A Inclinação da Carne é Inimizade Contra Deus – Parte 6
Por Charles Haddon Spurgeon (adaptado)
O homem completo está estropiado. Olhem nossa memória; acaso não é verdade que a memória participa da queda? Eu posso recordar muito mais as coisas más que as coisas que tem cheiro de piedade. Se eu escuto uma canção lasciva, essa música do inferno ficará em meus ouvidos até que eu fique grisalho. Mas se escuto uma nota de santo louvor: ai!, me esqueço! Por que a memória aperta com mão de ferro as coisas más, mas sustém com dedos frágeis as coisas boas. A memória permite que o cedro glorioso dos bosques do Líbano flutue sobre a corrente do esquecimento, mas retém toda a imundície que chega flutuando da depravada cidade de Sodoma.
A memória recordará o mal, mas esquecerá o bem. A memória participa da queda. O mesmo ocorre com os afetos. Amamos as coisas terrenas mais do que deveríamos amá-las; rapidamente entregamos nosso coração a uma criatura, mas raras vezes o oferecemos ao nosso Criador; E quando o coração é entregue a Jesus, é propenso a se extraviar.
Olhem a nossa imaginação também. Oh! Como se deleita a imaginação quando o corpo se encontra em uma condição perniciosa. Somente dêem ao homem algo que o leve a ponto de intoxicar-se; droguem-no com ópio; e como dançará sua imaginação cheia de alegria! Como pássaro liberto de sua jaula, como se renovará com asas mais vigorosas que as asas da águia! Vê coisas que nem sequer havia sonhado nas sombras da noite. Por que razão sua imaginação não trabalhou quando seu corpo se encontrava em um estado normal, quando era saudável? Simplesmente porque a imaginação é depravada; e enquanto não se introduziu um elemento imundo, enquanto o corpo não havia começado a estremecer-se com um tipo de intoxicação, a fantasia não pensava celebrar seu carnaval. Temos alguns esplêndidos exemplos do que o homem pode escrever, quando influenciado pela maldita aguardente. Pelo fato de que a mente é tão depravada, ela se encanta com tudo aquilo que põe o corpo em uma condição anormal; e aqui temos uma prova que a própria imaginação se extraviou.
O mesmo acontece com o juízo: posso demonstrar quão imperfeitamente decide. Também posso acusar a consciência, e dizer-lhe quão cega é ela, e como lhe cintila o olho ante os maiores desatinos. Posso examinar todos nossos poderes, e escrever na frente de cada um deles: “Traidor ao céu! Traidor ao céu!” Toda “a mente posta na carne é inimiga de Deus”.
Agora, meus queridos leitores, “somente a Bíblia é a religião dos protestantes”: mas sempre que reviso um certo livro tido em grande estima por nossos irmãos anglicanos, o encontro inteiramente ao meu lado, e invariavelmente sinto um grande deleite ao citá-lo. Vocês sabem que sou um dos melhores clérigos da Igreja da Inglaterra, o melhor, se me julgarem pelos Artigos, e o pior se me julgarem por qualquer outra norma?
Meçam-me pelos Artigos da Igreja da Inglaterra, e não ocuparia o segundo lugar ante ninguém abaixo do céu azul do firmamento, pregando o evangelho contido neles; pois se há um excelente epítome do Evangelho, se encontra nos Artigos da Igreja da Inglaterra. Permitam-me mostrar-lhes que não estiveram escutando uma doutrina estranha. Temos, por exemplo, o artigo nono, sobre o pecado de nascimento, o pecado original: “O pecado original não consiste em seguir a Adão (como o afirmam em vão os pelagianos), mas é a falha e a corrupção da natureza de cada indivíduo, que naturalmente é engendrada pela prole de Adão, pela qual o homem está sumamente distanciado da justiça original, e é por sua própria natureza propenso ao mal, de tal forma que o desejo da carne é contra o Espírito; e, portanto, toda pessoa vinda a este mundo merece a ira de Deus e a condenação.
E esta infecção da natureza efetivamente permanece, sim, nos que são regenerados; pelo qual a concupiscência da carne, chamada no grego: phronema sarkos, que alguns expõem como a sabedoria, a sensualidade, o afeto, o desejo da carne, não está sujeita à Lei de Deus. E ainda que não haja condenação para os que crêem e são batizados, contudo o apóstolo confessa que a concupiscência e a lascívia têm em si a natureza do pecado. Não necessito mis nada. Acaso alguém que creia no Livro de Oração discordará da doutrina que “a mente posta na carne é inimiga de Deus”?
Charles Haddon Spurgeon
Enviado por Silvio Dutra Alves em 24/05/2013