Prefácio da Epístola aos Romanos por Lutero – Parte 7
No capítulo 5, Paulo trata dos frutos e das obras da fé, tais como paz, alegria, amor a Deus e a todos os homens, confiança, ousadia, coragem, esperança na tribulação e sofrimento. Porque quando há fé verdadeira todas estas coisas acompanham o crente, devido a superabundante bondade que Deus nos mostra em Cristo, de modo que ele o entregou à morte por nós antes que pudéssemos lhe pedir isso, ou melhor, quando ainda éramos seus inimigos. Assim, temos uma fé que justifica sem obras, e isso não significa que estamos isentos da prática de boas obras, mas sim que elas nos acompanharão. Destas justas obras dos santos não sabemos nada, mas, certamente, nos seguirão paz, alegria, confiança, amor, esperança, ousadia e as qualidades da verdadeira fé e obra cristã.
Depois disso, Paulo faz um agradável passeio e comenta sobre a procedência do pecado e da injustiça, da morte e da vida, fazendo uma comparação entre Adão e Cristo. Ele diz que Cristo tinha que vir como segundo Adão para nos legar sua justiça através do novo nascimento mediante a fé, tal como o primeiro Adão nos legou o pecado através do antigo nascimento carnal. Assim, ele declara, e confirma isso, que o primeiro por suas próprias obras poderia ajudar a sair do pecado apenas se impedisse o nascimento do seu próprio corpo. Isso é provado pelo fato de que a lei divina que deveria contribuir para a justiça, se alguma coisa pode, não só não ajudou como também aumentou o pecado, pois quanto mais a lei proíbe, mais nossa natureza má a odeia, e mais quer dar asas à sua própria concupiscência. Assim, a lei de Cristo faz-se ainda mais necessária e mais a graça é indispensável para ajudar a nossa natureza.
No capítulo 6, Paulo retoma o assunto da obra especial da fé, do conflito entre a carne e o espírito, visando ao completo assassinato do pecado e da luxúria que ainda permanecem mesmo depois de sermos justificados. Ele nos ensina que pela fé nós não somos tão livres do pecado que podemos viver ociosa e descuidadamente como se o pecado não residisse em nós. Há pecado, mas esse já não é mais contado para a condenação por causa da fé que está em oposição. Portanto, temos o suficiente para ao longo de nossa vida domesticarmos o corpo, aniquilarmos suas concupiscências e compelirmos os seus membros à obediência ao espírito, e não à luxúria, de forma que nossa vida se torne como a morte e ressurreição de Cristo, completando o nosso batismo que significa a morte para o pecado e a vida nova na graça até que sejamos completamente livres do pecado, e até que os nossos corpos sejam ressuscitados com Cristo e vivam eternamente.
É o que podemos fazer, diz Paulo, porque estamos na graça e não na lei. Ele mesmo explica que ficar sem a lei não é a mesma coisa que não ter lei e ser capaz de fazer aquilo que agrada; mas nós estamos debaixo da lei quando, sem a graça, nos ocupamos no trabalho da lei. Então o pecado certamente governa pela lei, pois ninguém ama a lei por natureza, o que é grande pecado. A graça, porém, torna a lei querida para nós, e assim não há mais pecado, pois a lei passa a estar do nosso lado, e não contra nós.
Esta é a verdadeira liberdade do pecado e da lei, da qual ele escreve, até o final deste capítulo, que é apenas uma liberdade para viver e cumprir prazerosamente a lei, e não mais sendo compelido por ela. Por isso, esta liberdade é espiritual, que não abole a lei, mas cumpre o que a lei exige, ou seja, prazer e amor. Assim, a lei se aquieta e não mais pressiona com suas exigências. É como se você tivesse uma dívida para com seu credor e não pudesse pagá-la. Há duas maneiras pela qual você poderia se livrar da dívida: ou ele não tomaria nada de você e rasgasse a nota promissória; ou algum homem bom pagasse sua dívida. É esta última alternativa que Cristo nos forneceu para nos tornar livres da lei. Nossa liberdade, portanto, não é carnal, como se estivéssemos desobrigados a cumprir a lei, mas uma liberdade que realiza muitas obras de todos os tipos, mas que não é impulsionada pelas demandas e dívidas da lei.
Martinho Lutero
Enviado por Silvio Dutra Alves em 15/09/2013