Agora e Depois – Parte 4
Entendendo como entendemos e como entenderemos a realidade espiritual
Por Charles Haddon Spurgeon
II – Propusemos a perguntar a nós mesmos, em segundo lugar: COMO SERÁ EFETUADA ESTA MUDANÇA TÃO NOTÁVEL? POR QUE VEREMOS MAIS CLARAMENTE ENTÃO DO QUE AGORA? Não podemos entender inteiramente essa pergunta, mas uma ou duas sugestões poderiam nos ajudar. Sem dúvida muitas dessas coisas serão reveladas mais claramente no posterior estado. Aqui a luz é como a Aurora. É um tênue crepúsculo. No céu será o incêndio do meio-dia. Deus declarou algo de Si mesmo por boca de seus santos profetas e apóstolos. Agradou-Lhe falar-nos mais claramente através dos lábios de Seu Filho, a quem nomeou herdeiro de todas as coisas, para nos mostrar mais abertamente os pensamentos de Seu coração e o desejo se Sua vontade. Esses são os primeiros passos em direção ao conhecimento. Porém, lá a luz será como a luz de sete dias e lá a manifestação de todos os tesouros da sabedoria serão mais resplandecentes e mais claros do que são agora; pois Deus, o único sábio Deus, descobrirá para nós os mistérios e nos exibirá a glória do Deus sempiterno. A revelação que agora temos é apropriada para nós como homens revestidos com nossos pobres corpos mortais; a revelação então será apropriada para nós como espíritos imortais. Quando sejamos ressuscitados dos mortos, a revelação será apropriada para nossos corpos espirituais e imortais. Aqui também estamos distanciados de muitas das coisas das que desejamos conhecer algo, mas lá estaremos mais próximas delas. Lá estaremos em um terreno estratégico, com o horizonte inteiro estendido diante de nós. Nosso Senhor Jesus está muito longe de nós assim como Sua presença pessoal. Vemos Cristo através do telescópio da fé, mas então o veremos cara a cara. Sua presença literal e corporal está no céu, desde que foi levado para cima, e nós precisamos ser levados para cima de igual maneira para estarmos com Ele, ali onde está, para que possamos contemplá-Lo literalmente. Aproxime-se do manancial e entenderás muito mais; situe-se no centro e as coisas parecerão regulares e ordenadas. Se você pudesse parar no sol e ver as órbitas nas quais os planetas giram em torno dessa luminária central, tudo se converteria em algo extremamente claro; mas durante muitos eras os astrônomos eram incapazes de descobrir algo dessa ordem e falavam do planetas como avançados, atrasados ou imóveis. Cheguemos a Deus, o centro, e veremos como a providência gira em torno do Seu trono de safira.
Nós mesmos, também, quando cheguemos ao céu estaremos mais qualificados para ver do que estamos agora. Seria uma inconveniência para nós conhecer aqui tanto quanto conheceremos no céu. Sem dúvidas, pensamos algumas vezes que se tivéssemos melhores ouvidos seria uma grande benção. Desejamos poder ouvir a dez milhas de distância, mas provavelmente não estaríamos melhor: poderíamos ouvir demais e os sons se apagariam entre si. Provavelmente nossa visão não seja tão boa como desejaríamos que fosse, porém um substancial incremento de poder ocular poderia não ser de nenhuma ajuda para nós. Nossos órgãos naturais estão adaptados para nossa presente esfera de ser; e nossas faculdade mentais estão, no caso da maioria de nós, adequadamente adaptadas a nossos requerimentos morais. Se soubéssemos mais de nossa própria pecaminosidade, podemos ser conduzidos ao desespero; se conhecêssemos mais da glória de Deus, poderíamos morrer de terror; se tivéssemos mais entendimento, a menos que tivéssemos uma capacidade equivalente para emprega-lo poderíamos estar cheios de arrogância e atormentados pela ambição. Porém lá em cima teremos nossa mente e nossos sistemas fortalecidos para receber mais, sem o dano que nos viria aqui por pularmos sobre os limites da ordem supremamente designados e regulados divinamente. Aqui não podemos beber do vinho do reino, pois é forte demais para nós, mas lá em cima o beberemos novo no reino de nosso Pai celestial, sem medo da intoxicação do orgulho ou dos enfados das paixões. Conheceremos como somos conhecidos. Além disso, queridos amigos, a atmosfera do céu é muito mais clara que esta que não me surpreende que possamos ver melhor lá. Aqui temos a fumaça do cuidado cotidiano, o pó constante do trabalho árduo, a névoa do problema que se levanta perpetuamente. Não se poderia esperar que víssemos muito dentro dessa atmosfera cheia de fumaça; porém quando atravessemos mais além, não vamos encontrar jamais nuvens congregadas ao redor do sol que ocultem seu sempiterno resplendor. Lá tudo é claro. A luz do dia é serena como o meio-dia. Estaremos numa atmosfera mais clara e numa luz mais brilhante.
III – As lições práticas que podemos aprender deste tema exigem as atenções dos senhores antes que cheguemos a uma conclusão. Parece-me que há uma chamada a nossa gratidão. Devemos estar muito agradecidos por tudo o que vemos realmente. Aqueles que não veem agora – ah, nem sequer “como em espelho, obscuramente” – não verão nunca face a face. Os olhos que nunca veem a Cristo pela fé nunca o verão com gozo no céu. Se você nunca se viu como um leproso, manchado pelo pecado e calor e penitente, você nunca será redimido do pecado, renovado pela graça e com o espírito revestido de branco. Se você não tem nenhum sentido da presença de Deus aqui, que lhe constranja a adorá-lo e amá-lo, não terá nenhuma visão da sua glória no mais além, que introduza perenemente a plenitude do gozo e do prazer. Oh, alegre-se pela visão que tem, querido irmão, querida irmã. É Deus quem a deu a você. Você é um cego de nascimento, e “Desde o princípio não se ouviu dizer que alguém pudesse abrir os olhos de um cego”. Este milagre foi operado em ti; tu podes ver, tu podes dizer: “Uma coisa sei, que tendo sido eu cego, agora vejo”.
Nosso texto nos ensina que esta frágil visão é muito esperançosa. Tu verás melhor pouco a pouco. Oh, tu não sabes quão logo – poderia ser um dia ou dois a partir de agora – que estejamos na glória! Deus poderia tê-lo ordenado assim, que entre nós e o céu não houvesse senão um passo.
Outra lição é a da paciência de uns para com os outros. Os assuntos dos quais falamos hão de suavizar asperezas de nossos debates; quando estamos disputando acerca de pontos de dificuldade havemos de sentir que não devemos nos irar por sua causa, porque depois de tudo, há limites para nossa capacidade presente assim também como para nosso conhecimento atual. Nossas disputas são frequentemente infantis. Bem poderíamos deixar algumas perguntas em suspenso durante algum tempo. Duas pessoas na escuridão diferem enquanto a uma cor e estão lutando ruidosamente a respeito. Se introduzíssemos velas e iluminássemos a cor, as velas não mostrariam o que era; porém se o olhássemos amanhã pela manhã, quando o sol brilha, poderíamos saber de que cor se tratava. Quantas dificuldades na palavra de Deus são dessa ordem! Ainda não podem ser discriminadas justamente; até o dia amanheça, nem todos os símbolos apocalípticos serão transparentes para nosso próprio entendimento. Além disso, não temos tempo a desperdiçar enquanto haja tanto trabalho por fazer. Já se desperdiçou muito tempo. A navegação à vela é perigosa, os ventos são fortes, o mar está encrespado. Há que ajustar o barco, manter as velas estiradas, manobra-lo e evitar a areia movediça. Em relação a outros assuntos, temos que esperar até chegar ao refúgio confiável, e ser capaz de falar com algum dos espíritos reluzentes que estão diante do trono. Quando algumas das coisas que conhecemos sejam abertas para nós, confessaremos os erros que cometemos e regozijaremos na luz que receberemos.
Por acaso esta feliz perspectiva não deveria excitar nossa aspiração e nos fazer sentir muito desejosos de estar lá? É natural que nós queiramos conhecer, mas não conheceremos como somos conhecidos até que estejamos presentes com o Senhor. Agora estamos numa escola. Somos crianças inocentes em uma escola. Logo iremos a uma universidade – à Grande Universidade do Céu – e receberemos nosso diploma lá. Porém, para alguns de nós em lugar de estarmos ansiosos por ir, estremecemos diante do pensamento da morte, aterra-nos atravessar a porta do gozo! Há muitos seres que morrem subitamente; outros morrem enquanto dormem e outros transitaram do tempo à eternidade passando quase despercebidos diante de quem os acompanhavam junto a seus leitos. Podem ter certeza disso: não há dor por morrer; a dor é por viver. Quando deixarem de viver aqui, acabarão as dores. Não culpem a morte por aquilo pelo qual não merece ser culpada; a vida subsiste na dor; a morte é o final da dor. O homem que tem medo de morrer deveria ter medo de viver. Deve estar contente em qualquer momento que a vontade do Senhor assim ordene. Encomenda teu espírito à Sua Guarda. Quem que somente haja visto os vislumbres de Seu rosto resplandecente, não desejaria ver Seu rosto, que é como o sol que brilha em sua potência? Oh, Senhor seja feita a Tua vontade! Somente quero dizer esta única palavra se me é permitido fazê-lo: que Te contemplemos logo, se assim pudesse ser. Vemos agora e esperamos ver ainda melhor? Então, bendigamos o nome do Senhor, que nos escolheu por Sua benignidade e por Sua infinita misericórdia. Por outro lado, deve ser causa de grande ansiedade se não cremos em Jesus, pois quem não creu Nele, moribundo como está não verá nunca o rosto do Senhor com gozo.
Oh incrédulo! Preocupa-te por tua alma e busque a Ele, pede socorro a Ele. Oh, que Deus abrisse teus olhos nessa mesma oração! É uma benção que conheças em parte. Três vezes bem-aventurado, digo; pois tão certamente como conheces em parte agora tu conhecerás plenamente mais lá na frente. Que conhecer a Ele seja tua feliz porção, já que esse conhecimento é vida eterna. Que Deus nos conceda isso, por Jesus Cristo Nosso Senhor. Amém.
Charles Haddon Spurgeon
Enviado por Silvio Dutra Alves em 23/06/2013