Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
DEPRESSÃO – Parte 3
 
Citações do Livro de autoria de D. M. Lloyd Jones, intitulado Depressão.
 
Agora passemos à segunda grande causa da depressão: condições físicas. Isso surpreende alguém? Há alguém que pensa que a condição física do seu corpo não importa desde que é cristão? Bem, se pensa assim, não vai demorar para sofrer uma desilusão. A condi­ção física tem muita influência nisso tudo. É difícil marcar uma linha divisória entre esta causa e a anterior, porque o tempera­mento parece ser controlado, até certo ponto, por condições físicas, e na verdade há pessoas que são, parece, fisicamente vulneráveis ao problema da depressão espiritual. Em outras palavras, existem certas debilidades físicas que tendem a causar depressão. Acho que Thomas Carlyle foi um bom exemplo disso. Ou tomemos aquele extraordinário pregador inglês do século passado, que pre­gou em Londres por quase quarenta anos — Charles Haddon Spurgeon — um dos maiores pregadores de todos os tempos. Esse grande homem era sujeito a depressão espiritual, e a explicação, no caso dele, sem dúvida era o fato de que ele sofria de gota, o problema que acabou causando a sua morte. Ele teve que enfrentar esse problema de depressão espiritual muitas vezes em sua forma mais intensa. Essa tendência à depressão profunda era uma conse­quência do problema de gota, problema esse que Spurgeon herdou de seus ancestrais. E há muitas pessoas que me procuram em busca de ajuda para o problema de depressão, em cujos casos se torna óbvio para mim que a causa de seu problema é, princi­palmente, física. Estão incluídos nesse grupo de causas físicas: cansaço, esgotamento, "stress", e qualquer tipo de doença. Não se pode isolar o físico, separando-o do espiritual, pois somos corpo, mente e espírito. Os melhores cristãos são mais propensos a ata­ques de depressão espiritual quando estão fisicamente fracos — e encontramos grandes ilustrações disso na Bíblia.
Quero dar uma palavra de advertência nesta altura. Não podemos esquecer a existência do diabo, nem permitir que ele nos engane, considerando espiritual aquilo que é fundamentalmente físico. Mas por outro lado, devemos ser cuidadosos nessa distin­ção em todos os aspectos; porque, se jogamos toda a culpa em nossa condição física, podemos nos tornar culpados num sentido espiritual. Entretanto, se reconhecermos que nosso físico pode ser parcialmente responsável por nosso problema espiritual, e levar­mos isso em consideração, será mais fácil tratar do espiritual.
Outra causa frequente da depressão espiritual é o que pode­ríamos chamar de "reação" — reação a uma grande bênção, ou a uma experiência extraordinária ou fora do comum.
Pretendo cha­mar atenção posteriormente ao caso de Elias, assentado debaixo do zimbro. Não tenho nenhuma dúvida de que seu problema era que ele estava sofrendo de uma reação ao que acontecera no Monte Carmelo (I Reis, capítulo 19). Abraão teve a mesma experiência (Génesis, capítulo 15). Por isso, quando alguém vem me contar a respeito de alguma experiência extraordinária que teve, eu me regozijo com a pessoa, dando graças a Deus; mas passo a obser­vá-la atenta e apreensivamente depois disso, caso haja uma reação. Isso não precisa acontecer, mas pode se dar se não estivermos cientes dessa possibilidade. Se apenas compreendêssemos que quan­do Deus se agrada em nos dar uma bênção incomum, deveríamos redobrar nossa vigilância, então poderemos evitar essa reação.
Passemos para a causa seguinte. Em certo sentido, em última análise, esta é a única causa da depressão espiritual — é o diabo, o inimigo de nossas almas. Ele pode usar nosso temperamento e nossa condição física. Ele nos manipula de tal forma que acabamos permitindo que nosso temperamento nos controle e governe nossas ações, em vez de nós mantermos o controle sobre ele. São incon­táveis os meios pelos quais o diabo causa a depressão espiritual. Temos que nos lembrar dele. O seu objetivo é deprimir o povo de Deus, de tal forma que ele possa ir ao homem de mundo, dizen­do: "Eis o povo de Deus; você quer ser assim?" A estratégia do adversário de nossas almas, o adversário de Deus, é de nos levar à depressão e ao estado de espírito do salmista quando estava atravessando este período de perturbação e infelicidade.
Na verdade, posso resumir a questão desta forma: a causa básica de toda depressão espiritual é incredulidade, pois se não fosse por ela nem o diabo poderia fazer coisa alguma. É porque prestamos atenção ao diabo em vez de ouvirmos a Deus, que caímos derrotados diante dos ataques do inimigo. Por isso é que o salmista continua dizendo a si mesmo "Espera em Deus, pois ainda o louvarei". Ele volta o seu pensamento para Deus. Por quê? Porque ele estava deprimido, e tinha se esquecido de Deus, de forma que sua fé em Deus e no Seu poder, e sua confiança no relacionamento que tinha com o Senhor, não eram o que deveriam ser. Podemos, portanto, resumir tudo isso, afirmando que a causa fundamental é pura e simples incredulidade.
Até aqui, então, temos examinado as causas. E quanto ao tratamento? Abreviadamente, por ora a primeira coisa que preci­samos aprender é o que o salmista aprendeu — precisamos assu­mir o controle de nós mesmos. Este homem não se contentou em ficar sentado, sentindo pena de si mesmo. Ele fez alguma coisa a respeito. Assumiu o controle de si mesmo. Mas ele fez uma coisa ainda mais importante. Falou consigo mesmo. Ele se voltou para si mesmo, dizendo: "Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas dentro de mim?" Fala consigo mesmo; argumenta consigo mesmo. No entanto, alguém indaga: "Mas não é exata­mente isso que devemos evitar, já que gastar tempo demais con­sigo mesmo é uma das causas do problema? Isso contradiz suas declarações anteriores! Fomos advertidos contra introspecção e morbidez, e agora nos diz que devemos falar conosco mesmos!"
Como podemos harmonizar as duas coisas? Desta maneira: eu estou dizendo que devemos falar com o nosso "eu" em vez de permitir que o nosso "eu" fale conosco! Entendem o que isso significa? Estou dizendo que o maior problema em toda essa questão de depressão espiritual, num sentido, é que permitimos que o nosso "eu " fale conosco, em vez de nós falarmos com o nosso "eu". Estou tentando ser deliberadamente paradoxal? De modo algum. Isso é a essência da sabedoria nesta questão. Já perceberam que uma grande parte da infelicidade e perturbação em suas vidas provém do fato, que estão escutando a si mesmos em vez de falar consigo mesmos? Por exemplo, considerem os pensamentos que lhes vêm à mente quando acordam de manhã. Vocês não os originaram mas esses pensamentos começam a "falar" com vocês, trazendo de volta os problemas de ontem, etc. Alguém está falando. Quem está lhes falando? O seu "eu" está falando com vocês. Ora, o que o salmista fez foi o seguinte: em vez de permitir que esse "eu" falasse com ele, ele começou a falar con­sigo mesmo. "Por que estás abatida, ó minha alma?" ele pergunta. Sua alma estava deprimida, esmagando-o. Por isso ele se dirige a ela, dizendo: "Ouça por um momento, eu quero falar contigo". Vocês entendem o que estou falando? Se não, é porque ainda não tiveram muita experiência com estas coisas.
A arte maior na questão da vida espiritual é saber como dominar-se. Um homem precisa ter controle sobre si mesmo, deve falar consigo mesmo, exortar e examinar a si mesmo. Deve pergun­tar à sua alma: "Por que estás abatida?" "Como pode se abater assim?" Você como ele, precisa se voltar para si mesmo — re­preendendo, censurando, condenando, exortando — e dizendo a si mesmo: "Espera em Deus", em vez de resmungar e murmurar dessa maneira infeliz e deprimida. E então deve prosseguir, lem­brando-se de Deus: quem Ele é, o que Ele é, o que Ele tem feito, e o que tem prometido fazer. Tendo feito isso, termine com esta nota de triunfo: desafie a si mesmo, desafie os outros, desafie o diabo e o mundo todo, dizendo com este homem, "Eu ainda o louvarei. Ele é a salvação da minha face, e o meu Deus".
Essa é a essência do tratamento, em resumo. Os demais capí­tulos serão apenas uma exposição mais elaborada do que foi apre­sentado aqui. A essência desta questão é entender que este nosso "eu" interior — esta outra pessoa dentro de nós — precisa ser controlado. Não lhe dê atenção — fale com ele, condenando, cen­surando, exortando, encorajando, relembrando-o daquilo que você sabe — em vez de ouvir placidamente o que ele tem a dizer, permitindo que ele o leve ao desânimo e à depressão. Certamente é isto que ele sempre fará, se você lhe entregar o controle. O diabo tenta controlar o nosso "eu" interior, usando-o para nos deprimir. Precisamos nos erguer, dizendo como este homem: "Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas dentro de mim?" Pare com isso! "Espera em Deus, pois o louvarei. Ele é a salvação da minha face, e o meu Deus".
 
D. M. Lloyd Jones
Enviado por Silvio Dutra Alves em 14/05/2013
Alterado em 14/05/2013
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