cristo têm sido chamado com toda propriedade “o mais escolhido de seu escolhimento, o seleto de sua eleição, a igreja sacada da igreja.”. Se fosse chamado a ocupar uma posição comum e a desempenhar um trabalho comum, talvez com uma graça comum poderia satisfazer-se, não obstante que nem ainda assim passaria de indolente sua satisfação, porém com o fato de haver sido eleito para trabalhos extraordinários, e chamado a um lugar rodeado de perigos nada comuns, deve sentir-se ansioso de possuir aquela força superior, única, adequada a sua posição. O pulso de sua piedade vital deve bater de um modo forte e regular, e o olho de sua fé deve ser perspicaz; o pé de sua resolução deve ser firme; a mão de sua atividade deve ser pronta: todo seu homem interior, enfim, deve achar-se no mais alto grau de saúde.
Nós necessitamos que se tenha por ministro de Deus a flor e nata das hostes cristãs, a homens tais que se a nação necessitasse de reis, não poderia fazer coisa melhor que elevá-los ao trono. Nossos homens de espírito mais débil, mais tímidos, mais carnais e pior contrabalanceados, não são candidatos a propósito para o púlpito. Há alguns trabalhos que nunca poderíamos encomendar aos inválidos e disformes. Um homem pode não ter as qualidades necessárias para subir aos altos edifícios, seu cérebro talvez seja demasiado débil, e seu trabalho em um lugar elevado o exporia a grandes perigos: se isso é assim, deixem-no permanecer no solo e que busque uma ocupação útil onde seu cérebro forte é menos essencial. Há irmãos que têm defeitos análogos no espiritual, e não podem se chamados ao desempenho de um serviço distinto e elevado, por serem suas cabeças demasiadamente débeis. Se por acaso obtivessem bom êxito, se encheriam de vaidade, defeito demasiadamente comum entre os ministros, e que é de todos o que menos enquadra com seu caráter, e o que com mais certeza os fará cair. Se nós fôssemos como nação chamado para defender nossos lares, não faríamos sem dúvida sair ao encontro do inimigo, nossos meninos e meninas, armados de espadas e fuzis, pois tampouco a igreja deve enviar a combater pela fé a qualquer noviço charlatão, ou entusiasta falto de experiência. O temor de Deus deve ensinar ao jovem a sabedoria, senão quer ter fechada a porta do pastorado.
A graça de Deus deve amadurecer seu espírito, pois do contrário faria melhor em esperar até que o poder lhe fosse dado do alto. O caráter moral mais elevado deve ser conservar diligentemente. Há muitos que não são para o propósito de desempenhar um cargo na igreja, e que sem dúvida, são bastante bons como simples membros dela. Tenho uma opinião severa com respeito aos crentes que têm incorrido em pecados graves: me comprazo em crer que podem converter-se sinceramente, e com esta esperança e as devidas precauções, serem recebidos de ovo na igreja, porém tenho dúvida, grande dúvida, acerca de se um homem caído em pecados grosseiros, possa ser facilmente restituído ao púlpito. John Angell James observa, e com razão, que “quando um pregado da justiça tem andado pelo caminho dos pecadores, não deve nunca abrir de novo seus lábios para falar a uma congregação antes de que seu arrependimento tenha sido tão notório como sua falta.”. “Que aqueles que têm sido raspados pelos filhos de Amom, fiquem em Jericó até que suas barbas cresçam”, isto que com freqüência se tem dito em tom de mofa aos jovens imberbes a quem evidentemente é inaplicável, é uma metáfora bastante apropriada e que convém aos homens desonrados e sem caráter, seja qual for sua idade. Ah! Uma vez corta a barba da reputação, é sumamente difícil que chegue de novo a crescer. Uma imoralidade descarada, na maioria dos casos, por mais profundo que seja o arrependimento, é um sinal fatal de que o caráter de quem assim procedeu, nunca foi dotado de graças ministeriais. A esposa de César não deve expor-se a que dela se suspeite, que não haja rumores desfavoráveis referentes à conduta inconseqüente de um ministro, pois do contrário devem abrigar-se poucas esperanças de que seja de utilidade. Aos caídos tem que se lhes receber na igreja como penitentes, e no ministério podem ser restaurados se Deus os colocar ali, não consiste nisto minha dúvida, senão em se Deus lhes deu alguma vez lugar nele. Em meu conceito, pois, não devemos apressar-nos em ajudá-los a que subam ao púlpito de novo, aos que havendo-o ocupado uma vez, têm mostrado que carecem da graça necessária para saírem garbosos nas provas a que sujeita a vida ministerial.
Para certa classe de trabalhos não escolhemos senão aos fortes, e quando Deus nos chama aos labores ministeriais, devemos esforçar-nos em adquirir graça que nos fortaleça e faça aptos para o desempenho de nossa missão, e não ser meros noviços levados pelas tentações de Satanás ao ponto de prejudicar a igreja e de lavrar nossa própria ruína. Temos que estar equipados com todas as armas de Deus, dispostos a efetuar proezas de valor não esperadas de parte dos demais: para nós, a negação e o esquecimento de nossas próprias pessoas, a perseverança e a paciência, devem ser virtudes cotidianas, e quem é por si mesmo suficiente para todas estas coisas ? É-nos indispensável viver muito próximo de Deus se queremos ser aprovados em nossa vocação.
Não esqueçam como ministros, que toda a vossa vida, e mui especialmente toda vossa vida pastoral, deve estar afetada pelo vigor de vossa piedade. Se vosso zelo enfraquece, não orareis bem no púlpito, e o fareis pior em família, e detestavelmente a sós em vosso estudo. Ao enfraquecer vossa alma, vossos ouvintes sem saber como ou por que, acharão que vossas orações em público lhes são pouco edificantes, e conhecerão vossa fraqueza talvez antes que vós mesmos a noteis. Vossos discursos porão depois em relevo vosso decaimento espiritual. Bem podereis valer-se de frases tão escolhidas e períodos tão corretos como em nenhum tempo o façais, apesar de tudo, serão achados como uma perda notável de força espiritual. Farão impulsos como em outras vezes, tão vigorosos como os do próprio Sansão, porem perceberão que sua grande força tem se acabado. Em sua comunicação diária com seu povo, não tardarão em perceber o enfraquecimento de sua graça que em tudo se fará patente. Olhos perspicazes verão os cabelos brancos aqui e ali, muito antes de você próprios. Quando um homem é feito vítima de uma enfermidade do coração, quantos males há que estarão envolvidos nela: do estômago, dos pulmões, das entranhas, dos músculos, dos nervos, de tudo enfim padecerá; da mesma maneira, que se debilite a um homem o coração em coisas espirituais, e muito em breve sua vida inteira cairá sobre a arruinadora influência desse mal.
Além disso, como resultado, seus ouvintes terão mais ou menos que sofrer: os mais fortes dentre eles poderão talvez sobrepor-se a esta tendência depressiva, porém os mais débeis se verão seriamente prejudicados. Sucede conosco e nossos ouvintes, o mesmo que com os relógios de bolso e o relógio público. Se o de nosso próprio uso funcionar mal, com exceção de seu próprio dono, poucos se enganarão por sua causa; porém se o de um edifício público tido como cronômetro apresentar defeito em seu funcionamento, uma boa parte de seus usuários se enganariam quanto à medida do tempo. Não é outra coisa o que se passa com o ministro: ele é o relógio de sua congregação; muitos regulam seu tempo pelas indicações que ele faz, e se for inexato, qual mais, qual menos, todos se extraviariam, sendo ele em grande maneira responsável pelos pecado a que tenha dado ocasião. Não podemos suportar o pensar nisto, meus irmãos. Não teremos ao fazê-lo, nem um só momento de consolo; mas, sem dúvida, não devemos omiti-lo a fim de estar em guarda contra semelhante mal.
Vocês devem ter presente também que nos é necessário um piedade muito vigorosa, porque o perigo que corremos é muito maior que o dos demais. Sobretudo, não há nenhum lugar tão assaltado pela tentação, como o ministério. Apesar da idéia popular de que está em nosso caráter retirar-nos prudentemente de uma tentação, não é menos certo que nossos perigos são mais freqüentes e piores do que os comuns aos demais crentes. O lugar que ocupamos pode ser vantajosos por sua altura, porém essa mesma altura é perigosa, e para muitos não tem sido o ministério senão uma rocha de tropeço. Se nos perguntassem quais são essas tentações, poderia faltar-nos tempo para particularizá-las, porém lhes diremos que entre outras se acham as mais grosseiras e as mais refinadas: as primeiras pertencem à indulgência com que nos julgamos ao aceitar e fazer as honras a uma boa mesa, para o que somos muitas vezes convidados por um povo hospitaleiro; e as tentações da carne, que sem cessar acometem aos jovens solteiros enaltecidos e admirados pelo belo sexo. Mais creio haver dito bastante: suas próprias observações lhes revelarão logo milhares de ciladas, a menos que seus olhos se tenham fechado para a luz. Há laços mais secretos que estes dos quais menos facilmente podemos escapar, e deles o pior é a tentação ao ministerialismo, isto é, a tendência de ler nossas Bíblias como ministros, a orar como ministros, a dar, em suma, em fazer tudo o que concerne à nossa religião como se isso não envolvesse nossas pessoas senão de um modo puramente relativo. Perder a personalidade no arrependimento e na fé, é por certo, perder muito. “Ninguém,”, disse John Owen, “prega seu sermão bem a outros, se não o prega primeiro a seu próprio coração.”. Irmãos, é sumamente difícil observar tal máxima. O cargo que desempenhamos em vez de avivar nossa piedade, como alguns asseguram, se converte, devido à maldade inerente à nossa natureza carnal, em um de seus mais sérios estorvos; ao menos, assim o julgo por experiência.
Como luta contra o oficialismo, e no entanto, quão facilmente nos acossa. É como uma vestimenta longa que se enreda nos pés de alguém que vai correr, e o impede de fazê-lo. Precavenham-se, queridos irmãos, desta e de todas as outras seduções de sua vocação; e se o têm feito assim até agora, continuem vigilantes até a última hora da vida.
Temos feito notar um dos perigos; porém na verdade, há uma legião deles. O grande inimigo das almas toma o maior empenho em não deixar nem um pedra sem revolver para a ruína do pregador. “Tenham cuidado de si mesmos”, disse Baxter, “porque o tentador fará sua primeira e mais furiosa investida contra vocês. Se são os guias que saem à frente, não deixará de acometê-los senão nos casos em que Deus não o permita. Põe contra vocês as maiores emboscadas, porque têm por missão causar-lhe o dano maior. Como ele odeia a Cristo mais que a nenhum de nós, por ser Jesus o general de campo e o Capitão da nossa salvação, e quem faz mais que o mundo inteiro contra o reino das trevas, é esta a razão que tem para fixar-se nos caudilhos que militam sob as bandeiras do Salvador, mais que nos soldados comuns que igualmente o fazem segundo sua proporção. Sabe quanta confusão pode introduzir no exército, se os chefes caem ante sua vista. Tem procurado sempre a maneira de combater contra estes, e não precisamente contra os maiores ou menores, comparativamente; e ferirá os pastores para poder dispersar o rebanho. E é tão grande o êxito que tem alcançado deste modo, que seguirá sua tática até onde possa. Tenham cuidado, portanto, meus irmãos, porque o inimigo os mira com especial atenção. Serão objeto de suas mais sutis insinuações, incessantes solicitações e violentos assaltos. Por sábios e eruditos que sejam tenham cuidado de si mesmos, não seja que supere a inteligência que pensam ter. O diabo é m ais instruído que vocês, e mais sagaz lutador, pode transformar-se num anjo de luz para enganá-los. Se introduzirá entre vocês e lhes lançara laços antes que possam colocar-se em guarda; fará troça de vocês sem revelar-se, e lhes persuadirá de sua fé ou inocência, e não saberão que a têm perdido. Mais ainda, lhes fará crer que as possuem em maior grau, quando já não a tenhais. E suas artimanhas serão tão adequadas a seu temperamento e disposição, que os levará a buscarem auxílio em si mesmos, e fazer que seus próprios princípios e inclinações os traiam, dessa maneira, sempre que os arruíne, lhes fará o instrumento de sua própria ruína. Que conquista pensará haver feito se puder tornar a um ministro inútil ou infiel; se pode induzi-lo à cobiça e ao escândalo. Se gloriará contra a igreja e dirá: “Estes são seus santos pregadores: vejam qual é sua grave falta, e aonde esta os levará.”. Se gloriará também contra o mesmo Jesus Cristo e dirá: “Estes são teus campeões ! Posso fazer que os principais dentre teus servos mofem de ti; posso fazer infiéis aos mordomos de tua casa.”. Se ele assim insultou a Deus partido de um juízo falso, dizendo-lhe que poderia fazer que Jó lhe blasfemasse em seu rosto, (Jó 2.5), o que não faria se ele de fato prevalecesse contra nós? E por último, lhe serviriam de troféu por haver podido arrastá-los a serem falsos em relação ao grande depósito que lhes foi confiado, a manchar sua santa profissão, e a prestar um serviço positivo a seu maior inimigo. Não comprazam desse modo a Satanás; não lhe prestem um auxílio tão eficaz; não permitam que lhes trate como os filisteus trataram a Sansão, isto é, que primeiro lhes prive de suas forças para fazê-los depois objeto de seu triunfo.”;
Uma vez mais. Devemos cultivar o maior grau de piedade, porque a natureza de nosso trabalho assim o requer imperativamente. A obra do ministro crente é bem executada na exata proporção com o vigor de nossa natureza renovada. Nosso trabalho está bem feito somente quando assim o está conosco mesmo. Qual é o obreiro, tal será sua obra. Fazer frente aos inimigos da verdade, defender os baluartes da fé; governar bem a casa de Deus; consolar aos que sofrem; edificar aos santos; guiar os irresolutos; sobrelevar os revoltosos; ganhar e nutrir as almas: todos estes trabalhos e outros mais não são para serem executados por uma pessoa débil de espírito ou disposta a fazer alto em seu caminho, senão estão reservados para as dotadas de um grande coração a quem o Senhor tem feito fortes para ele mesmo. Busquem, pois, força no Forte por excelência; sabedoria, na fonte do Saber; em suma, busquem tudo quanto há em Deus.
Em terceiro lugar, é necessário que o ministro tenha cuidado de que seu caráter pessoal concorde em todos os aspectos com seu ministério.
Todos temos ouvido a história do homem que pregava tão bem, e vivia tão mal, que quando estava no púlpito não havia quem não dissesse que nunca devia sair dele, e quando o deixava, todos a uma declaravam que não deveria voltar a ocupá-lo jamais. Que Deus nos livre de imitar a semelhante Janes. Não sejamos nunca ministros do Senhor no altar, e filhos de Belial fora da porta do tabernáculo; pelo contrário, sejamos como Nazianzeno disse de Basílio: “Raiou em nossa doutrina, e relampejou em nossa conversação.”. Não podemos confiar nos que têm duas caras, nem os homens creram jamais naqueles cujos testemunhos verbais e práticos são contraditórios entre si. Assim como os fatos segundo o provérbio, falam mais alto do que as palavras, assim também uma vida má sufocará, a voz do ministro mais eloqüente. Sobretudo, nossos edifícios mais seguros devem ser fabricados por nossas próprias mãos, nossos caracteres devem ser mais persuasivos que nossos discursos. Aqui devo admoestá-los não somente contra os pecados de comissão senão também contra os de omissão. Muitos pregadores se esquecem de servir a Deus quando estão fora do púlpito, sendo assim sua vida negativamente inconseqüente. Longe de nós, queridos irmãos, o pensamento de ser ministros automáticos, isto é, desses que se movem não por ter em si mesmos a virtude de fazê-lo, mas porque os colocam em movimento forças transitórias; dessas que somente são ministros a intervalos, sob a compulsão do toque da hora que os chama a seus trabalhos; e que deixam de sê-lo tão logo como baixam os escalões do púlpito. Há muitos que perseveram nas ministrações da verdade tanto tempo quanto há uma necessidade oficial de seu trabalho, porém, depois, não há pagamento, não há salário, não há sermão.
É uma coisa horrível o ministro ser inconseqüente. Se diz que nosso Senhor foi como Moisés, pela razão de haver sido um “profeta poderoso em palavras e em obras.”. O homem de Deus deve imitar o seu Senhor nisto:´é preciso que seja poderoso tanto na pregação de sua doutrina, como no exemplo que dê com suas obras, tendo, se possível, neste último, muito maior cuidado.
É de chamar a atenção que a única história eclesiástica que temos na Bíblia, seja a dos “atos dos Apóstolos”. O Espírito Santo não teve por conveniente conservar-nos os sermões dos apóstolos. Devem ter sido magníficos, muito melhores do que os que temos pregado, e contudo, o Espírito Santo tem tomado somente nota de seus “atos”. Não temos livros que contenham as resoluções dos apóstolos. Quando verificamos um registro de nossas minutas e resoluções, porém o Espírito somente consigna os “atos”. Nossos atos devem ser tais que mereçam ser registrados, já que de todas as maneira o tenham que ser. Devemos viver, portanto, como cumpre fazê-lo ao que se encontra sob o olhar imediato de Deus, e envolto na brilhante luz do grande dia que tudo revela.
A santidade em um ministro é sua necessidade principal uma vez que é seu mais piedoso ornamento. Uma mera excelência moral não é suficiente; deve haver a virtude mais elevada; é preciso que haja um caráter conseqüente, porém este necessita estar ungido com o óleo sagrado da consagração, pois do contrário careceremos do que nos faz mais flagrantes para Deus e para o homem. O ancião John Stoughton, num trabalho intitulado “Dignidade e Dever do Pregador”. Insiste sobre a santidade do ministro, em razões cheias de peso. “Se Uzá teve que morrer por tocar a arca de Deus, e isso que fez foi para sustentá-la quando estava prestes a cair; se os homens de Betesemes pereceram por terem olhado para dentro dela; se até os animais que não fizeram outra coisa que aproximar-se do Monte Santo, foram ameaçados, então que classe de pessoas devem ser admitidas para conversarem familiarmente com Deus; para estar diante dele como fazem os anjos, e contemplar Sua face continuamente; a carregarem a arca sobre seus ombros; a levarem Seu nome entre os gentios; em resumo, a serem Seus embaixadores? A santidade é própria de tua casa, Oh Senhor. E não seria uma coisa ridícula pensar ou imaginar que se os vasos devem ser santos, as vestes devem ser santas, tudo enfim, deve ser santo, com a única exceção daquele sobre cujas vestes deve estar escrito santidade ao Senhor ? Não, os ministros devem ser luzes ardentes e brilhantes, pois do contrário sua influência despertará alguma qualidade malígna; devem ruminar o alimento e ter o casco dividido, ou são imundos; devem distribuir a Palavra retamente, e andar também retamente em sua vida, e unificar assim sua vida e seu ensino. Se carecem de santidade os embaixadores, desonram ao país de onde vêm, e o príncipe da parte de quem vêm; e este Amasa morto, esta doutrina morta, não animada com uma boa vida, jazendo no caminho, detém o povo do Senhor, impedindo-lhe que prossiga alegremente em sua luta espiritual.”.
A vida do pregador deve ser um imã que atraia os homens a Cristo, e é coisa triste a verdade, que os mantenha separados dele. A santidade dos ministros é um chamamento expressivo ao arrependimento que se faz aos pecadores, e quando vem acompanhada de uma jovialidade piedosa, se faz atrativa de um modo irresistível. Jeremy Taylor na rica linguagem que lhe é própria nos diz: “As pombas de Herodes nunca teriam induzido a tantas companheiras suas forasteiras a entrarem em seu pombal, se não houvessem sido untadas com bálsamo. De igual modo, se vossa vida fosse excelente, se vossas virtudes fossem como precioso ungüento, logo faríeis que os que estão ao vosso cargo corressem atrás do vosso perfume, porém deveis ser excelentes não tanto quanto um do povo, senão tanto quanto homem de Deus, não segundo a maneira comum dos homens, senão segundo o próprio coração de Deus, e os homens se esforçaram para serem como vós, se vos esforçais para ser como Deus.”.
Outro teólogo admirável, o bispo Reynolds, tem dito energicamente e com razão: “A estrela que conduziu os sábios ao Cristo, a coluna de fogo que conduziu os filhos de Israel a Canaã, não somente brilhava, como também ia adiante deles. Mt 2.9; Êx 13.21. A voz de Jacó não se terá muito em conta se as mãos são as de Esaú. Na lei, nenhuma pessoa que estivesse manchada poderia oferecer oblações ao Senhor (Lev 21.17-20); ensinando-nos o Senhor assim que graças deveria haver em seus ministros. O sacerdote teria que levar em sua túnica, campainhas e romãs: as primeiras como figura de sua sã doutrina, e as outras de uma vida frutífera (Êx 28.33,34). O Senhor será santificado em todos aqueles que dEle se aproximem (Is 52.11) porque os pecados dos sacerdotes fazem o povo menosprezar os sacrifícios do Senhor (I Sm 2.17); suas vidas mal dirigidas fazem que suas doutrinas sejam desonradas. Como diz Santo Agostinho: “com sua doutrina edificam bem, e com sua vida destroem. Em um ministro de Cristo devem estar em harmonia sua língua, seu coração e suas mãos.”.
O ministro deve ainda cuidar que sua vida esteja em conformidade com seu ministério. É preciso cuidar especialmente de não deixar de cumprir sua palavra. Isto deve ser levado até a escrupulosidade: a verdade não somente deve estar em nós, como também deve tirar seu brilho de nós. Devemos ser exatos quanto ao cumprimento de nossa palavra.
Devemos lembrar que muita atenção está fixada sobre nós. Os homens apenas se atrevem a quebrar a lei à vista aberta de seus semelhantes, pois bem, nesta publicidade vivemos e nos movemos. Somos vigiados por milhares de olhos perspicazes como de águias. A posição pública que ocupamos será para nós um grande ganho se pudermos mostrar os frutos do Espírito Santo em nossa vida: muito cuidado, meus irmãos, de não desperdiçar esta vantagem.
Evitem, queridos irmãos, contraírem dívidas ainda que sejam pequenas, toda falta de formalidade, o imiscuir-se em maledicências, o entabular disputas, e todos os defeitos que devem ser evitados.
A indulgência com que alguns julgam a si mesmos, e que tem ocasionado a destruição da reputação de muitos, é uma coisa que nunca devem se permitir. Certas familiaridades que dão lugar a que se suspeite do que as pratica, devem ser evitadas, procedendo-se com todo o maior decoro e castidade. A aspereza de caráter que faz a alguns terríveis e repelentes, e as chocarrices que fazem aos outros depreciáveis, são defeitos de que devemos fugir. Estamos expostos a corres grandes conflitos se nos permitimos certas coisas tidas como pequenas. Devemos ter por regra a norma bíblica de não dar “nenhum motivo de escândalo, em cousa alguma, para que o ministério não seja censurado” (II Cor 6.3). Entenda-se, contudo, que não queremos dizer com isto que estamos obrigados a nos sujeitar a qualquer moda ou capricho da sociedade em que vivemos. Por regra geral, nos desgostam as modas da sociedade e detestamos o convencionalismo, e se me parecesse melhor passar por cima de uma lei imposta por uma vã etiqueta, não teria escrúpulo em fazê-lo. Não, somos homens livres e não escravos, e não temos necessidade de abrir mão de nossa liberdade para nos convertermos em lacaios dos que se apavoneiam em elegância. Entretanto devemos fugir de tudo que revele falta de boa educação ou que seja grosseiro, por estarem estas coisas muito próximas do pecado. Cristo nos deu o exemplo, e nunca foi grosseiro, baixo, descortês ou mal educado.
Mesmo em suas recreações não esqueçam que são ministros. Mesmo quando estiverem fora de ação, são, sem dúvida, oficiais do exército de Cristo, e devem conduzir-se como tais. E se em relação às coisas pequenas é preciso que sejam tão cuidadosos, quanto não terão que ser tratando-se de grandes assuntos de moralidade, de honestidade e integridade. Nisto o ministro não deve nunca faltar. Sua vida privada tem que estar sempre em harmonia com a santidade de seu ministério, ou este chegará logo ao seu fim e quanto mais breve o abandone será melhor, porque a continuação em seu cargo não fará mais que desonrar a causa de Deus e lavrar sua própria ruína.
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A Igreja tem testemunhado a redenção de Cristo juntamente com o Espírito Santo nestes 2.000 anos de Cristianismo.
Veja várias mensagens sobre este testemunho nos seguintes links:
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A Bíblia também revela as condições do tempo do fim quando Cristo inaugurará o Seu reino eterno de justiça ao retornar à Terra. Com isto se dará cumprimento ao propósito final relativo à nossa redenção.
Veja a apresentação destas condições no seguinte link:
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Silvio Dutra Alves
Enviado por Silvio Dutra Alves em 22/02/2013
Alterado em 10/07/2014