Se o atalaia de Deus não pregar o evangelho e não der o sonido certo da trombeta para alertar os pecadores do juízo que lhes aguarda e caso não se convertam dos seus pecados para Deus, ele será considerado responsável pelo sangue dos que perecerem pela falta do atalaia no cumprimento do seu ministério.
Ainda que tais pessoas que se perdem não estivessem marcadas para a vida eterna, o atalaia será considerado culpado da perda delas caso pereçam sem terem ouvido a verdade que cabia a ele lhes anunciar. Certamente com isto, Deus quis deixar garantida a necessidade de esforço para a pregação do evangelho, porque é por meio disto que os eleitos são salvos. Se não houvesse este peso de responsabilidade de responder até mesmo pelas vidas daqueles que se perderiam ainda que debaixo da pregação, é possível que muitos cristãos se acomodassem na sua obrigação de pregar o evangelho a todos. Assim Deus lhes impôs este peso de responsabilidade, na consideração da culpa deles de se omitirem deste dever, de maneira, que tenham temor e se apliquem a cumprir a sua missão de atalaia no mundo.
Em Atos 20.26,27 nós lemos:
“26 Portanto, no dia de hoje, vos protesto que estou limpo do sangue de todos. 27 Porque nunca deixei de vos anunciar todo o conselho de Deus.”
Crisóstomo disse que somente alguém como Paulo poderia fazer uma declaração como esta, e daí nós percebemos o peso da grande responsabilidade que está sobre os ombros dos servos de Deus em anunciar a verdade do evangelho a todos os homens.
O sangue tipifica a vida nas Escrituras, e o fato de ser culpado do sangue seria então um modo de se referir à culpa pela perda da vida de alguém. A expressão em sentido evangélico aponta para o fato de se omitir no dever de dar testemunho do evangelho, condição esta que será considerada por Deus como sujeita ao Seu juízo quanto a ser atalaia infiel julgado como culpado por aqueles que se perdem sem que tivessem sido avisados por ele da necessidade de conversão para ser livrado da condenação eterna.
Paulo disse que não veria mais os efésios porque havia cumprido totalmente o trabalho de pregar o evangelho a eles, indo de casa em casa anunciando a Cristo, e que agora, ele sabia, pelo Espírito que deveria cumprir o mesmo dever em outras localidades porque já havia cumprido a sua missão em Éfeso, e nada mais tinha que fazer junto a eles, pessoalmente.
Nós devemos pensar frequentemente nisto, que aqueles que agora estão pregando para nós o reino de Deus serão removidos brevemente e nós não veremos nunca mais as faces deles. Os profetas vivem para sempre? Ainda que por breve tempo a luz deles esteja conosco; nós devemos nos empenhar para melhorar aquilo que nós já possuímos e as graças e os dons espirituais que eles compartilharam conosco, de maneira que embora não os vejamos mais aqui na terra, nós podemos esperar contemplar as faces deles com conforto naquele grande dia em que todos estaremos reunidos com o Senhor na glória.
Que todo cristão portanto, e especialmente os ministros do evangelho sigam o exemplo de Paulo quanto a não serem achados culpados diante de Deus pela ruína de qualquer alma preciosa, de maneira que sejam achados limpos do sangue de todos os homens, ou seja, da vida das almas.
Este dever de dar testemunho da verdade foi imposto por Deus a todos os seus servos desde o princípio do mundo, conforme podemos ver nas palavras de Ezequiel 33.6:
“Mas, se quando o atalaia vir que vem a espada, e não tocar a trombeta, e não for avisado o povo, e a espada vier, e levar uma vida dentre eles, este tal foi levado na sua iniquidade, porém o seu sangue requererei da mão do atalaia.” (Ez 33.6).
O atalaia fiel poderá dizer aos que se perderam debaixo do seu testemunho: “você se recusou a se converter, mas eu dei o aviso, de maneira que o sangue de qualquer homem não pode ser posto na minha conta.”.
Um ministro fiel do evangelho deve portanto se aplicar à pregação e ensino da genuína Palavra de Deus, de forma que esteja puro do sangue de todos os homens, por ter dado testemunho da verdade. Ele sabe que lhe está imposto o dever de pregar o evangelho, e sabe que o sangue daqueles que perecem cai sobre as próprias cabeças deles porque apesar de terem sido advertidos eles não lhe deram ouvidos.
Foi exatamente isto o que se deu com Paulo quando pregou aos judeus de Corinto que haviam rejeitado o evangelho. Ele lhes disse:
“ Mas, resistindo e blasfemando eles, sacudiu as vestes, e disse-lhes: O vosso sangue seja sobre a vossa cabeça; eu estou limpo, e desde agora parto para os gentios.” (At 18.6).
Paulo declarou a eles ter cumprido o seu dever para com eles e que os deixaria perecer na incredulidade deles. Paulo tinha sido impulsionado em seu espírito a pregar Cristo a eles (v.5), mas eles não somente O rejeitaram como também blasfemaram (v.6), motivo pelo qual Paulo lhes disse que se voltaria para os gentios.
Paulo tinha feito a sua parte e estava limpo do sangue das almas deles, porque tinha, como um atalaia fiel, advertido a todos eles, e assim, livrou a sua própria alma de qualquer juízo de Deus.
Os judeus não podem reclamar porque a oferta da graça do evangelho foi feita primeiramente a eles. E de igual modo não podem reclamar todos aqueles que tanto entre judeus e gentios, ainda hoje recusam aceitar a salvação que está sendo pregada pelos atalaias fiéis do Senhor. Não importa quantos sejam os recusadores, porque estamos avisados que os últimos dias seriam como os dias de Noé, em que as pessoas se recusavam a dar ouvidos à verdade e se arrependerem de seus pecados, mas Noé cumpriu fielmente o seu ministério de pregoeiro da justiça, mesmo em face do endurecimento de toda aquela geração que pereceu no dilúvio. Cumpramos portanto fielmente o nosso dever de atalaias de Deus e estaremos com isto livrando a nós mesmos de sermos achados culpados diante de Deus pelos que se perderam sem que ouvissem dos nossos lábios o testemunho da verdade.