Seguindo ao Cristo Ressurreto – Parte 1
Por Charles Haddon Spurgeon
No Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres.
“Portanto, se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus. Pensai nas coisas que são de cima, e não nas que são da terra;” (Colossenses 3:1-2 ACF)
A Ressurreição de nosso divino Senhor dentre os mortos é a pedra angular da doutrina cristã. Talvez pudesse chamá-la mais precisamente de pedra principal do arco do cristianismo, pois se esse feito pudesse ser desmentido, toda a estrutura do Evangelho entraria em colapso. “Se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé … E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados. E também os que dormiram em Cristo estão perdidos. Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens” (1 Coríntios 15:14-19)
Devido à grande importância de Sua ressurreição, agradou a nosso Senhor dar muitas provas infalíveis dela, aparecendo e mostrando-se uma e outra vez em meio de Seus seguidores. Seria interessante averiguar quantas vezes o Senhor apareceu – creio que temos a menção de algumas dezesseis manifestações.
Ele mostrou-se abertamente diante de Seus discípulos, e verdadeiramente comeu e bebeu com eles. Eles tocaram Suas mãos e Seu lado transpassado, ouviram Sua voz e souberam que era o mesmo Jesus que fora crucificado. Ele não se contentou em proporcionar-lhes evidências para os ouvidos e os olhos, mas também demonstrou a realidade de Sua ressurreição inclusive para o sentido do tato.
Essas aparições foram muito diversas. Algumas vezes concedeu uma entrevista a uma só pessoa, quer que fora homem, como Cefas, ou a uma mulher, como Maria Madalena. Ele conversou com dois de seus seguidores quando iam andando no caminho de Emaús, e posteriormente com todo o grupo de apóstolos junto ao mar. Encontramos Jesus em uma ocasião em meio dos onze, quando as portas estavam cerradas por medo aos judeus, e em outra ocasião Lhe vemos no meio de uma assembleia de mais de quinhentos irmãos, os quais foram anos mais tarde, a maioria deles, testemunhas vivas desse fato. Não poderiam todas elas terem sido enganadas.
Não é possível que algum feito histórico qualquer pudesse ter sido posto sobre uma melhor base de credibilidade do que a ressurreição de nosso Senhor dentre os mortos. Esse feito está mais além de toda disputa e de toda dúvida, e foi assim propositadamente, porque ele é essencial para todo o sistema cristão.
Por essa mesma causa a ressurreição de Cristo é comemorada frequentemente. Não existe na Escritura nenhuma ordenança que estabeleça algum dia do Senhor no ano que deva ser separado para comemorar-se a ressurreição de Cristo dos mortos por essa razão: cada dia do Senhor é o memorial da ressurreição de nosso Senhor Jesus. Em qualquer domingo que quiserem, seja no mais profundo inverno, ou no maior calor do verão, ao despertarem, poderão cantar-
“Hoje se levantou e partiu dos mortos,
E o império de Satanás caiu;
Hoje os Seus santos triunfos publicam,
E contam todas Suas maravilhas.”
Separar um Domingo de Páscoa para que sirva de comemoração especial da ressurreição é uma invenção humana, para a qual não há nenhuma instrução Escriturística; porem, fazer de cada Domingo um domingo de Páscoa, é algo que é devido Àquele que logo cedo da alvorada ressuscitou no primeiro dia da semana.
Congregamos-nos no primeiro dia da semana em lugar do sétimo dia, porque a redenção é até mesmo uma obra maior que a criação, e mais digna de comemoração, e porque o descanso que seguiu à criação é superado pelo repouso que segue à consumação da redenção. Reunimos-nos no primeiro dia da semana, como os apóstolos, esperando que Jesus esteja em nosso meio, e diga: “Paz seja convosco” (Lucas 24:36). Nosso Senhor arrebatou o dia de descanso de suas velhas e enferrujadas dobradiças nas que fora anteriormente colocado pela lei desde tempos antigos, e o colocou sobre as novas dobradiças de ouro que seu amor tinha arquitetado. Ele colocou nosso dia de descanso, não ao fim de uma semana de trabalho, mas sim no começo do repouso que resta para o povo de Deus. Em cada primeiro dia da semana devemos meditar sobre a ressurreição de nosso Senhor, e devemos buscar entrar em comunhão com Ele em Sua vida ressurreta.
Não devemos jamais esquecer que todos os que estão Nele, ressuscitarão dos mortos em Sua ressurreição. Em ordem de importância, a ressurreição segue a doutrina de Cristo como cabeça federal da Igreja e a unidade de todo Seu povo com Ele. É devido a que estamos com Cristo que nos convertemos participantes de tudo o que Cristo fez: somos circuncidados com Ele, mortos com Ele, enterrados com Ele e ressuscitados com Ele, porque não podemos ser separados Dele. Somos membros de Seu corpo, e nenhum osso Seu pode ser quebrado. Devido que essa união é muitíssimo íntima, contínua e indissolúvel, tudo o que concerne a Ele concerne a nós também, e como Ele ressuscitou, todo seu povo também ressuscitou Nele.
O povo ressuscitou de duas maneiras. Primeiro, representativamente. Todos os eleitos ressuscitaram em Cristo no dia em que Ele abandonou a tumba. Cristo foi justificado, ou declarado limpo, de todo o passivo gerado por nossos pecados, quando foi deixado em liberdade da prisão da tumba. Não havia nenhuma razão para detê-lo no sepulcro, pois Ele saldou as dívidas de Seu povo quando “de uma vez morreu para o pecado.” (Romanos 6:10) Ele era nosso refém e nosso representante, e quando libertou-se de Suas ataduras, fomos libertos Nele. Sofremos a sentença da lei em nosso Substituto, estivemos detidos em Sua prisão, e até mesmo morremos sob Sua sentença de morte, e agora já não estamos mais debaixo da maldição da lei.
“Se já morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos; sabendo que, tendo sido Cristo ressuscitado dentre os mortos, já não morre; a morte não mais tem domínio sobre ele. Pois, quanto a ter morrido, de uma vez morreu para o pecado; mas, quanto a viver, vive para Deus.” (Romanos 6:8-10)
Junto a essa ressurreição representativa vem nossa ressurreição espiritual, que é nossa tão logo somos conduzidos a crer em Jesus Cristo por meio da fé. Então se pode dizer de nós: “E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e pecados.” (Efésios 2:1)
A benção da ressurreição deverá ser aperfeiçoada de pouco a pouco até a aparição nosso Senhor e Salvador, pois então nossos corpos ressuscitarão, se nos dormirmos antes de Sua vinda. Ele redimiu nossa condição humana em sua totalidade, espírito, alma e corpo, e não estará satisfeito até que a ressurreição que teve lugar em nosso espírito também tenha lugar em nosso corpo. Esses ossos secos viverão – conjuntamente com Seu cadáver ressuscitarão –
“Quando se levantou e ascendeu ao alto
Mostrou a nossos pés o caminho;
Nossa carne se remontará ao Senhor
No grandioso dia da ressurreição.”
Então saberemos, na perfeição da beleza de nossa ressurreição, que em verdade somos completamente ressuscitados em Cristo, e “assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo.” (1 Coríntios 15:22)
Essa manhã, falaremos somente de nossa comunhão com Cristo em Sua ressurreição, no que se refere a nossa própria ressurreição espiritual. Não me venham a mal interpretar pensando que eu creio que a ressurreição é somente espiritual, pois uma ressurreição literal dos mortos há de ocorrer todavia – mas como nosso texto fala da ressurreição espiritual, essa é a que me esforçarei por expor diante de vocês.
I. Primeiro, então, CONSIDEREMOS NOSSA RESSUREIÇÃO ESPIRITUAL COM CRISTO: “Se, pois, haveis ressuscitado com Cristo.” Ainda que as palavras pareçam uma suposição, não possuem o propósito de sê-las. O apóstolo não está colocando em dúvida, nem está fazendo nenhuma pergunta a respeito, mas sim está somente o expressando assim como argumentação. Poderia ser lido de igual forma, “se, pois ressuscitaram com Cristo.” O “se” é usado logicamente, não teologicamente: a maneira de argumentação, e não porque houvesse alguma dúvida. Todos os que crêem em Cristo, são ressuscitados com Cristo. Meditemos nessa verdade.
Pois, primeiro, estávamos “mortos em nossos delitos e pecados”, mas havendo crido em Cristo, temos sido vivificados pelo Espírito Santo, e já não estamos mais mortos. Ali estávamos na tumba, sujeitos a apodrecermos; sim, alguns de nós já estávamos putrefatos, os sinais do verme do pecado estavam estampados em nosso caráter, e de nós emanava o fedor do pecado real. Mais ou menos de conformidade ao lapso no qual permanecemos nessa morte, e de acordo às circunstâncias que nos rodeavam, a morte trabalhou corrupção em nós. Jazíamos em nossa morte, sendo totalmente incapazes de nos levantarmos de lá por nós mesmos – nossos olhos não podiam ver, nossos ouvidos não podiam ouvir: nosso coração não podia amar – nossa mão seca não podia ser estendida para tocar com fé.
Éramos até mesmo como aqueles que descem a cova, como os que já estão mortos: só que nisso nos encontrávamos em uma pior situação do que aqueles que estavam mortos efetivamente, pois éramos responsáveis de todas nossas omissões e insuficiências. Éramos tão culpáveis como se tivéssemos tido poder, pois a perda do poder moral não leva consigo a perda da responsabilidade moral. Estávamos, portanto, em um estado de morte espiritual do tipo mais terrível.
O Espírito Santo nos visitou e nos fez viver. Alguns de nós nos lembramos da primeira sensação de vida: como parecia formigar nas veias de nossas almas com uma aguda e amarga dor – do mesmo jeito que as pessoas que se afogam sofrem grande dor quando a vida volta nelas, nós também sentimos uma grande dor.
A convicção, a confissão de pecado, o terror do juízo vindouro, e um sentido da presente condenação, todas essas coisas foram trabalhadas em nós. Porem, esses eram sinais de vida, e essa vida aprofundou-se gradualmente e expandiu-se até que o olho foi aberto: podíamos ver a Cristo, a mão cessou de estar seca, e a estendemos e tocamos na orla de Seu manto; os pés começaram a moverem-se no caminho da obediência, e o coração sentiu em seu interior a doce incandescência do amor. Então os olhos, insatisfeitos somente com ver, se puseram a chorar, e depois, quando as lágrimas foram enxugadas, esses olhos brilhavam e fulguravam com deleite.
Oh meus irmãos crentes em Jesus, vocês já não estão mortos espiritualmente. Creram em Cristo, e esse grandioso ato demonstra que já não estão mortos. Foram vivificados por Deus de acordo com a obra de Seu poder todo-poderoso, que obrou em Cristo quando lhe ressuscitou dentre os mortos, e o assentou a Sua destra nos lugares celestiais.
Amados, vocês agora são novas criaturas, o fruto de um segundo nascimento, gerados de novo em Cristo Jesus para uma nova vida. Cristo é sua vida – uma vida que não conheceram antes, nem poderiam ter conhecido fora Dele. Se, pois, ressuscitaram com Cristo, andais em nova vida, enquanto que o mundo permanece na morte.
Damos outro passo à frente: Temos ressuscitado com Cristo, e por isso, uma reviravolta poderosa foi feita em nós. Quando os mortos ressuscitarem, não aparecerão como o são agora. A semente enterrada ergue-se do terreno, mas não como semente, já que produz folhas verdes, botões, talo, e gradualmente desenvolve flores e frutos, e de igual modo nós levaremos uma forma nova, pois seremos renovados segundo a imagem Dele, que nos criou em justiça e santidade.
Peço-lhes que considerem a mudança que o Espírito de Deus trabalha no crente: uma mudança verdadeiramente maravilhosa! Antes da regeneração, nossa alma era como será nosso corpo quando esse morrer – e lemos que “se semeia em corrupção.” Existia corrupção em nossa mente e ela estava trabalhando irresistivelmente em favor das coisas malvadas e ofensivas. Em muitos, a corrupção não se mostrava sobre a superfície, mas estava operando internamente; já em outros, a visão dessa corrupção era conspícua e pavorosa.
E como grande essa conversão! Pois agora o poder da corrupção dentro de nós está quebrantado: a nova vida venceu esse poder, pois essa nova vida é uma semente viva e incorruptível que vive e permanece para sempre. A corrupção está na velha natureza, mas não pode tocar a nova, que é nosso verdadeiro e real eu. Por acaso não é algo grandioso ser limpo da imundícia que nos teria levado finalmente ao Tofet, onde o arde o fogo que jamais se apagará, e onde o bicho que não morre alimenta-se dos corruptos?
Nosso antigo estado era mais ainda além daquele que sobrevêm ao corpo ao momento da morte, pois era um estado de desonra. Vocês sabem como o apóstolo se referiu ao corpo: “Semeia-se em desonra”. E, certamente, nenhum cadáver leva tal desonra como a que repousa no homem que está morto em delitos e pecados. Ora, de todas as coisas do mundo que merecem vergonha e desprezo, um homem de condição pecaminosa é a que mais os merece. Esse homem despreza seu Criador, não cuida de seu Salvador, escolhe o mal em vez do bem, e rejeita a luz porque suas obras são más, e por isso prefere as trevas. No juízo de todos os espíritos puros, um homem pecaminoso é um homem desonrado.
Porem, oh, como o homem é transformado quando a graça de Deus trabalha em seu interior, pois então é honorável. “Vede quão grande amor nos tem concedido o Pai, que fôssemos chamados filhos de Deus” (1 João 3:1) Que honra é essa! O próprio céu não contém um ser mais honorável que um homem renovado. Muito bem podemos clamar com Davi: “Que é o homem mortal para que te lembres dele? e o filho do homem, para que o visites?” (Salmos 8:4) Porem, quando na pessoa de Jesus, vislumbramos que o homem é levado a ter domínio sobre todas as obras das mãos de Deus, e sabemos que Jesus nos tem feito reis e sacerdotes para Deus, nos enchemos de assombro porque Deus nos exalte assim. O próprio Senhor há dito: “foste precioso aos meus olhos, também foste honrado, e eu te amei” (Isaías 43:4) “para vós, os que credes, é preciosa”, (1 Pedro 2:7) pois assim poderia estar expressa no texto original. Um Cristo precioso nos faz preciosos: todos os santos recebem tal honra.
Quando um corpo é enterrado, o apóstolo nos informa ainda mais que “semeia-se em debilidade.” O próprio corpo morto não pode colocar-se a si mesmo em seu último leito, e são mãos amigas que deverão colocá-lo lá - de igual modo, éramos a debilidade total para com tudo de bom. Quando éramos cativos do pecado, não podíamos fazer nada bom, tal como disse nosso Senhor: “porque sem mim nada podeis fazer.” (João 15:5) Fora Dele, éramos incapazes até mesmo de algum bom pensamento. Porem “Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios.” (Romanos 5:6); e agora Lhe conhecemos e ao poder de Sua ressurreição. Deus nos tem dado o espírito de poder e de amor; não está por acaso escrito: “Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome? (João 1:12)”
Que poder tão assombroso é esse! Agora nós provamos das “virtudes do século futuro,” (Hebreus 6:5) e somos fortalecidos com “toda a fortaleza, segundo a força da sua glória, em toda a paciência, e longanimidade com gozo” (Colossenses 1:11) A fé nos veste com um poder divino, pois “Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê” (Marcos 9:23), e cada crente pode exclamar, sem jactância: “Posso todas as coisas em Cristo que me fortalece.” (Filipenses 4:13) Por acaso nos é maravilhoso a mudança que a ressurreição espiritual tem trabalhado em nós? Não é algo glorioso que o poder de Deus se aperfeiçoe em nossa fraqueza?
A grandiosa mudança tem que ver primordialmente com outro ponto. É dito do corpo: “Semeia-se corpo natural, ressuscitará corpo espiritual.” Outrora éramos homens naturais e não discerníamos as coisas que são do Espírito de Deus. Antes, nos interessava as coisas terrenas e éramos movidos por concupiscências carnais que iam atrás das coisas visíveis – porem, agora, pela graça divina, um espírito foi criado em nós que se alimenta do pão espiritual, que vive para propósitos espirituais, que é possuído de motivos espirituais e se regozija na verdade espiritual.
Essa conversão do natural ao espiritual é de tal magnitude, que só Deus mesmo poderia tê-la feito, e, no entanto, temos experimentado ela. A Deus seja a glória. Assim que, em virtude de nossa ressurreição em Cristo, temos recebido vida e temos nos tornamos objetos de uma portentosa mudança: “as coisas velhas passaram; eis aqui todas são feitas novas.”
Como consequência de que recebemos essa vida e experimentamos essa mudança, as coisas do mundo e do pecado convertem-se em uma tumba para nós. Para um morto, uma tumba é um lar tão bom como poderia precisar alguma vez. Poderiam até chamá-la de seu quarto particular, se quisessem – pois esse morto jaz no seu interior de maneira tão inconsciente como se ele estivesse em um sonho. Porem, no instante em que um morto revive, não suportaria tal dormitório – o considera uma terrível cripta, um calabouço aborrecível, um insuportável ossuário, e deve abandoná-la imediatamente.
Assim, quando vocês e eu éramos homens naturais, e não possuíamos vida espiritual, contentávamos com as coisas dessa vida – porem, tudo é sumariamente diferente agora. Tudo o que desejávamos antes era uma religião meramente externa. Uma forma morta que se amoldava a nossa alma morta. No próprio começo do Evangelho, o judaísmo agradava aos que estavam sob seu jugo: as luas novas, os dias santos, as ordenanças tradicionais, os jejuns e as festividades, eram coisas grandiosas para os que tinham esquecido sua ressurreição com Cristo.
Todas essas coisas constituem um belo mobiliário para o dormitório de um morto – mas quando a vida eterna entra na alma, essas ordenanças exteriores são lançadas longe, e o homem que vive rasga sua mortalha, rompe suas fendas fechadas, e exige os vestidos apropriados para a vida.
Dessa maneira o apóstolo, no capítulo anterior ao nosso texto, nos diz que não permitamos que ninguém nos engane utilizando tradições de homens e invenções de um ritualismo morto, pois essas coisas não são a porção própria dos homens renovados e espirituais.
Assim, também, todos os objetos meramente carnais convertem-se numa tumba para nós, sejam prazeres pecaminosos ou ganâncias egoístas. Para o que está morto, o sudário, o ataúde e a cripta são coisas apropriadas – mas basta que o cadáver viva de novo, e então não pode descansar na tumba. Da mesma forma, o homem renovado pela graça não pode permanecer no pecado, pois esse é um ataúde para ele: não pode suportar os prazeres malignos, pois são como um sudário; ele clama por liberdade. Quando a ressurreição chega, o homem levanta a tampa que está sobre sua tumba, e destrói o monumento e a lápide mortuária colocada acima dela.
Algumas almas estão enterradas debaixo de uma massa de justiça própria, a semelhança de homens ricos sobre os quais se erigiram templos de mármore; porem, o crente desprende-se de tudo isso, deve desfazer-se deles todos, pois não pode tolerar as obras mortas. Não pode viver de outra maneira que não pela fé – qualquer outra vida é morte para ele. Deve sair de seu estado anterior, pois, assim também como quando somos vivificados pela graça, as coisas do pecado, do eu e do sentido carnal se convertem em fúnebres catacumbas para nós, nas que nossa alma sente-se enterradas, e das quais devemos sair. Como nós que temos ressuscitado de morte do pecado, poderíamos viver mais tempo ali?
Agora, amados, nesse momento nós ressuscitamos plenamente dos mortos em um sentido espiritual. Pensemos nisso, pois nosso Senhor não experimentou a ressurreição de sua cabeça enquanto Seus pés permanecem no sepulcro; mas sim ressuscitou como um homem inteiro e perfeito, integralmente vivo.
De igual modo, fomos renovados em cada uma de nossas partes. Temos recebido, ainda que se encontre em sua primeira infância, uma perfeita vida espiritual: somos perfeitos em Cristo Jesus. Em nosso homem interior nosso olho é aberto: cada uma de nossas faculdades está lá, ainda que sejam imaturas, e precisem de desenvolvimento, e tenham ainda que contender com a velha natureza morta.
Além, e isso é o melhor de tudo, temos ressuscitado de tal forma que não morreremos mais. Oh, não me contem mais a terrível história de que um homem que tenha recebido a vida eterna pode, todavia, perder a graça e perecer. Com nossas Bíblias na mão nós sabemos que não é assim. “Sabendo que, tendo sido Cristo ressuscitado dentre os mortos, já não morre; a morte não mais tem domínio sobre ele.” (Romanos 6:9), portanto, quem recebeu nele mesmo a vida de Cristo, não morrerá jamais. Por acaso Ele não tem dito: “E todo aquele que vive, e crê em mim, nunca morrerá?” (João 11:26) Essa vida que Ele nos deu, será em nós “uma fonte de água que salte para a vida eterna.” (João 4:14) Ele mesmo disse: “dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará da minha mão.” (João 10:28)
No dia de nossa ressurreição, daremos adeus à morte espiritual e ao sepulcro no qual dormimos sob o domínio do pecado. Adeus, amor mortal ao pecado – lhe demos um fim! Adeus, mundo morto, mundo corrupto, rompemos contigo! Cristo nos ressuscitou. Cristo nos deu vida eterna. Abandonamos para sempre as terríveis moradas da morte, e buscamos os lugares celestiais. Nosso Jesus vive, e porque Ele vive, nós também vivermos pelos séculos dos séculos.
Dessa maneira tratei de explicar a metáfora da ressurreição, por meio da qual nossa renovação espiritual está tão bem expressa.
Charles Haddon Spurgeon
Enviado por Silvio Dutra Alves em 07/09/2013