Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
Uma Chamada Séria a Uma Vida Santa e Devota – Cap V
Tradução e adaptação feitas pelo Pr Silvio Dutra, do quinto capitulo do livro de William Law, em domínio público, intitulado Uma Chamada Séria a Uma Vida Santa e Devota. William Law, foi professor e mentor por vários anos de John e Charles Wesley, Geogre Whitefield – principais atores do grande avivamento do século XVIII, que se espalhou por todo o mundo - Henry Venn, Thomas Scott e Thomas Adam, entre outros, que foram profundamente afetados por sua vida consagrada a Deus, e sobretudo pelo conteúdo deste livro.

Pessoas que estão livres da necessidade de trabalhar em empregos específicos devem se considerar como devotadas a Deus em maior grau.

Grande parte do mundo está livre das necessidades de trabalhar em empregos, e têm o seu tempo e dinheiro à sua própria disposição.
Mas, como ninguém deve viver em seu trabalho de acordo com a sua própria vontade, ou para fins como o de agradar suas próprias extravagâncias, senão fazer todos os seus negócios de tal forma, como se fizesse um serviço para Deus, por isso aqueles que não têm emprego especial, estão muito longe de serem deixados em maior liberdade para viver para si mesmos, para satisfazer suas próprias vontades, e gastarem seu tempo e dinheiro no que quiserem, eles estão sob uma maior obrigação de viver totalmente para Deus em todas as suas ações.
A liberdade de sua condição os coloca numa maior necessidade de sempre escolher, e fazer as melhores coisas.
São aqueles, de quem muito será exigido, porque muito lhes é dado.
Um escravo só pode viver para Deus, de uma forma particular, isto é, pela paciência e submissão religiosa em seu estado de escravidão.
Mas todas as formas de vida santa, todas as instâncias, e todos os tipos de virtude, estão abertos para aqueles que são mestres de si mesmos, de seu tempo e dinheiro.
É portanto, o dever dessas pessoas, fazerem um uso sábio de sua liberdade, para se dedicarem a todos os tipos de virtudes, aspirarem a tudo o que é santo e piedoso, se esforçarem para serem eminentes em todas as boas obras, e para agradarem a Deus na forma mais elevada e mais perfeita; isto é seu dever, tanto serem sábias na condução de si mesmos, quanto ampliarem seus esforços por santidade, como é dever de um escravo se resignar a Deus em seu estado de escravidão.
Você não é um trabalhador, comerciante, nem soldado, considere-se, portanto, como sendo colocado numa condição, guardadas as devidas proporções, como a dos anjos bons, que são enviados para o mundo como espíritos ministradores, para o bem geral da humanidade, para ajudar, proteger e servir em favor daqueles que hão de herdar a salvação.
Como você está mais livre das necessidades comuns dos homens,  você deve imitar as perfeições mais elevadas de anjos.
Fosse você Serena, sendo obrigada pelas necessidades da vida, a lavar roupas para fora, para a sua manutenção, ou servir algum patrão que exigisse todo o seu trabalho, isto seria, então, o seu dever de servir e glorificar a Deus, por essa humildade, obediência e fidelidade, como para poder adornar essa condição de vida.
Deveria então ser recomendado ao seu cuidado, melhorar esse talento à sua maior altura. Para que quando chegasse a hora, que a humanidade deveria ser recompensada por seu trabalho pelo grande Juiz dos vivos e dos mortos, você pudesse ser recebido com um “muito bem servo bom e fiel... entra no gozo do teu Senhor.”
Mas, como Deus lhe deu cinco talentos, como ele colocou você acima das necessidades da vida, como ele o deixou nas mãos de si mesmo, na liberdade de escolher os meios mais exaltados e felizes da virtude, como ele lhe enriqueceu com muitos dons da fortuna, e não deixou nada para você fazer, senão  fazer o melhor uso da variedade de bênçãos, para tirar o máximo de uma vida curta, para operar a sua própria perfeição, para a honra de Deus, e para o bem do seu próximo; por isso agora é seu dever imitar os maiores servos de Deus, e saber como os santos mais eminentes viveram, e estudar todas as artes e métodos para a perfeição, e não estabelecer limites para o seu amor e gratidão ao Autor generoso de tantas bênçãos.
Agora, é seu dever transformar seus cinco talentos, em mais cinco, e considerar como o seu tempo, e lazer, e saúde, e dinheiro,  podem ser feitos meios felizes de purificar sua própria alma, melhorando seus semelhantes nos caminhos da virtude, e lhe conduzindo finalmente para as maiores alturas da glória eterna.
Deleite-se com o seu serviço, e implore a Deus para adorná-lo com cada graça e perfeição.
Alimente isto com boas obras, tenha paz na solidão, obtenha forças na oração, torne-se sábio com a leitura, ilumine-se por meditação, torne-se terno com amor, adoçado com humildade, humilhando-se com penitência, animando-se com salmos e hinos, e se confortando com reflexões frequentes sobre a glória futura. Mantenha-se na presença de Deus e aprendendo a imitar aqueles anjos guardiões, que apesar de participarem em assuntos humanos, bem como com os mais baixos da humanidade, sempre veem a face de  nosso Pai que está nos céus.
Isto, Serena, é a sua profissão. Porque tão certo como Deus é um só Deus, tão certo é que ele tem apenas um comando para toda a humanidade, sejam eles escravos ou livres, ricos ou pobres, e que devem atuar até a excelência da nova natureza que ele lhes deu, para viver pela razão, para andar na luz da religião, para usar tudo com sabedoria, para glorificar a Deus em todos os seus dons e dedicar todas as condições de vida a seu serviço.
Este é um comando único e comum de Deus para toda a humanidade. Se você tem um emprego, você deve ser, portanto, razoável, e piedoso, e santo, no exercício do mesmo, se você tiver tempo e dinheiro, você é obrigado a ser assim razoável, e santo, e piedoso, no uso de todo o seu tempo, e todo o seu dinheiro.
O uso religioso correto de tudo e de todos os talentos, é o dever indispensável de todo o ser, que é capaz de conhecer o certo e o errado.
Porque a razão pela qual devemos fazer alguma coisa, como que para Deus e no que diz respeito ao nosso dever, e sua relação com ele, é a mesma razão pela qual devemos fazer tudo para Deus, e tendo em conta o nosso dever, e sua relação com ele.
Esta que é uma razão para o nosso viver sábio e santo, no cumprimento de todos os nossos negócios, é a mesma razão de nosso viver sábio e santo no uso de todo o nosso dinheiro.
Como temos sempre as mesmas naturezas, e somos em todos os lugares servos do mesmo Deus, e como tudo é igualmente o seu dom, por isso devemos sempre agir de acordo com a razão de nossa natureza, devemos fazer todos as coisas como servos de Deus,  devemos viver em qualquer lugar, como em sua presença, devemos usar tudo, como deve ser usado como pertencente a Deus.
Se, portanto, algumas pessoas imaginam, que devem ser sérias e solenes na igreja, mas podem ser tolas e frenéticas em casa, que eles devem viver de acordo com alguma regra no domingo, mas podem gastar os outros dias ao acaso; que eles devem ter alguns momentos de oração, mas podem gastar o resto de seu tempo como bem entenderem, que eles devem dar algum dinheiro na caridade, mas podem desperdiçar o restante conforme lhes der na mente, essas pessoas não têm considerado adequadamente a natureza da religião, ou as verdadeiras razões da Piedade .
Porque aquilo que nos princípios da razão pode ser dito que é bom ser sábio e santo de espírito na Igreja, pode ser dito também que é sempre desejável ter a mesma condição em todos os outros locais.
Aquele que verdadeiramente sabe por que ele deveria gastar todo o tempo bem, sabe, que nunca é permissível jogar fora qualquer momento. Aquele que acertadamente entende a razoabilidade e  excelência da Caridade, saberá, que nunca pode ser desculpável perder qualquer parte do nosso dinheiro no orgulho e insensatez, ou em quaisquer despesas desnecessárias.
Porque cada argumento que mostra a sabedoria e excelência da Caridade, prova também a sabedoria de gastar todo o resto do nosso dinheiro. Todo argumento que comprova a sabedoria e razoabilidade de ter momentos de oração, mostra a sabedoria e a razoabilidade de não perder nenhuma parte do nosso tempo.
Se alguém pudesse provar que não precisamos sempre agir como na presença divina, que não precisamos considerar e usar tudo, como dom de Deus, que não precisamos viver sempre pela razão e fazer da Religião o fundamento de todas as nossas ações, os mesmos argumentos provariam, que nunca precisamos agir como que na presença de Deus, nem fazer da religião e da razão a medida de qualquer de nossas ações.
Se, portanto, temos que viver para Deus, em qualquer momento ou em qualquer lugar, devemos viver para ele em todos os momentos e em todos os lugares. Se devemos usar qualquer coisa como um dom de Deus, devemos usar tudo como seu dom. Se devemos fazer qualquer coisa por regras estritas da razão e piedade, devemos fazer tudo da mesma maneira. Porque razão, e sabedoria, e piedade, são as melhores coisas em todos os momentos e em todos os lugares, porque são as melhores coisas, em qualquer momento, ou em qualquer lugar.
Se é a nossa glória e felicidade ter uma natureza racional, que é dotada de sabedoria e razão, que é capaz de imitar a natureza divina, então deve ser a nossa glória e felicidade, melhorar a nossa razão e sabedoria, para atuar até a excelência da nossa natureza racional, e para imitar a Deus em todas as nossas ações, até o máximo do nosso poder. E os que confinam a Religião a tempos e lugares, e a algumas pequenas regras de reclusão, pensam que isto é muito estrito e rigoroso para trazer a religião à vida comum, e fazem disto leis para todas as suas ações e formas de vida, aqueles que pensam assim, não somente erram, mas confundem toda a natureza da religião. Porque, certamente, eles confundem toda a natureza da Religião, porque pensam que podem fazer qualquer parte de sua vida mais fácil, por ser livre dela. Deles pode muito bem ser dito que confundem a natureza de toda a sabedoria, porque não pensam que é desejável, ser sempre sábios. Aquele que não aprendeu a natureza da piedade, pensa muito pouco em ser piedoso em todas as suas ações. Aquele que não entende suficientemente qual é o motivo, não pode desejar sinceramente viver em tudo de acordo com isto.
Se tivéssemos uma religião que consistisse em superstições absurdas, que não levasse em conta a perfeição de nossa nova natureza, as pessoas poderiam bem estar contentes de ter alguma parte de sua vida para ser excluída da mesma.
Mas, como a Religião do Evangelho é o refinamento e elevação exaltação das nossas melhores faculdades, pela operação regeneradora e renovadora do Espírito Santo; uma vez que requer uma vida de maior razão, uma vez que somente nos obriga a usar deste mundo, pela razão pela qual deve ser usado, a viver em tal comportamento digno da glória de seres inteligentes, para andar em  sabedoria para a prática da piedade.
Além disso, como Deus é um só e o mesmo ser, sempre agindo como em si mesmo, em conformidade com a sua própria natureza, por isso é o dever de todo ser que ele criou à sua imagem e semelhança,  viver de acordo com a nova natureza que ele lhe deu, e sempre agir de acordo com a mesma.
Portanto, é uma lei imutável de Deus, que todo ser racional deve agir razoavelmente em todas as suas ações, não em determinado tempo ou lugar, mas em todas as ocasiões e em todos os lugares (Tanto que os que se opuserem a isto serão condenados por Deus a uma perdição eterna – nota do tradutor).
Esta é uma lei que é como a imutabilidade de Deus, e que nunca pode deixar de existir, tanto quanto Deus não pode deixar de ser o Deus de sabedoria e ordem.
Quando, pois, qualquer ser que é dotado de razão, faz uma coisa irrazoável, em qualquer momento, ou em qualquer lugar, ou na utilização de qualquer coisa, ele peca contra a grande lei da sua natureza, abusa de si mesmo, e peca contra Deus , o criador dessa natureza.
(Isto demonstra a condição de profunda miséria em que nos encontramos, naturalmente falando, em razão do pecado original, quando o homem deixou de fazer um uso adequado da razão, e do qual pode ser resgatado para a renovação da sua mente, apenas e exclusivamente pela graça de Jesus Cristo – nota do tradutor).
Aqueles, portanto, que defendem as indulgências ao pecado e vaidades, para qualquer modas tolas, costumes e comportamentos do mundo, se rebelam contra a própria natureza para a qual foram criados  (a de serem santos e perfeitos) e se rebelam portanto contra Deus, que nos deu razão para nenhum outro fim, senão a de fazê-la a regra e a medida de todos os nossos modos de vida.
Quando, pois, você é culpado de qualquer tolice ou extravagância, ou de qualquer comportamento vão, não o considere como uma questão pequena, porque pode parecer assim, se comparado a alguns outros pecados, mas o considere, como uma ação contrária à sua natureza, conforme o propósito de Deus relativo à mesma, e então você vai ver que não há nada pequeno, que não é razoável. Porque todas as formas irracionais são contrárias à natureza de todo ser racional, sejam homens ou anjos. Nenhum deles pode ser agradável a Deus, a menos que ajam de acordo com a a razão e a excelência de suas naturezas.
(O autor usa simplesmente a palavra natureza, mas temos usado a expressão nova natureza, em algumas partes, uma vez que é um claro ensino bíblico que a velha natureza está corrompida pelo pecado, e necessitamos de uma nova natureza, adquirida na conversão, pela fé em Cristo, e por ação do Espírito Santo, e esta sim, está perfeita em todas as suas partes, e necessita apenas ser desenvolvida, amadurecida – nota do tradutor).
Nosso bendito Salvador tem claramente voltado nossos pensamentos para este caminho, por fazer esta petição uma parte constante de todas as nossas orações: “Seja feita a tua vontade assim na terra como ela é feita no céu. Uma clara prova, que a obediência dos homens é imitar a obediência dos anjos, e que os seres racionais na Terra, devem viver para Deus, como os seres racionais no Céu que habitam com ele.
Quando, portanto, você imaginasse em sua mente, como os cristãos devem viver para Deus, e em que graus de sabedoria e santidade eles devem usar as coisas desta vida, você não deve olhar para o mundo, mas você deve olhar para Deus, e para a sociedade dos anjos, e pense que sabedoria e santidade se destinam a prepará-lo para tal estado de glória. Você deve olhar para os mais elevados preceitos do Evangelho, você deve examinar a si mesmo pelo espírito de Cristo, você deve pensar como os homens mais sábios no mundo viveram, você deve pensar como almas que partiram viveram, você deve pensar nos graus de sabedoria e santidade que você desejará ter quando você estiver saindo do mundo.
Ora, tudo isso não é alongar o assunto, ou propor a nós mesmos, qualquer perfeição desnecessária. É, senão quase o cumprimento do conselho do apóstolo, onde ele diz: “Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento. O que também aprendestes, e recebestes, e ouvistes, e vistes em mim, isso praticai; e o Deus da paz será convosco.”, Fil 4.8,9.
Porque ninguém pode chegar perto da doutrina desta passagem, senão aquele que se propõe a si mesmo fazer tudo nesta vida como um servo de Deus, para viver pela razão, em tudo o que ele fizer, e para fazer da sabedoria e da santidade do Evangelho, a regra e a medida de seus desejos e ações, e de cada dom de Deus.
William Law
Enviado por Silvio Dutra Alves em 24/12/2013
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