Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
João Wesley, o Evangelista – Parte 5
Capítulo V
A vitalidade disciplinada na evangelização

Wesley não somente concebeu o ideal evangelizador em
termos tanto de apelo e compreensão, implementando-o
eficientemente, como também "colocou por trás de seu esforço
uma vitalidade disciplinada". Um empreendimento humano requer
tanto poder vital como controle para que atinja seus fins. A
vitalidade é para o ser humano o que o combustível é para o carro,
enquanto a disciplina é como o freio e a barra de direção. A
vitalidade sem disciplina é tão perigosa quanto um carro
desenfreado. A história do Cristianismo está cheia de casos em
que a evangelização surgiu devidamente abastecida de emoção,
mas sem as restrições (os parâmetros norteadores) da moralidade
ou do bom senso. Por outro lado, a disciplina sem vitalidade é tão
inútil quanto um carro bem equipado sem combustível. O sucesso
de Wesley baseia-se no fato de que ele uniu força e disciplina.
Ficamos admiradíssimos ante sua incomum resistência
física. Aqui está um homem que pregou 40 mil sermões em sua
vida, escreveu mais de trinta volumes, viajou mais de 4.500 milhas
por ano a cavalo, até a idade de sessenta anos, cuidou de um
trabalho de organização que teria prostrado um homem comum, e
faleceu aos oitenta e nove anos.
Wesley nunca foi prisioneiro da sua carne (ou seja, as
enfermidades, o envelhecimento nunca foram empecilho para
Wesley no seu trabalho missionário ). Seu corpo foi servo da sua
vontade implacável. Sua força vital não decaiu senão nos últimos
anos. Fazia um inventário de sua saúde em cada aniversário, e é
uma história de força inabalável. Em seu 67° aniversário, afirmou
que se sentia mais sadio do que quarenta anos antes. Em seu 72°
disse que podia pregar melhor do que aos trinta e dois. Aos
setenta e cinco anos registrou casualmente em seu Diário que
deixou a diligência (carruagem) de Londres em Chatam: "Preferi
subir a montanha a pé, deixando que a diligência me seguisse.
Parece que ela não tinha pressa, pois não me alcançou antes de
eu ter andado mais de 5 milhas". Dois anos depois, declarou que
podia enfrentar o vento do norte melhor do que aos vinte e sete, e
podia ler sem óculos. Ao chegar ao seu 80º aniversário, declarou
que não tinha as dores ou enfermidades físicas dos vinte e cinco, e
não havia congregação que não pudesse ouvir a sua voz.
Não foi antes dos oitenta e três que ele reclamou que os
seus olhos doíam se escrevesse durante mais de 15 horas por dia.
Não foi antes dos oitenta e cinco que admitiu estar começando a
esmorecer. Caminha mais devagar, principalmente quando sobe a
montanha; sua memória já não é tão rápida; e não pode ler tão
bem à luz de vela. No entanto, registra como "um dia de
descanso" aquele em que prega somente de manhã e à tarde. Em
seu 87º ano de vida publicou seu programa de visitação: vinte
cidades e vilas em vinte e oito dias. Quem se compara a ele em
força física?
Não sabemos explicar a vitalidade de Wesley, bem como
não compreendemos as tremendas realizações de Sir Winston
Churchill ou do dr. Albert Schweitzer, que parecem ter
ultrapassado as regras da saúde aplicadas às pessoas comuns.
Naturalmente, Wesley não carregava peso excessivo (pesava 53
quilos). Leslie Stephen chamou-o de "galo-de-briga humano". Era
cuidadoso em sua dieta. Dormia bem. Movido pela necessidade,
podia dormir profundamente até sentir-se restaurado. Uma vez
registrou de maneira indiferente que não havia perdido uma única
noite de sono em setenta anos. Mas há pessoas tão cuidadosas com
a higiene quanto Wesley, que morreram aos trinta.
Isto não significa que Wesley tenha sido um homem de
saúde extraordinária. Constantemente estava doente. Cuspia
sangue em seus primeiros anos e uma vez escreveu seu epitáfio,
pensando que a morte por tuberculose estava próxima. Seu
remédio soberano para todo ataque de doença ou cansaço era o
trabalho. O pensamento no trabalho ou a visão de pessoas
esperando para ouvi-lo fazia crescer a força vital dentro dele,
como a seiva no rebento, e quando havia terminado seu trabalho,
o inverno de sua fadiga tinha ido embora e a primavera estava em
plena florescência. Estes dois registros do Diário são típicos:
“Caminhei até Burnham. Não pensava em pregar lá,
duvidando que minhas forças me permitissem pregar sempre
três vezes por dia, como tenho feito desde que vim de
Evesham. Mas, ao encontrar uma casa cheia de pessoas, não
pude conter-me: quanto mais uso minhas forças, mais forças
tenho. Quase sempre estou muito cansado quando prego pela
primeira vez; um pouco, depois da segunda; mas após a
terceira ou quarta vez, raramente sinto fraqueza ou cansaço.”
“Tendo sido incomodado à noite por Mr. Swindells,
que dormiu comigo, e teve um tipo de ataque apopléctico, eu
não me sentia bem por volta do meio-dia, quando comecei a
pregar numa grande praça, em um lado da cidade, e o sol
quente brilhava sobre minha cabeça que tinha doído durante
todo o dia. Mas esqueci-me disto pouco depois de ter
começado a falar. Ao terminar meu discurso, deixei todo o
meu cansaço e dores de lado, e fui para Dubin em perfeita
saúde.”
A vitalidade de Wesley era mais que física; seu
maravilhoso vigor corporal vinha de um poder espiritual
surpreendente. Aqui está um homem que foi molestado pela
multidão, apedrejado de York até Cornwall e, no entanto podia
dizer depois de um encontro violento: "Do começo ao fim senti a
mesma presença de espírito como se estivesse sentado à minha
própria escrivaninha ". Aqui está um homem que enfrentou os
elementos naturais em sua crueza: tempestades que quase o
lançavam fora do cavalo; vento, geada e frio tão penetrantes que
suas faces e mãos sangravam como se tivessem sido cortadas por
faca; inundações, aventuras com ladrões e assaltantes de estradas,
pântanos, cavalos que caíam e diligências em disparada. Estas
experiências, naturalmente, exigem resistência física. Porém mais
que isto, exigem o desejo de enfrentá-las. Ninguém exigiu de
Wesley que enfrentasse temporais sob forma natural ou humana;
ele quis fazê-lo por amor ao Reino. E, mais espantoso ainda,
persistiu neste desejo sem esmorecer durante mais de meio século,
tão imperturbável em suas jornadas pela Inglaterra como uma
estrela em sua órbita.
Considere, agora, a pressão emocional de seus trabalhos.
Wesley pregava regularmente nas prisões e aconselhava
principalmente aqueles sob sentença de morte. Aqui está uma
descrição de uma cena angustiante, registrada no dia 26 de
dezembro de 1784, quando Wesley tinha 81 anos:
“Preguei o sermão aos criminosos condenados em
Newgate (Londres). Quarenta e sete estavam sob sentença de
morte. Enquanto entravam havia algo terrível no tinido de
suas correntes. Mas não se ouvia qualquer ruído, quer deles
ou do auditório repleto, depois que o texto foi anunciado: "Há
mais alegria no céu por um pecador arrependido, do que pelos
noventa e nove justos que não precisam de arrependimento".
O poder do Senhor estava eminentemente presente, e grande
parte dos prisioneiros estavam em lágrimas. Alguns dias
depois, vinte deles morreram de uma só vez, cinco dos quais
morreram em paz.
Ou considere este registro no Diário de Carlos Wesley,
ainda mais pungente:
“Por volta das 10h30 chegamos a Tyburn (com os
prisioneiros condenados); esperamos até às onze; então
foram trazidas as crianças marcadas para morrer.”
Por que terríveis experiências passou Wesley! No
entanto, ele manteve sua compaixão, jamais perdeu seu
equilíbrio mental, e seu prazer de viver permaneceu com ele até
o fim. Certa vez, disse que não havia sentido prostração
espiritual por mais de um quarto de hora, desde que nascera.
Provavelmente não estamos errados em ligar a vitalidade
física de Wesley à sua vitalidade espiritual, e esta à sua relação
com Deus. Wesley é um exemplo perfeito de integração
religiosa. Ele não carregava qualquer carga de culpa em sua
alma. Não tinha que enfrentar as lutas da vida tendo uma das
mãos atada às costas por causa de algum embaraço lamentável.
Não abrigava temores paralisantes . Nenhum ódio envenenava
seu copo de felicidade. "Onde o Senhor está, há liberdade",
prometem as Escrituras, e Wesley viveu esta verdade em sua
vida. Foi uma pessoa completamente emancipada no mais nobre
sentido do termo.
Ele acreditava que Deus o chamara para a tarefa, e não
permitia que nada que fosse humano desafiasse suas credenciais
divinas. Trabalhava em uma tarefa que envolvia toda a sua
natureza. Tinha certeza de que estava fazendo o bem às pessoas.
Usufruiu todas as satisfações do esforço criativo. Mais que tudo,
ele tinha um grande suprimento do amor de Deus, que dizia ser o
melhor remédio do mundo. Esse amor salva a pessoa do
"desassossego mental", da "angústia de um espírito quebrantado",
"do temor e da tristeza do coração", e "daquele cansaço e
mesquinhez inexprimíveis, tanto do mundo como de nós mesmos,
contra os quais lutamos durante tantos anos". O amor de Deus
não é somente um remédio soberano para estas misérias; é
remédio preventivo também -"Previne, particularmente, todas as
desordens físicas introduzidas pelas paixões, mantendo-nas
dentro de seus limites; e pela serenidade e tranquilidade
intraduzíveis que traz à mente, torna-se o mais poderoso de
todos os meios de saúde e longevidade". Imerso em Deus, sem
os sedimentos do temor, da culpa e da hostilidade, Wesley
verdadeirament e era, na frase do dramaturgo -"um canal pelo
qual a Onipotência pode passar".
Esta vitalidade sobre-humana de Wesley obteve
resultados porque era disciplinada. Não havia desperdício
desnecessário, dispersão ou desprendimento inútil de energia.
Tudo nele tendia a louvar ao Senhor porque estava sob controle
quádruplo:
1. Por uma consciência aguda do tempo. Um de seus
biógrafos relata que a carruagem de Wesley demorou-se, certa
vez, além do tempo marcado. Wesley havia guardado sua
papelada e deixado o apartamento. Enquanto esperava à porta,
alguém o ouviu dizer: "Perdi dez minutos para sempre". Gentil e
condescendente que era em muitas coisas, o tempo lhe era tão
precioso que em seu uso ele era decisivo e inexorável. Sua
carreira foi uma disciplina contínua no uso do tempo.
Ele controlava rigorosamente o seu tempo, do mesmo
modo como o fazia com o dinheiro. Planejava seus dias
considerando os minutos, e registrava em seu diário pessoal
como havia empregado cada hora, uma prática que formaria a
base do seu Diário. Seus compromissos eram sagrados,
principalmente porque seu programa era tão apertado que
permanecer quinze minutos a mais com uma pessoa significava
tomar um quarto de hora de outra. O velho dr. Johnson
reclamou a Boshwell: "A conversa de João Wesley me encanta.
Mas ele nunca está folgado. É sempre obrigado a ir-se em
determinada hora. Isto é muito desagradável para um homem que
gosta de cruzar as pernas, e terminar a conversa, como eu faço".
Wesley não perdia tempo e levantava-se às quatro horas
todas as manhãs. Atribuía sua boa saúde a esta prática,
insistindo em que o sono excessivo induzia à frouxidão da carne
e tendia a enfraquecer a vista. Mas o pior aspecto de se
permanecer na cama era o fato de se perder um tempo valioso, o
que era um pecado contra Deus. Wesley sustentava que o
levantar -se cedo podia não ser suficiente para tornar um homem
um cristão, mas o não levantar-se podia manter a pessoa pagã,
longe do espírito de Cristo.
Wesley trabalhava o tempo todo. Ele e o ócio se
separavam; poderia dizer honestamente que não tinha uma hora
sequer para gastar, desde as 4 da manhã até às 9 da noite. O
fundador do Metodismo teria concordado alegremente com dois
aforismos (sentenças morais, máximas) de seu contemporâneo,
Thomas Jefferson, o autor da independência norte-americana:
"É maravilhoso o quanto pode ser feito se estivermos em
constante atividade ", e "Ninguém jamais reclamará da falta de
tempo se nunca o perder".
Wesley redimia os fragmentos de seus dias. Se o vento
ou as ondas atrasassem o seu embarque, juntava uma
congregação e pregava-lhe o evangelho. Ou traduzia um tratado
de lógica para o uso de seus pregadores. Quando em viagem,
levava sempre um livro; e seu Diário, com uma infinidade de
notas sobre livros, fala eloquentemente de sua leitura. Quando
estava muito doente para pregar ou viajar, mas suficientemente
disposto para ler ou escrever, trabalhava em suas "Notas sobre o
Novo Testamento". Quando deu a seus pregadores o conselho
contido ainda hoje no ritual para admissão à sua Conferência
Anual Metodista: "Seja diligente; nunca esteja sem ocupação;
não se ocupe com coisas inúteis; nunca desperdice tempo, nem
gaste mais tempo em qualquer lugar que o estritamente
necessário", estava escrevendo autobiograficamente.
Apesar do seu volume de trabalho, ele mantinha a
proporção. Nunca permitiu que a porção do dia dedicada ao
trabalho da igreja avançasse no horário da oração particular. De
fato, quanto mais ocupado estivesse em deveres eclesiástico s,
mais se entregava à oração. Ele era capaz de escrever: "Tenho
tanto que fazer hoje que devo orar duas horas pela manhã".
No entanto, apesar de todos os seus compromissos,
graças à sua rigorosa administração do tempo, era calmo de
espírito. Dele se poderia dizer o que o biógrafo do falecido
arcebispo Temple disse: "Viveu uma vida agitada, mas nunca
perdeu o fôlego". O Metodismo deve muito ao domínio que
Wesley exercia sobre o tempo.
2. Por uma consciência sensível à Bíblia. Com Wesley
as exuberâncias da evangelização sempre foram reprimidas
(delimitadas, margeadas) por uma consciência escrupulosa. A
noção, às vezes prevalecente, de que se "o coração de uma
pessoa está certo, não importa muito o que ela faz," era
condenada pelo o fundador do Metodismo. A conduta deveria
sempre concordar com a moralidade. Em certa ocasião ele
censurou severamente as sociedades litorâneas cujos membros
estavam envolvidos em contrabando e percebeu, mais tarde, que
o trabalho de Deus havia aumentado lá desde que a prática de
roubar o rei havia cessado. Examinava os membros das
sociedades para ver se algum deles estava envolvido com a
destilação alcoólica ilegal. Excluiu alguns por transações
comerciais duvidosas. Sempre exortava seu povo a evitar "a
preguiça, a prodigalidade (desperdício, esbanjamento) e a falta
de asseio", que nem sempre são reconhecidas como pecados
entre os evangélicos.
Em uma conferência (que no Brasil equivale a um
Concílio), empregou quase todo o tempo verificando se "o
espírito e a vida de nossos pregadores estão de acordo com suas
profissões". Até hoje (no metodismo norte -americano) cada
membro de uma Conferência Anual (Concílio Regional) na Igreja
Metodista deve enfrentar uma inspeção anual de seu caráter. Para
Wesley, nenhum êxtase de emoção religiosa, nem a mais feliz
bem-aventurança mística, poderia substituir as exigências
simples, terrenas, da honestidade, da sobriedade, da diligência e
da boa vontade.
A fonte da ênfase moral de Wesley era, sem dúvida, a
Bíblia. Ele chamava o Metodismo de reavivamento da religião
bíblica, e afirmava, repetidamente, que o único guia para a fé e
prática que reconhecia eram as Escrituras.
Qual o guia pelo qual os homens julgam o certo e o
errado? Como devem suas consciências ser dirigidas? O guia
cristão para o certo e o errado é a Palavra de Deus, os escritos
do Antigo e do Novo Testamentos... são uma lanterna aos pés
dos cristãos, e uma luz em todos os seus caminhos. A Palavra de
Deus, somente, Wesley recebe como seu guia para o que é certo
ou errado, o que é realmente bom ou mau. Ele não julga nada
bom, a menos que aqui esteja declarado, diretamente ou por
consequência simples; não considera nada mau, senão o que
aqui está proibido, em termos ou por inferência inegável.
Além de qualquer outra coisa que a Bíblia possa ser, ela é
um livro de retidão. Embora a vida cristã seja mais do que a
moralidade, não é cristã se não tiver moralidade. Viver retamente
pode não ser a essência da religião, mas é a essência das
exigências de Deus sobre nós. Em parte alguma do Novo
Testamento se requer que tenhamos uma experiência emocional,
a fim de que sejamos salvos. Seu refrão, expresso de várias
maneiras, é: "A menos que a vossa retidão exceda a dos escribas
e fariseus" - o padrão moral mais alto conhecido no tempo de
Jesus - "não entrareis no Reino de Deus" (Mt 5:20). Não há
substituto para a conduta conscienciosa. Qualquer profissão de
comunhão com Deus que não conduza a ela é armadilha ou
fraude.
Todas as alterações do sentimento que não resultam em
maior constância de caráter são pó e cinza diante de Deus.
Toda tática evangelística deve ser colocada à prova, para
que confirme a santidade do coração e da vida. A fita métrica de
nossos esforços de reavivamento não é a profundidade dos
sentimentos de arrependimento, nem a intensidade dos desejos;
não é o calor das emoções nem são os bons momentos
proporcionados por estas experiências, mas, sim, a obediência
filial a Deus e os frutos do Espírito dela decorrentes. Se for
grande a nossa eloquência como evangelistas , ou poderosas as
nossas obras, ou profundas as nossas emoções, se não
guardarmos os mandamentos de Cristo, nosso testemunho será
em vão; e ouviremos o Mestre dizer um dia: "Os publicanos e as
pecadoras entrarão no reino dos céus antes de vós". A retidão
segundo a Bíblia foi a prova a que Wesley submeteu seus
próprios trabalhos evangelizadores. Seus filhos espirituais não
deveriam se desviar dela.
3. Por um senso comum crítico. "Sobre as Escrituras e o
senso comum", escreveu Wesley a um dos seus
correspondentes, "edifico todos os meus princípios". Ele
acreditava que a religião cristã é baseada na razão e que
renunciar ao raciocínio é o mesmo que renunciar à religião. A
religião e a razão andam juntas, de modo que toda a religião
irracional é falsa. Em seu famoso tratado sobre a perfeição cristã
ele diz:
"Admoesto-vos a nunca usar as palavras
“sabedoria”, “razão” ou “conhecimento” de maneira injuriosa.
Ao contrário, orai para que possais abundar nelas mais e
mais".
Ele insistia, portanto, em que todas as afirmações
religiosas fossem elaboradas com lógica. Criticava severamente
os místicos como Boehme, a quem encontrou cheio de
contradições, ou Swedenborg, demasiado "selvagem". O
Romantismo de Rousseau também sentiu o toque de suas mãos.
Wesley admoestava seus seguidores a respeito das
generalizações religiosas muito fáceis:
"Muitas vezes tenho encontrado em mim mesmo e
nos outros uma tendência a unir eventos que não têm
verdadeira relação entre si. Assim, uma pessoa diz: “estou tão
certo de que esta é a vontade de Deus quanto estou
justificado”. Outro diz: “Deus falou isto ao meu coração como
nunca falou antes”. É um meio muito perigoso de falar ou
pensar".
Wesley afirmava somente o que encontrava na Bíblia.
Isto é, ele se declarava um literalista. Na verdade, submetia as
Escrituras ao mesmo exame de racionalidade - o verdadeiro
senso comum mais do que a lógica aristotélica - como fazia com
todas as outras coisas.
A princípio, Wesley empregava o sorteamento para
encontrar orientação diária. Abria a Bíblia a esmo e observava o
significado da primeira passagem que seus olhos encontrassem.
Estava indeciso se deveria deixar Londres e ir a Bristol para
tomar conta do trabalho lá. Abriu a Bíblia ao acaso e o versículo
que encontrou (Atos 8:2) dizia: "Alguns homens piedosos
sepultaram a Estevão e fizeram grande pranto sobre ele". Era
um aviso claro para que não fosse a Bristol. Mas, pouco depois,
ainda confuso sobre o assunto, e inclinado a mudar de ideia,
abriu a Bíblia em 2 Reis 16.20 - "E Ajaz dormiu com seus pais,
e eles o sepultaram na cidade de Jerusalém". Para o observador
imparcial este verso pareceria tão agourento quanto o primeiro.
Mas Wesley leu nele uma ordem divina para que fosse. O caso é
que enquanto ele procurava orientação na Bíblia, lia através das
lentes do seu próprio julgamento.
Sua crítica se aprofundou pela familiaridade com a
grande literatura do mundo. Lia livros de todos os tipos -para
mencionar, citemos alguns livros e seus autores mencionados
em seu Diário: os clássicos antigos (Ilíada e Odisseia de
Homero; Memorabilia, de Xenofonte; os Diálogos de Luciano,
Virgílio, Cícero e Horácio); filosofia: (Platão, Locke, Leibniz,
Hutchinson); economia, política (O Príncipe, de Maquiavel e
Fábulas das Abelhas, de Mandeville); literatura católico-romana
(Vidas, de Loiola, São Patrício, os místicos medievais); ciências
(Bacon, as Cartas do dr. Flanklin sobre a eletricidade,
Huyghens, Priestley, as transações da Sociedade Real); poesia
(Milton, Pope, Cray, Young, Voltaire, Thomson, Ossiam);
drama (Shakespeare), inúmeros volumes de história, cartas
(Dean Swift, Lord Chesterfield ); viagens (Viagem às Ilhas do
Oeste, do dr. Johnson, Jornada Sentimental, de Sterne,
Descrição de Córsega, de Boswell, As Viagens de Cook) bem
como estudos profissionais e sermões. Será que tudo isto é
semelhante à leitura da maioria dos evangelistas?
No entanto, embora fosse crítico de muito do que
passava por religião, ele era igualmente crítico da razão e da
aprendizagem. Sabia que apesar de a razão fornecer os freios,
ela não enche o tanque de combustível. Por si só não produz
fé, esperança, ou amor. Enquanto a erudição dá dimensões ao
ministério do homem que a mais completa consagração não
pode compensar, ele sabia que Deus pode usar pessoas
incultas para realizar seus propósitos. As limitações da razão
tornaram-no tolerante também às opiniões e práticas que se
desviavam (diferenciavam, divergiam) das suas.
4. Pelas regras do bom-tom . Wesley foi criado nas
tradições educadas da Igreja Anglicana. Embora tenha se
afastado do meio em que foi educado para que pudesse salvar
almas, nunca sucumbiu à heresia de que quanto mais cru é um
pregador, mais eficiente é seu ministério. Ele se encolerizava
contra aqueles que gritavam do púlpito e usavam
levianamente o nome divino. Seu ideal é sugerido por uma
frase que usava com frequência: "um estado de alegria
solene" – o sentimento religioso temperado pela dignidade
própria do santuário e a crucialidade dos interesses últimos.
Ele ficava mortificado com as desordens na congregação.
Repreendia em linguagem bem clara as sociedades nas quais
as pessoas caminhavam durante o culto "como se estivessem
num jardim" (passeando) ou conversavam durante ou depois
do culto, como se estivessem num bar. Ah! Wesley, devias
estar vivo agora!
Em outras palavras, Wesley acreditava que um cristão
deveria ter boas maneiras. "Como é agradável a cortesia
unida à sinceridade! Por que", perguntava ele, "deveriam elas
estar separadas?"
Um ministro (pastor), pensava ele, deve ter toda a
"cortesia de um cavalheiro unida à correção de um erudito".
Embora Wesley fosse duro como administrador havia
também uma delicadeza em suas relações sociais que nem
sempre pode ser encontrada no pregador do evangelho.
Certa vez, Wesley estava almoçando com um de seus
pregadores itinerantes, uma pessoa de maneiras muito
simples. Este pregador sem tato, notando que a filha de seu
anfitrião usava mais anéis que ele poderia aprovar, tomou
rudemente a mão da moça e disse: "O que o senhor pensa, sr.
Wesley, desta mão metodista?" Com um sorriso bondoso
dirigido à moça, Wesley replicou: "Penso que é uma mão
muito bonita". Para Wesley, as boas maneiras não eram uma
virtude de menor importância, como o eram para alguns
evangelistas.
Concluindo, ao ponderarmos sobre a magnitude de
Wesley como um modelador de almas, e uma influê ncia
contínua, o segredo parece ter sido – tanto quanto a inspeção
humana pode verificar – a simetria de seus trabalhos.
A “praga do evangelismo ” - ou seja, a aderência
(adesão, enfoque) estreita a um fragmento do evangelho, a
um segmento da natureza humana ou a um método único –
era completamente estranha a Wesley. Como consequência,
seu reavivamento não terminou em cansaço, desilusão e
reação raivosa contra a igreja; terminou na sua recriação.
Lemos, no livro de Apocalipse, que a extensão,
largura e altura da Nova Jerusalém são iguais. As palavras
simbolizam também a realização de João Wesley.
Extensão: não somente um ministério pessoal de
sessenta anos de duração; mas uma "linha de esplendor sem
fim" – impulsionada por energias super-humanas.
Largura: a santificação da natureza integral do homem
– da mente, do corpo, do coração, da vontade, da sociedade –
sendo o mundo a sua paróquia.
Altura: aspiração a nada menos que a perfeição do Pai
Celestial.
Se pudermos apenas compreender a visão de Wesley
em todas as suas dimensões, e torná-la nossa, talvez vejamos
a Cidade Santa descendo uma vez mais à terra, e Deus
habitará conosco e seremos seu povo e ele será nosso Deus.
A ação evangelizadora é uma ação do amor. Um ato
motivado e impulsionado pelo amor de Deus e uma dádiva
amorosa da totalidade de sua vida no compartilhar do amor
divino às pessoas e comunidades. Por amar o ser humano,
Wesley desejava levar-lhe, com todas as suas forças e com todo o
seu coração, o amor redentor de Cristo.
Amou a todos intensa e sinceramente, sem
descriminações, numa época cheia de preconceitos, separações,
menosprezos e marginalizações. Em especial, amou os
abandonados, desprezados, pobres e desesperados, valorizando
suas vidas e trazendo-lhes a esperança e o poder do evangelho de
Cristo.
Para rever, reavaliar e redespertar os cristãos e os
metodistas na paixão evangelizante, está sendo relançado o
tradicional, motivador e sempre atual livro, João Wesley, o
Evangelista.
Ao lermos este livro, religaremos nossas vidas e a vida da
Igreja Metodista (e cristã) aos fundamentos básicos da
"experiência de João Wesley" e ao desenvolvimento da obra de
renovação e restauração iniciada por ele, seu irmão Carlos
Wesley e um grupo significativo de irmãos(ãs).
Bispo Nelson Luiz Campos Leite
Bispo Nelson Luiz Campos Leite
Enviado por Silvio Dutra Alves em 11/05/2014
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