Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
DEPRESSÃO – Parte 2
 
Citações do Livro de autoria de D. M. Lloyd Jones, intitulado Depressão.
 
Todos nós somos seres humanos, tendo basicamente a mesma constituição física, no entanto sabemos muito bem que não há duas pessoas idênticas. Na verdade, somos todos diferentes em muitos aspectos. Ora, muitas vezes encontramos pessoas que defen­dem estilos de vida, ou métodos de tratamento de doenças, que ignoram completamente este fato fundamental, e portanto, estão obviamente erradas. Elas receitariam a mesma dieta para todo mundo. Prescrevem este regime universal, afirmando que vai curar todo mundo. Isso, eu digo, é impossível, e basicamente errado.
Muitas vezes tenho dito que a primeira lei fundamental da dietética se resume naquele ditado, em inglês, que traduzido diz mais ou menos o seguinte: "João da Silva não podia comer gor­dura, sua mulher não podia comer carne". Está certo! É uma declaração engraçada, num sentido, mas por outro lado, é um princípio fundamental de nutrição. João da Silva tem uma consti­tuição diferente da de sua mulher, e sugerir que a mesma dieta seria perfeita para ambos é um erro fundamental. Ambos são seres humanos, mas como seres humanos são diferentes em sua consti­tuição física. Ou, para citar outro exemplo, vejam a tendência de insistir que todas as crianças nas escolas façam ginástica. Aí temos novamente o mesmo erro. Todos diferimos em altura e cons­tituição física, e é algo irracional estabelecer uma regra inflexível para incluir todos os tipos. Alguns têm aptidão para essas coisas, e outros não; e exigir que todas as crianças participem do mesmo tipo de atividade física é tão absurdo como submeter todas as pessoas à mesma dieta. Todos necessitamos de exercício, mas não do mesmo tipo ou na mesma quantidade.
Menciono isso para ilustrar essa tendência à arregimenta­ção; e o ponto que quero esclarecer é que não podemos estabelecer leis assim generalizadas e universais, como se os homens fossem máquinas. É errado na esfera física, como eu acabo de demonstrar, e é muito mais errado na esfera espiritual.
É bem óbvio que podemos dividir os seres humanos em dois grupos básicos — os introvertidos e os extrovertidos. Há um tipo de pessoa que está constantemente voltada para dentro de si mesma, e outro tipo cuja atenção está em geral voltada para fora. E é muito importante compreender, não só que pertencemos a um desses dois grupos, mas também que o problema de depressão espiritual tende a afetar um desses grupos mais do que afeta ao outro. Precisamos começar por conhecer e entender a nós mesmos.
Há um tipo de pessoa que é especialmente vulnerável ao pro­blema da depressão espiritual. Isso não significa que essas pessoas sejam piores do que as outras. Na verdade, eu poderia sustentar com boa base que as pessoas que se destacaram de forma gloriosa na história da Igreja eram, muitas vezes, do tipo que estamos considerando. Alguns dos maiores santos eram introvertidos; o extrovertido geralmente é uma pessoa mais superficial. Na esfera natural existe o tipo de pessoa que está sempre fazendo auto-aná­lise, avaliando tudo o que faz, e se preocupando com os possíveis efeitos de suas ações, sempre olhando para trás, sempre cheia de remorsos fúteis. Pode ser algo que foi feito uma vez para sempre, mas ela não consegue esquecê-lo. Não pode desfazer o que foi feito, entretanto passa o tempo todo se analisando, culpando e condenando. Vocês estão familiarizados com esse tipo de pessoa.
Ora, tudo isso é também transferido para a esfera do espírito, afetando sua vida espiritual. Em outras palavras, há um perigo de que tais pessoas se tornem mórbidas. Eu já disse que poderia mencionar nomes. Certamente um deles foi o grande Henry Martin. Não se pode ler a vida desse grande homem de Deus sem se chegar à imediata conclusão de que ele tinha uma personalidade introspectiva. Era introvertido, e sofria de uma tendência óbvia para a morbidez e a introspecção.
Esses dois termos nos lembram que o problema fundamental dessas pessoas, é que elas muitas vezes não cuidam de estabelecer a linha divisória entre auto-análise e introspecção. Todos concor­damos com a necessidade de nos examinarmos a nós mesmos, mas também concordamos que a introspecção e a morbidez são coisas nocivas. Qual, então, é a diferença entre auto-análise e introspec­ção? Eu diria que atravessamos a linha divisória entre auto-análise e introspecção quando não fazemos outra coisa senão nos exami­nar, e quando essa auto-análise se torna o fim dominante da nossa vida. Devemos nos examinar periodicamente, porém se o fazemos constantemente, colocando, por assim dizer, a nossa alma num recipiente para dissecá-la, isso é introspecção. E se estamos sempre falando com os outros a respeito de nós mesmos, de nossos pro­blemas e dificuldades, e nos aproximamos deles com uma carranca, dizendo: "Tenho tantos problemas!" — provavelmente isso signi­fica que estamos sempre com nossa atenção toda concentrada em nós mesmos. Isso é introspecção, e pode levar à condição conhe­cida como morbidez.
Aqui, então, é o ponto aonde devemos começar. Será que nos conhecemos a nós mesmos? Sabemos quais são as áreas es­pecíficas de perigo para nós? Sabemos a que é que somos espe­cialmente vulneráveis? A Bíblia está repleta de ensinamentos sobre isso. Ela nos exorta a sermos cuidadosos com respeito às nossas forças e às nossas fraquezas. Tomemos Moisés como exemplo. Ele era o homem mais manso sobre a Terra, segundo a Bíblia; e, no entanto, seu maior fracasso teve ligação exatamente com isso. Ele afirmou sua própria vontade, e ficou irado. Temos que vigiar tanto nossas forças como nossas fraquezas. A essência da sabedoria é compreender este fato fundamental sobre nós mesmos. Se eu, por natureza, sou um introvertido, tenho que exercer uma vigilância constante e advertir a mim mesmo sobre isso, para não cair incons­cientemente num estado de morbidez. Da mesma forma, o extro­vertido precisa conhecer-se a si mesmo, mantendo vigilância contra as tentações peculiares à sua natureza. Alguns de nós, por natu­reza e devido ao nosso temperamento, somos mais suscetíveis à esta doença chamada depressão espirtual do que outros. Perten­cemos ao mesmo grupo que Jeremias, João Batista, Paulo, Lutero e muitos outros. Uma companhia muito seleta! Sim, mas não se pode pertencer a ela sem ser especialmente vulnerável a esse tipo específico de tribulação.
 
D. M. Lloyd Jones
Enviado por Silvio Dutra Alves em 14/05/2013
Alterado em 14/05/2013
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