Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
Evangelho 23
“24 Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as põe em prática, será comparado a um homem prudente, que edificou a casa sobre a rocha.
25 E desceu a chuva, correram as torrentes, sopraram os ventos, e bateram com ímpeto contra aquela casa; contudo não caiu, porque estava fundada sobre a rocha.
26 Mas todo aquele que ouve estas minhas palavras, e não as põe em prática, será comparado a um homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia.
27 E desceu a chuva, correram as torrentes, sopraram os ventos, e bateram com ímpeto contra aquela casa, e ela caiu; e grande foi a sua queda.” (Mt 7.24-27)

Nosso Senhor não diz que somente desceu a chuva, mas que também os rios vieram e sacudiram a casa. Sempre me parece que isto representa o mundo, em geral, no sentido bíblico da palavra, ou seja, a perspectiva mundana, o tipo mundano de vida.
Nos agrade ou não, sejamos cristãos verdadeiros ou falsos, o mundo chega a sacudir esta nossa casa, desencadeando toda sua fúria contra nós.
(Além do mundo, devemos considerar os ataques desferidos contra a nossa casa espiritual, pela nossa própria natureza terrena – carne, e pelos principados e potestades malignos – nota do tradutor).
Os ataques do mundo podem ser traduzidos por sedução ou por perseguição.
Todos sabemos algo sobre o que significa sentir que a casa quase desaba às vezes. Não é exatamente que o cristão deseja abandonar sua fé, porém o poder do mundo pode ser tão grande que às vezes se pergunta se seus fundamentos resistirão.
O jovem, tem uma maravilhosa fé em Cristo, porém, cedo ou tarde, talvez até a metade da vida, começa a pensar em seu futuro, em sua carreira, em toda sua posição na vida; e começa a vacilar e duvidar, entra em jogo o processo lento de envelhecimento, e também uma espécie de debilidade – esse é o mundo que dá com ímpeto contra a casa, submetendo-a a prova.
Depois vem o vento. Que quer dizer isto que sopraram ventos? São ataques de Satanás. O diabo tem muitas formas diferentes de nos atacar. Segundo a Palavra de Deus, pode se transformar em anjo de luz e citar a Bíblia. Pode nos separar por meio do mundo. Porém, às vezes nos ataca diretamente; pode lançar-nos dúvidas e negações. Pode nos bombardear com pensamentos sujos, maus, blasfemos. Leiamos as vidas dos santos de outras épocas e encontraremos que se viram submetidos a este tipo de coisas. O diabo promove ataques violentos, para derrubar a casa, por assim dizer, e os santos ao longo dos séculos têm sofrido por causa do poder desta forma de ataque.
Talvez temos conhecido homens bons que se têm visto sujeitos a isto, cristãos excelentes que têm vivido vidas piedosas; então, um pouco antes do fim, talvez no leito de morte, passam por um período de trevas e o diabo os ataca violentamente. Na realidade, “não conhecemos luta contra sangue e carne, senão contra principados, potestades, contra os governadores das trevas deste séculos, contra as hostes espirituais da maldade nas regiões celestes. Em Efésios 6, o apóstolo Paulo nos diz que a única forma de resistir é se revestindo de toda a armadura de Deus. E nesta passagem nosso Senhor diz também somente o fundamento sólido que Ele dá, permitirá que nossa casa resista.    
Estas coisas nos chegam a todos nós. Porém, está claro, em última instância, de forma certa e inevitável, chega a própria morte. Alguns têm que suportar a chuva, outros os rios, e outros os ventos e furacões, porém todos temos que nos encontrar e fazer frente com a morte. Nos chegará a todos de alguma forma e submeterá à prova o próprio fundamento sobre o qual temos edificado.
Como resistimos a estas coisas? Em muitos sentidos, o labor principal da pregação do evangelho é preparar os homens para resistirem a estas coisas. O que importa não é a ideia que se tenha da vida, nem dos sentimentos que tenhamos, se alguém não pode resistir a estas provas que temos enumerado, o fracasso é completo. Sejam quais forem os dons de um homem ou seu chamamento, por mais nobre e bom que seja, se sua ideia e filosofia da vida não o têm provido destas certezas, é um néscio, e tudo o que tem lhe falhará e se derrubará sob seus pés precisamente quando necessita de mais ajuda. Já temos experimentado algumas destas provas.  
Muitos parecem passar muito bem neste mundo, porém, seu final não é em paz. Pobre criatura! Não se tem preparado para isso, não está consciente de que se irá, se agarra ao que seja, e não morre em paz.
Escutemos o Salmo 112.7: “Não terá temor de más notícias; seu coração está firme, confiado em Jeová”. Não tem medo das pestilências, não tem medo de que cheguem as guerras, não tem medo nem sequer das más notícias. Não diz:”que vamos fazer dia após dia?” Nunca – “seu coração está firme, confiando em Jeová”. Escutemos também estas palavras magníficas de Isaías 28.16: “O que crê não se apresse”, ou se preferem: “O que crer não será confundido, o que crer não será apanhado de surpresa”. Por que? Porque tem prestado atenção, vem se preparando, de modo que, seja o que for que lhe chegue, tem fundamento sólido. Não tem pressa, nunca se apressa. Nosso Senhor mesmo o tem ensinado perfeitamente na parábola do semeador. Nos diz que o falso cristão “não tem raiz em si”. Resistiu por um tempo, porém quando chegou a perseguição, tudo se acabou. “O que foi semeado entre espinhos, este é o que ouve a Palavra, porém o afã deste século, e o engano das riquezas sufocam a Palavra, e se faz infrutífera”. O ensino da Escritura a este respeito é interminável.
Isto é algo que se ensina de forma positiva na Bíblia, e que a experiência cristã confirma.
Leiamos o relato daqueles primeiros cristãos que, ao serem perseguidos, e inclusive condenados à morte, davam graças a Deus de que fossem considerados dignos de sofrer por Seu nome.
O ensino, pois, se resume nisto, somente os homens que têm feito estas coisas, das quais nosso Senhor fala no Sermão do Monte, possuem estas experiências. O falso cristão descobre que quando necessita de ajuda, considerava como a fé não lhe ajuda. Lhe abandona quando mais necessita dela. Não há nenhuma dúvida relativamente a isto.  O fator comum na vida de todos os que têm se enfrentado com as provas da vida de forma triunfal e gloriosa, é que têm sido sempre homens que se têm entregado para viver o Sermão do Monte.
Como posso me assegurar de que estou edificando a casa sobre a rocha? Como ponho realmente estas coisas em prática? É a pergunta mais importante deste mundo. Nada há mais vital que recordar diariamente estas coisas. Às vezes creio que não há nada mais perigoso na vida cristã do que uma vida devocional mecânica. Ouço pessoas falarem superficialmente sobre fazer suas “devoções” diárias. Esta atitude superficial, em meu modo de entender, é absolutamente trágica. Significa que a estas pessoas se lhes tem ensinado que é bom para o cristão, como primeira atividade do dia, ler um pouca da Bíblia, e logo oferecer uma oração, antes de ir trabalhar. Alguém cumpre este costume e pronto. Claro que é uma coisa boa, porém pode resultar sumamente perigosa para a vida espiritual, caso se converta em algo puramente mecânico.
Diria pois, que o que se tem que fazer é o seguinte: certamente tem que se ler a Bíblia e orar; porém não numa forma mecânica, não porque se tem dito a alguém que tem que fazê-lo, não porque se espera que se faça. Perguntemo-nos se vivemos o Sermão do Monte, se estamos realmente o vivendo. Não nos falamos a nós mesmos o suficiente; este é nosso problema. Falamos demasiadamente com os demais e não o suficiente conosco.  
Devemos dizer para nós mesmos: “Nosso Senhor pregou este sermão porém de nada nos valeria se não fizermos o que Ele diz”. Ponhamo-nos à prova segundo os ensinos do Sermão do Monte.
Por D. M. Lloyd Jones ( traduzido e adaptado por Silvio Dutra)
D. M. Lloyd Jones
Enviado por Silvio Dutra Alves em 10/06/2014
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