Lutero - A Fé que Opera pelo Amor – P 3
Por Charles Haddon Spurgeon
III. Nesse momento, essa noite, em terceiro lugar, quero dizer algo bom sobre uma outra questão – COMO A FÉ OPERA? Pois, de acordo com o nosso texto, é: “A fé que opera pelo amor”. É uma Fé que vive, trabalha, ama, e que, sozinha, salva a alma. Eu não posso lhe dizer das duras coisas que tenho ouvido falar sobre essa doutrina da salvação pela Fé. Eles dizem que é imoral. Tenho ouvido homens imorais dizerem isso e, certamente, eles têm propriedade no assunto! Dizem que essa doutrina leva ao pecado, e aqueles que assim afirmam estariam, a meu ver, bastante satisfeitos com isso por este motivo mesmo, se eles acreditassem nessa sua própria declaração. Eu nunca ouvi um santo condenar sua Fé por levá-lo ao pecado. Eu sei que em nenhum homem que segue a Deus, e vive perto dEle, que está sob Seu temor, a Fé em Deus vai tentá-lo ao pecado!
Na realidade, a Fé não faz nada disso! A Fé age fazendo justamente o inverso. Como a esposa prudente, em Provérbios, a Fé vai edificar um bom homem, e não o prejudicar todos os dias da sua vida. Primeiro, ela toca as engrenagens de nossa natureza, criando o amor dentro da alma. O que seria necessário, agora, para as classes degradadas de Londres? Regulamentos sanitários? Pode ser, se eles não forem só como que letras mortas para quem precisa deles na sua execução. Casas novas? De todos os tipos, por todos os meios – quanto mais, melhor. Aluguéis mais baixos? Com certeza, pois ninguém tem o direito de cobrar altos preços por acomodações insalubres. Salários mais altos? Certamente, poderíamos nos virar muito melhor com um pouco mais.
Outras coisas mais são necessárias. Enquanto num dado local existem palácios nas esquinas, você não vai progredir muito exaltando as massas, e eu acredito que os bares continuarão cheios enquanto ainda houver gosto pela bebida. Suponha que essas lojas, com licença para vender bebidas, fossem fechadas – isso bastaria? Acho que não. Há homens e mulheres em Londres, milhares deles, que, se fossem colocados em casas mais limpas, a quilômetros de distância de um bar, ainda beberiam e ainda transformariam suas casas em pocilgas! O que é necessário? Oh, se você pudesse fazer deles cristãos! Suponha que eles pudessem nascer de novo. Suponha que eles passassem a amar as coisas que agora odeiam, e a odiar as coisas que agora amam. Novos corações e espíritos retos são a necessidade dos párias de Londres!
Como tais coisas podem ser produzidas? Pela mão de Deus, com o Espírito Santo – é exatamente assim que a Fé opera no coração! Imaginemos que aqui está um relógio. “Ele precisa ser limpo.” Sim, limpe-o. “Ele não funciona; precisa de um novo cristal.” Bem, coloque-no um novo cristal. “Ainda assim, não funciona. Ele precisa de novos ponteiros.” Ache um jeito de dar-lhe novos ponteiros! Ainda assim, não funciona. Qual é o problema dele então? O fabricante diz que ele precisa de um novo motor. Há uma fonte para o mal – nada pode estar certo até que ele seja consertado. Conserte tudo o mais, mas não esqueça de que o motor é a parte mais importante! A Fé fornece à alma uma poderosa fonte de ação. Ela diz ao homem: “Você está perdoado pelo sangue de Cristo, que morreu por você – como você se sente em relação a Ele?”
O homem replica: “Eu amo o Senhor por ter me redimido”. Jesus amado, o homem tem, agora, dentro de sua alma, a semente de todo o bem. Ele vai se tornar uma criatura mais santa e melhor, pois ele começou a amar, e o amor é a mãe de santidade. Há algum serviço no mundo que se compare ao serviço do amor? Você tem um funcionário em sua casa, servil e obediente, mas se você reduzisse seu salário, ele iria lhe mostrar a aspereza de sua língua e buscar outro emprego! Você não espera dele nada mais que isso, e se você espera, não vai conseguí-lo. Quão diferente era um antigo funcionário de quem ouvi, que quando seu patrão foi à ruína no mundo, ficou contente com metade do salário que recebia! E quando ele foi tristemente avisado de que deveria partir, por seu patrão não teria mais como lhe comprar roupas, ele fez com que suas velhas vestes durassem mais, pois ele não deixaria seu patrão em sua velhice. Ele preferiria ter ganho o pão para o seu velho patrão, a tê-lo deixado! Ele era um servo apegado, que valia seu peso em ouro! Há poucos empregados como esse hoje em dia, pois não são muitos patrões como tal. Este tipo de serviço não pode ser adquirido, mas seu preço está acima do de rubis.
Quando o Senhor nos leva a crer em Jesus, nos tornamos, a partir de então, Seus amados servos, e não O servimos buscando recompensas, mas sim servimos por gratidão! Não estão mais conosco tanto trabalho e tanto pagamento – não tememos a ameaça do inferno pela desobediência, nem olhamos para o céu como se o tivéssemos conquistado por obras. Não, não, nossa salvação é um presente livre! Foi-nos fornecida através de infinito amor, de compaixão suprema e, portanto, retribuímos com o mais aquecido afeto de nossos coração. Nosso coração se prende a esse querido aspecto que nos foi aberto. Sentimos um terno amor àqueles amados pés perfurados. Nós poderíamos beijá-los todos os dias.
Aquelas abençoadas mãos do Crucificado! Se elas nos tocam, somos fortalecidos, honrados, consolados. Jesus é totalmente amável para conosco, nosso mui querido amigo e Senhor! A Fé, em vez de ser uma coisa pobre, miserável, como alguns imaginam, é a grandiosa causa do amor e, assim, de obediência e de santidade. Saiba, novamente, que a Fé nos coloca em uma nova relação. Estamos obrigados, pela natureza, a ser servos de Deus, mas a Fé sussurra em nosso ouvido: “Diga, ‘Pai Nosso’”, e quando o coração recebe o Espírito de adoção, o caráter de serviço é inteiramente modificado – o serviço de mercenário é transformado em obediência amorosa, e o nosso espírito é modificado! Se tornar herdeiro de Deus, co-herdeiro com Jesus, é transmutar o trabalho em prazer, serviço em comunhão com Deus! A Lei não é nenhum obstáculo aos filhos de Deus – antes, é seu prazer! A Fé remove do coração aquele egoísmo que, outrora, parecia ser necessário.
Então, você espera ser salvo pelo que você faz, não é? Posso perguntar-lhe, amigo, a quem você está servindo com isso? Vou lhe responder: você está servindo a você mesmo! Tudo o que você faz é para ganhar felicidade para si próprio. Como, então, você estaria servindo a Deus? Você está vivendo uma vida egoísta, apesar dela ser tingida nas cores da espiritualidade. O que é feito por você, em matéria de religião, não tem qualquer objetivo além de que você seja salvo e vá para o céu. Seu trabalho mais zeloso é para si próprio. Suponha que eu lhe diga: “eu
sei que estou salvo. Eu sei que Jesus levou embora meu pecado. Eu sei que Ele não me permite morrer”. Por isso, então, há espaço, em minha vida, para que eu sirva ao Senhor, por causa do que Ele fez por mim! Agora eu não tenho que me salvar – eu tenho que servir a Cristo!
A gratidão é a razão do Evangelho, e, unicamente sob Seu poder, a virtude altruísta é possível, não sobre o chão do serviço legal. Uma virtude pura, ao que me parece, é algo claramente impossível até que a Salvação de um homem ocorra, porque ele sempre deve ter tido, até aquele momento, uma visão torpe e degradante de buscar beneficiar-se por aquilo que faz. Uma vez que esta grande transição é feita, e você é salvo, então você é levantado a um nível mais nobre, e passa a dizer –
“Então por que, ó Bendito Jesus Cristo,
Eu não deveria amá-Lo assim?
Não pela esperança de ganhar o Céu,
Nem de escapar do inferno!
Não com a esperança de ganhar alguma coisa,
Não buscar uma recompensa,
Mas como também amaste a mim,
Ó Senhor amado,
Então, eu te amo, meu querido Senhor,
E em teu louvor vou cantar
Unicamente porque Tu és o meu Deus,
E meu Rei Eterno “
Portanto, a Fé nos inspira com uma motivação bem maior que aquela que a Lei pode indicar. A Fé logo cria amor no homem, pois se o Senhor Jesus salvou vocês, meus irmãos e irmãs, vocês vão rapidamente desejar que os outros também sejam salvos. Vocês experimentaram deste mel, e a doçura dele, em sua própria língua, os leva a convidar outras pessoas para o banquete. Aquele que foi trazido para a liberdade da Graça Livre, tornaria livre todo pecador cativo, caso pudesse.
Quando bem trabalhada, a Fé significa harmonia com Deus. Ela cria um acordo com a Vontade de Deus, de modo que o que quer que agrade a Deus, também nos agradará. Se o Senhor pusesse o crente num monte com Jó, ainda assim esse crente bendiria o Seu Nome. A Fé vai ao encontro do Preceito Divino que ela deseja obedecer; com a Doutrina divina, que a Fé deseja conhecer e tornar pública. Sim, em tudo que é de Deus, a Fé diz: “é o Senhor, deixe-O comandar, ensinar, ou fazer o que parecer bem a Ele.” Eu tenho lhes mostrado que a Fé não é o princípio que insignificantes depreciadores descrevem como: “Apenas acredito”. Oh, quem dera esses homens soubessem o que é apenas acreditar! É libertar a mente de grilhões. É o amanhecer do próprio Dia Celestial. É uma luta que perdura por toda a vida, esse “só acredito”. É “obra de Deus, em que você acredita nAquele que Ele enviou”.
Irmãos e Irmãs, eu acredito que uma Fé humilde e perseverante em Deus é uma das maiores formas de adoração que chega ao Trono de Deus. Apesar de querubins e serafins saudarem ao Senhor com seu “Santo, santo, santo”, a despeito da série de seres resplandecentes que cercam o Trono de Deus com aleluias perpétuas, não há reverência mais saudável dada a Deus que aquela de um pobre pecador, negro como a noite, que chora, crendo, “Lava-me, e ficarei mais alvo que a neve”. Acreditar no perdão do pecado é uma maravilhosa adoração da misericórdia e do poder de Deus! Acreditar numa perene Providência é uma doce maneira de adorar a Deus em Seu poder e bondade!
Quando um pobre trabalhador, em sua casa, precisando de pão para seus filhos, se ajoelha e chora: “Senhor, está escrito: ‘O teu pão te será dado, e tua água é certa!’, eu acredito na Sua Palavra e, portanto, eu olho para Ti em minha necessidade”. Ele presta uma homenagem à Verdade e Fidelidade de Deus de uma forma que o arcanjo Gabriel não poderia fazer, porque Gabriel nunca saberá o que é o aperto da fome. Acreditar que Deus vai nos manter até o fim, e levantar-nos à Sua Glória, é mais honroso a Deus do que todos os hinos da glória! De nós, filhos mortais da terra, quando confiamos em Sua promessa, sobe aos Céus um Incenso de cheiro doce e agradável a Deus, por meio Jesus Cristo.
Para a minha mente, também há isto acerca da Fé – que ela tem um poder maravilhoso sobre Deus. Você quer que eu me retrate dessa expressão? Pois eu a mantenho! Vou explicá-la. A Fé supera o Altíssimo sobre o Seu trono. A Fé de um indivíduo inferior supera a de um superior. Há alguns anos, eu estava andando no jardim, e certa noite e vi um cão de rua sobre quem eu tomei conhecimento que tinha o hábito de visitar o meu terreno, e que ele, por assim dizer, não fez por onde para ajudar o jardineiro, e logo se tornou um visitante indesejado. Enquanto eu caminhava, em uma noite de sábado, meditando sobre um sermão meu, vi este cão ocupado fazendo travessuras. Eu joguei minha bengala nele, lhe dizendo para ir para casa. Mas o que você acha que ele fez? Em vez de mostrar os dentes para mim, ou correr fora, gritando, ele olhou para mim, de maneira muito agradável, pegou a minha bengala em sua boca e a trouxe para mim! E depois, abanando o rabo, ele a colocou sobre meus pés!
Lágrimas encheram meus olhos – o cachorro havia me esbofeteado. Eu disse, “Bom cachorro! Bom cachorro, você pode vir aqui quando quiser, depois disso”. Por que o cão me conquistou? Porque ele confiava em mim, e não acreditava que eu poderia significar-lhe qualquer mal. Voltar-se para coisas grandiosas – o próprio Senhor não pode resistir à humilde confiança. Você não vê como um pecador traz, por assim dizer, a vara da Justiça para o Senhor, e clama: “Se você me matar, eu mereço; eu me submeto a você”. O grande Deus não pode desprezar um coração confiante. É impossível! Ele não seria Deus, se Ele lançasse fora a alma que implicitamente confia nele! Então, este é o poder da Fé, e eu não me admiro por o Senhor assim ter escolhido, pois acredito que é a coisa mais agradável a Deus!
Vocês todos devem confiar nEle! Deus levanta Sua espada contra você – corra para Seus braços! Ele te ameaça – prenda-se à Sua promessa! Ele te persegue – voe para Seu Filho amado! Deposite sua confiança ao pé da cruz em Sua Expiação, e você será salvo!
Charles Haddon Spurgeon
Enviado por Silvio Dutra Alves em 15/06/2013