Justificação
I. Os que Deus chama eficazmente, também livremente justifica. Esta justificação não consiste em Deus infundir neles a justiça, mas em perdoar os seus pecados e em considerar e aceitar as suas pessoas como justas. Deus não os justifica em razão de qualquer coisa neles operada ou por eles feita, mas somente em consideração da obra de Cristo; não lhes imputando como justiça a própria fé, o ato de crer ou qualquer outro ato de obediência evangélica, mas imputando-lhes a obediência e a satisfação de Cristo, quando eles o recebem e se firmam nele pela fé, que não têm de si mesmos, mas que é dom de Deus.
Ref. Rom. 8:30 e 3:24, 27-28; II Cor. 5:19, 21; Tito 3:5-7; Ef. 1:7; Jer. 23:6; João 1:12 e 6:44-45; At. 10:43-44; Fil. 1:20; Ef. 2:8.
II. A fé, assim recebendo e assim se firmando em Cristo e na justiça dele, é o único instrumento de justificação; ela, contudo não está sozinha na pessoa justificada, mas sempre anda acompanhada de todas as outras graças salvadoras (fruto do Espírito – paz, alegria, bondade, mansidão, domínio próprio, amor etc); não é uma fé morta, mas opera pelo amor.
Ref. João 3:16, 18, 36; Rom. 3:28, e 5: I; Tiago 2:17, 22, 26; Gal. 5:6.
III. Cristo, pela sua obediência e morte, pagou plenamente a dívida de todos os que são justificados, e, em lugar deles, fez a seu Pai uma satisfação própria, real e plena. Contudo, como Cristo foi pelo Pai dado em favor deles e como a obediência e satisfação dele foram aceitas em lugar deles, ambas livremente e não por qualquer coisa neles existente, a justificação deles é só da livre graça, a fim de que tanto a justiça restrita como a abundante graça de Deus sejam glorificadas na justificação dos pecadores.
Ref. Rom. 5:8, 9, 18; II Tim. 2:5-6; Heb. 10:10, 14; Rom. 8:32; II Cor. 5:21; Mat. 3:17; Ef. 5:2; Rom. 3:26; Ef. 2:7.
IV. Deus, desde toda a eternidade, decretou justificar todos os eleitos, e Cristo, no cumprimento do tempo, morreu pelos pecados deles e ressuscitou para a justificação deles; contudo eles não são justificados enquanto o Espírito Santo, no tempo próprio, não lhes aplica de fato os méritos de Cristo.
Ref. Gal. 3:8; I Ped. 1:2, 19-20; Gal. 4:4; I Tim. 2:6; Rom. 4:25; I Ped. 1:21; Col. 1:21-22; Tito 3:4-7.
V. Deus continua a perdoar os pecados dos que são justificados. Embora eles nunca poderão decair do estado de justificação, poderão, contudo, incorrer no paternal desagrado de Deus e ficar privados da luz do seu rosto, até que se humilhem, confessem os seus pecados, peçam perdão e renovem a sua fé e o seu arrependimento.
Ref. Mat. 6:12; I João 1:7, 9, e 2:1-2; Luc. 22:32; João 10:28; Sal. 89:31-33; e 32:5.
VI. A justificação dos crentes sob o Velho Testamento era, em todos estes respeitos. a mesma justificação dos crentes sob o Novo Testamento.
Ref. Gal. 3:9, 13-14; Rom. 4:22, 24.
Não poderíamos ser justificados se não tivéssemos antes, sido redimidos.
A redenção é o preço pago como resgate para libertar prisioneiros da prisão. Jesus pagou com o seu sangue, de forma completa e definitiva, o preço exigido pela justiça divina, para livrar os pecadores da condenação eterna. Este resgate não tinha preço pois se refere à libertação de vidas. Quanto vale uma só vida?
O pagamento de Cristo cobriu completa e perfeitamente, todos os débitos de todos os crentes para com Deus. Todas as exigências da lei foram pagas na cruz. O recibo do cancelamento total da dívida foi encravado na cruz (Col 2.13,14). Agora, não há nenhuma condenação para quem está em Cristo (Rom 8.1), nenhuma chama do inferno destinada a eles. O trabalho foi realizado completamente pelo próprio Cristo, sem o auxílio de qualquer pessoa.
A justificação é o efeito ou resultado da aplicação dos benefícios decorrentes da redenção. Como o débito foi pago por outro em nosso lugar, então somos declarados justos e sem culpa por Deus. Cristo se apresentou na presença do Pai, no lugar dos pecadores, para receber a sentença e a execução da mesma, que eram destinadas a eles. Quando Deus disse em relação aos que seriam redimidos por Cristo, que deveria condená-los e puni-los, Cristo se declarou culpado no lugar deles. Quando a execução da sentença foi determinada, Cristo declarou que deveria ser punido no lugar deles, e o fez morrendo na cruz. Isto é o que se chama de doutrina da substituição ou sacrifício vicário. Cristo ficou no lugar do pecador, e nós ficamos no lugar de Cristo diante de Deus. Ele nos olha como se fôssemos Cristo, e somos aceitos por Ele com o mesmo amor que ama a Cristo. E somos considerados herdeiros, inclusive de uma coroa no céu, juntamente com Cristo. Tão logo que o pecador se arrepende ele é justificado de todos os seus pecados. Ele está sem culpa diante de Deus, inteiramente aceito pelo Seu amor. Além disso, ele passa a ter méritos porque tomou a justiça de Cristo para si. Os trapos do pecador (seus pecados) foram lançados sobre Cristo (Is 53.11b), e as vestes de Cristo foram colocadas no pecador arrependido.
A justificação é irreversível. Tão logo que o pecador toma o lugar de Cristo, e Cristo toma o lugar do pecador, não há mais o temor de uma segunda troca. Cristo pagou o débito e este não será exigido novamente (Jo 3.14,18). O castigo que ele sofreu na cruz em nosso lugar não terá que ser sofrido por nós novamente. Ele não cancelou o escrito de dívida para que ele fosse reescrito outra vez (Col 2.13,14). Deus não dá o perdão gratuito para voltar a condenar depois. Daí não mais haver condenação para quem está em Cristo Jesus (Rom 8.1). Ninguém pode condenar a quem Deus justificou (Rom 8.33,34).
Tudo isto é obtido gratuitamente sem as nossas obras (Ef 2.8,9). Nunca será obtido com base nos nossos merecimentos. É obtido por nada, sem que nada façamos, além de crer. O ladrão que foi salvo na cruz, e as pessoas que aceitam a Cristo em seus leitos de morte, bem ilustram o fato de que a salvação/justificação é por meio da fé somente, e não das obras.
O evangelho de Cristo é tão imensamente precioso que não poderia ser comprado por qualquer valor deste mundo ou do universo. É por isso que Deus nos concede a salvação por graça, mediante o preço altíssimo e incalculável, que Jesus pagou com Sua própria vida e ao dispor-se a levar sobre Si a culpa de todos os nossos pecados.
Primeiro devemos ser justificados simplesmente pedindo para sermos salvos, e faremos as boas obras depois (Ef 2.10), pois que somos justificados, para sermos regenerados e santificados, porque a santidade é a essência mesma da natureza de Deus. Se alguém quiser ser justificado deve vir a Cristo como está, com todos os seus pecados, não lhe escondendo cousa alguma, porque é isto o que nos recomenda a Ele para sermos socorridos, a exposição sincera do nosso estado de miséria e o reconhecimento da nossa culpa, em razão do pecado. Mostrando-lhe o estado de sujeira e os trapos de nossas roupas, ele as trocará pelas suas vestes de justiça alvas e limpas (Zac 3.1-5).
Precisamos de arrependimento e o desejo de deixar o pecado para sermos justificados, mas não é uma coisa nem outra a causa da nossa justificação, ainda que necessárias, mas Cristo, Cristo, Cristo, somente Cristo.
Mas, para se arrepender, o pecador necessita do convencimento e da obra do Espírito Santo. O homem dirigido pelo Espírito para ser justificado. O homem necessita ser justificado porque foi criado para ser justo tanto para com os demais homens, quanto para com Deus. Quando o homem é trazido a Cristo, pelo Espírito, ele descobre que sua vida tem sido manchada por várias ofensas contra a lei de Deus.
O Espírito Santo nos convence do pecado antes que possamos ser justificados, para compreendermos que estamos cheios de pecados, tanto em nossas ações exteriores, quanto em nossos pensamentos e imaginação. O pensamento e a imaginação do nosso coração são continuamente maus. Ninguém pode alegar inocência diante do trono de Deus. A menos que o homem seja derrubado do seu orgulho em não se reconhecer pecador, Cristo nunca o levantará. Por ser um transgressor da lei de Deus, o homem, sem Cristo, nunca pode estar de pé diante dEle baseado em sua própria justiça. A possibilidade de ser justificado com base na justiça própria deve ser considerada como um caso totalmente perdido. O passado não poder ser apagado, e o futuro não será nada melhor, e assim a salvação pelas obras da lei será sempre uma impossibilidade (At 13.39; Rom 3.20,28; 4.1-8; 9.30-32; Gl 2.16; 3.11).
A lei amaldiçoa a todos os que não cumprem os seus mandamentos (Dt 27.26; Gl 3.10,11) mas Jesus se fez maldição no nosso lugar para nos resgatar da maldição da lei (Gl 3.13,14). Os que não têm a Cristo permanecem debaixo da referida maldição (Gl 3.10). Mas o justificado é resgatado dela.
Os que buscam ser justificados pela lei, e não pela fé em Cristo, deveriam se lembrar que quem quebra a lei num só ponto se torna culpado de todos os demais (Tg 2.10). Um só pecado sujeita o transgressor à condenação eterna no inferno (Mt 5.18,19,22). Isto revela quão estrita é a justiça de Deus. E aponta para a grandeza da ira de tal justiça que foi despejada sobre Jesus quando pagou pelos nossos pecados na cruz, para satisfazer a exigência da justiça de Deus. O que concluímos disto é que qualquer pessoa que não tenha sido justificada por Cristo está sob condenação (Jo 3.36b), e nós, que temos sido justificados devemos levar o pecado muito a sério, sabendo que a ira de Deus contra o pecado está revelada no castigo que Jesus sofreu na cruz.
O homem só pode ser justificado pelo caminho de Deus (a graça que está em Cristo) que é totalmente diferente do caminho através do qual não podemos ser justificados (o mérito das nossas boas obras). Não somos justificados pela nossa própria obediência, mas pela obediência de Cristo (Rom 5.19).
Como a justificação não é pelo nosso merecimento, e sim pelos méritos de Cristo, é comum afirmar-se que a salvação é um dom (graça) imerecido. De fato não é porque a mereçamos, que a recebemos, mas porque fomos eleitos pelo amor de Deus para recebê-la. (Isto estudaremos pormenorizadamente no assunto relativo à eleição). E tudo o que se refere à nossa salvação (eleição, justificação, regeneração, santificação e glorificação) está em Cristo.
Quando o crente é abençoado com a bênção da justificação não é por sua própria causa, mas por causa de Jesus. Deus apaga os seus pecados em razão do que Jesus fez. O crente não tem méritos próprios mas tem recebido os méritos ilimitados de Jesus, ao ser vestido com a Sua justiça divina (Mt 22.11,12; Rom 10.4; I Cor 1.30). Todos os méritos de Jesus são imputados àqueles que são justificados pela sua graça. Cristo se fez pecado por nós (II Cor 5.21) e nós fomos feitos reis e sacerdotes para Deus (I Pe 2.9; Apo 5.9,10).
Estando vestido da justiça de Cristo, o crente não terá no céu uma justiça maior ou melhor do que a que tem na terra. É por isso que não será mais aceitável a Deus quando for para o céu, do que aqui na terra, pois a mesma justiça de Jesus é a que os crentes possuem tanto na terra quanto no céu. Uma justiça divina, melhor do que a que Adão tinha em seu estado de inocência no Éden, que era uma justiça humana, baseada na sua própria justiça.O caminho de chegada a esta justificação é a fé. Não por meio de choros, orações, humilhações, trabalhos, leitura da Bíblia (ainda que tudo isso seja necessário depois que o crente é justificado) ou quaisquer outros meios, MAS PELA FÉ. É a graça quem justifica e salva, mas sempre por meio da fé, porque Deus prometeu que seria apenas este o único meio da justificação (Hc 2.4; Rom 1.17; 5.1; Ef 2.8).
Mas a fé que conduz à justificação é uma fé viva, genuína, que vem de Deus, do alto, que se manifesta em obras (I Tim 1.5; Tg 2.17-19). A fé sem fingimento que habitou na mãe e avó de Timóteo (II Tim 1.5). A fé que conduz ao arrependimento e entrega da vida ao Senhor, para que seja por Ele transformada e santificada (este é um outro assunto que estudaremos sob os temas de Regeneração e Santificação). Uma fé como esta não pode ser de nós mesmos, é uma fé que também recebemos como um dom de Deus.
O grande privilégio da justificação é que passamos a ter paz com Deus (Rom 5.1). O temor do mal e do juízo vindouro terminam. O crente se sente seguro nas mãos de Deus e descansa quanto ao destino eterno de sua alma, independentemente das circunstâncias adversas que possa sofrer neste mundo. O coração justificado pode experimentar a paz de Cristo em meio às aflições e tribulações.
Permanecendo em Cristo, os crentes não podem mais estar debaixo da maldição da lei, mesmo neste mundo, porque não apenas Deus os perdoou em Cristo quanto a todas as suas transgressões da lei, como estão destinados a viverem em perfeita harmonia com todas as exigências da lei moral de Deus, no porvir, pela capacitação recebida do poder e graça de Deus, mediante a obra de redenção realizada por Jesus, bem como pela regeneração e santificação operadas pelo Espírito Santo, que é o selo e a garantia da salvação dos crentes. O Espírito que tem lutado contra a carne e mortificado a natureza terrena do crente, na batalha constante que se travará permanentemente neste mundo, é a garantia que temos de Deus, de que Ele completará a Sua obra iniciada em nós na justificação e regeneração, de purificação do pecado e do revestimento de Cristo.
Como resultado ou consequência da justificação, somos regenerados e santificados pelo Espírito Santo, em Cristo. Somos feitos filhos de Deus (Jo 1.12; I Jo 3.2), herdeiros de Deus, livrados da condenação da lei e da morte, e temos vida eterna (Mt 25.46; Lc 18.30; 20.35,36; Jo 3.15,16,18; 3.36; 4.14,36; 5.24,29; 6.27,37,39,40,47,51,54, 57,58; 8.51; 10.10,28; 11.26; 12.25,50; 14.19; 17.2,3; At 13.46,48; Rom 1.17; 2.7; 5.9,17,18,21; 6.22,23; 8.1,2,6,16,18,32-35; 10.9,13; 14.4; I Cor 1.8,9; 2.12; 6.3; 9.25; 11.32; 15.49, 54; II Cor 1.24; 3.18; 4.17; 5.17; 13.6; Gl 4.6; 6.8; Ef 2.1,4,5,8-10; Fp 1.6,21; 3,21; Col 1.12, 22,27; 2.13,14; I Tes 1.10; 4.14,17; 5.9,10,23? II Tes 2.13,16,17; I Tim 1.15,16; 6.12; II Tim 1.9,10,12; 2.10; Tito 1.1,2; 3.4-7; Hb 1.14; 5.9; 6.17-20; 7.25; 8.12; 9.15; 10.14,39; 12.28; I Pe 1.3-5,22,23; 5.10; II Pe 1.3,4; 3.7,13; I Jo 1.2; 2.25; 3.1-3; 5.11-13, 20; II Jo 1,2).
Não podemos sentir a justificação, por ser um decreto legal da parte de Deus que nos livra da condenação e que nos imputa a justiça de Cristo, mas podemos sentir os seus efeitos sobre nós: o amor a Deus e aos irmãos em Cristo, o trabalho de purificação dos nossos pecados e o novo nascimento operados pelo Espírito Santo, a paz de Cristo em nossos corações e muitas outras evidências que comprovam que de fato fomos feitos filhos de Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo.
Silvio Dutra Alves
Enviado por Silvio Dutra Alves em 19/12/2013