DOMÍNIO PRÓPRIO
“6 E o Senhor disse a Caim: Por que te iraste? E por que descaiu o teu semblante?
7 Se bem fizeres, não é certo que serás aceito? E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo, mas sobre ele deves dominar.” (Gên 4.6,7)
Deus impõe ao homem o dever de ter domínio sobre os seus desejos, isto é, ele deve ter domínio próprio ou auto controle.
A razão disto se deve ao fato de que o homem foi criado para viver e proceder conforme a vontade de Deus, de maneira que não seja e pratique aquilo que seja contrário à Sua vontade divina, isto é, que seja dominado pela força do pecado.
Debaixo de fortes pressões, num mundo dominado por sexo pervertido e lascivo, violência, arrogância, desrespeito, vanglória e toda sorte de circunstâncias contrárias à vontade revelada de Deus em Sua Palavra, a alma piedosa tende a definhar e a ser, ela própria impelida por tais desejos pecaminosos, e então interpõe-se a necessária e obrigatória existência do fruto do Espírito Santo do domínio próprio (Gál 5.22) porque o auto domínio meramente humano não tem o poder de eliminar o desejo senão apenas de abafá-lo.
Daí importa que o espírito humano que é a sede deste domínio próprio, que deve governar os desejos da alma, seja ele próprio dominado pelo Espírito Santo, de maneira que se tenha o governo divino conduzindo o espírito do homem a ter domínio sobre a sua alma em desejos santos e agradáveis a Deus.
Consequentemente não se pode ter uma tal bênção, sem vigilância e oração contínuas que nos mantenham permanentemente na presença de Deus, tendo poder em graça no coração, de forma que este esteja purificado de toda má consciência e formas de impurezas, quer da carne, da alma ou do espírito (II Cor 7.1; Hb 10.22).
Como seria possível alguém manter sua paz de mente e espírito, quando debaixo de uma circunstância contínua difícil e perturbadora, sem estar em plena comunhão com o Espírito Santo? Esta comunhão contínua com o Espírito é necessária porque o domínio próprio que extingue a fonte dos desejos pecaminosos é o próprio Espírito Santo em governo sobre o nosso espírito.
Quando o primeiro homem pecou, toda a humanidade ficou sujeita ao pecado, e este consiste basicamente no governo do espírito (mente, razão, vontade e direção próprias etc) pela alma (instintos, temperamento, afetos, tal como existem nos seres irracionais etc), sendo o corpo físico, particularmente, o veículo da realização destes desejos que são excitados e manifestados principalmente na alma.
Sabemos que é somente o Espírito Santo que pode impedir tanto a excitação quanto a exteriorização destes desejos da alma, tal como o apóstolo afirma em Gál 5.16: “Digo, porém: Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne.”.
Sabemos também que vivemos num mundo de pecado, de trevas, dominado por espíritos malignos, que obviamente não propiciará em nenhum aspecto ou circunstância o cumprimento do propósito eterno de Deus na criação do homem que é o de amá-lO e ao próximo, porque o amor não pratica o mal senão o bem.
Deus é amor, luz, bondade, paz, retidão, e o homem foi criado para ser à Sua imagem e semelhança.
Mas como poderá ter a plenitude de tal imagem e semelhança vivendo sob o domínio dos desejos de uma alma governada pela força do pecado num mundo de pecado?
Vemos que esta tarefa está muito além da capacidade natural humana. Muito além de todo poder terreno que se possa referir. Nenhuma ciência ou prática religiosa poderá dar ao homem a paz e pureza de espírito em bondade, paciência e amor num tal mundo como este que sempre nos submeterá a pressões e aflições decorrentes da manifestação do pecado, quer pela instrumentalidade de homens, quer pela de espíritos malignos que atuam na terra.
Sabendo que por princípio o pecado é a transgressão da lei de Deus, não se pode portanto esperar que a solução para um viver em paz e pureza interior sem se alienar do mundo (porque estamos no mundo) não poderá ser achada em nós mesmos.
Foi imposto a Caim o dever de dominar o seu desejo de matar o seu irmão, mas ele não poderia ter a eliminação da sua ira e do próprio desejo, sem se sujeitar em obediência à vontade de Deus, de maneira que pudesse receber a graça do Espírito, quando se dispusesse a fazer aquilo que era certo (segundo a vontade de Deus) para ser aceito, tal como fora o seu irmão Abel.
Sem esta assistência do Espírito Santo o espírito humano poderá conter o desejo maligno mas não eliminá-lo, porque a carne (natureza terrena) não está naturalmente sujeita à vontade de Deus e nem mesmo pode estar; isto é, o poder natural nada poderá fazer no sentido de vencer as forças espirituais contrárias à perfeita santidade de Deus, e cooperar com o trabalho da graça para implantar tal santidade em nós.
É preciso pois estar efetivamente sujeito a Deus em espírito, permitindo assim que o Espírito Santo esteja de fato sob o controle e governo da nossa própria vontade, de maneira que não a nossa, mas a vontade de Deus revelada na Palavra, prevaleça no nosso viver, conforme sejamos capacitados pela instrução, direção e poder do Espírito Santo.
Sem domínio próprio o homem será o agente da sua própria destruição.
Seu corpo transformará em doenças as suas ansiedades e toda sorte de descontroles que são originados pelos desejos pecaminosos de sua alma.
E a própria alma enfermará em sua falta de paz e domínio pelo espírito, que a conduziria a fazer aquilo que é segundo a vontade de Deus, de maneira a se ter uma boa consciência, que não teria mais como agir como um juiz inflexível em acusações disparadas contra o seu mau procedimento em palavras, pensamentos e ações.
Somente quando o Espírito Santo governa o espírito humano e este por sua vez governa a alma, é que há paz na casa que é o corpo do homem.
E isto independe de circunstâncias, conforme bem o demonstra a experiência dos homens santos de Deus na Bíblia, que permaneceram com paz em suas mentes e corações nas prisões (Paulo), na fornalha ardente (Sadraque, Mesaque e Abdnego), na cova dos leões (Daniel), e em tantos outros exemplos que estão registrados na Palavra.
Eles mantinham comunhão contínua com o Senhor, e por isso tinham o fruto do Espírito Santo do domínio próprio, que era o segredo da paz e calma que eles revelaram na hora da tribulação.
Quando o amor de Deus não prevalece nos nossos corações a tendência natural é a da auto destruição e também da destruição mútua na igreja.
Tal como estava ocorrendo na Igreja da Galácia, porque eles estavam seguindo o pendor da carne e não o do Espírito Santo, assim o que prevalecia entre eles eram as obras da carne e não o fruto do Espírito.
Daí a razão da exortação do apóstolo Paulo a eles de que não vivessem apenas no Espírito mas que caminhassem diariamente em comunhão com o Espírito para que pudessem ter o Seu fruto, que é o único meio pelo qual podemos viver de modo agradável a Deus e a nós mesmos, por não sermos dominados pelos nossos desejos pecaminosos, mas pela boa, perfeita e agradável vontade de Deus.
Sem este princípio da graça operando continuamente no coração nós não podemos fazer aquilo que deveríamos fazer e conforme nos é exigido por Deus na Sua Palavra.
Ao contrário, quem dominará serão sempre os desejos pecaminosos porque não terão um controle sobre eles exercido pelo Espírito Santo.
Vemos assim quão importante, vital e crucial é para o cristão não entristecer e apagar o Espírito Santo com a prática contínua e deliberada do pecado, porque este inimigo mortal ficará em plena liberdade de ação pela ausência do único poder que pode vencê-lo, a saber, a graça de Jesus que opera pelo Espírito.
Sabendo que a carne luta contra o Espírito porque sabe intuitiva e instintivamente que é Ele o único poder que pode dominá-la, cabe então ao cristão o dever de vigiar e orar constantemente para que a carne seja trazida em sujeição ao Espírito, para ser progressivamente mortificada, de maneira que a carne fique cada vez mais fraca, e a graça cada vez mais forte.
À medida que este trabalho de crescimento na graça e no conhecimento de Jesus vai progredindo, o cristão perceberá que se cumprirá também em sua vida a experiência do apóstolo Paulo de estar crucificado para o mundo e o mundo para ele, de maneira que não exercerá mais nenhum atrativo sobre a alma, em devaneios, ilusões, paixões, por coisas que são enganosas, aparentes, passageiras, e que não podem de modo algum ser em qualquer grau, o objetivo pelo qual vivamos, porque toda a vida que temos na carne é para ser vivida para Deus e não para a satisfação dos nossos desejos, que ainda que sendo lícitos, poderão colidir com a vontade de Deus e impedir-nos de fazê-la, seja em cumprimento do que está revelado na Palavra, ou que tenha sido determinado por Ele direta e pessoalmente a nós, especialmente nas coisas que se referem ao cumprimento do ministério que Ele nos tiver designado para cumprir.
A Palavra de Deus nos ordena portanto o dever de vigiar, orar e lutar para que os desejos da carne sejam vencidos pelo exercício do nosso domínio próprio.
Não permitiremos que nada além do Espírito de Deus e da Palavra do Senhor, nos domine. Nem sequer a nossa própria vontade que está contaminada pelo pecado e sujeita ao seu domínio.
Nossos desejos naturais que se transformam em paixões, devem ser dominados. E isto não pode ser feito sem o fruto do domínio próprio do Espírito Santo.
Em Gál 5.23 a palavra para domínio próprio no original grego é egkrateia, que significa auto (eg) controle, domínio, governo (krateia).
Literalmente poderia ser traduzido como controle, domínio ou governo do ego.
A suma de tudo o que temos dito, pela própria Palavra, é que deve existir uma completa consagração ao Senhor, não meramente em pensamento, mas de fato e de verdade, numa vida de efetiva vigilância espiritual e oração contínuas, em aplicação da Palavra de Deus à vida pelo Espírito, porque sem isto, como vimos antes, quem terá sempre o domínio serão os desejos corrompidos da alma e não o nosso espírito, estando ele próprio, purificado pela presença e poder operativo e atuante do Espírito Santo de Deus.
Estas paixões da alma devem ser submetidas à crucificação por causa do princípio do pecado que opera na carne – natureza terrena decaída, onde residem todos estes desejos pecaminosos.
Mortificar a carne é o dever de todo cristão porque foi crucificado juntamente com Cristo, e consequentemente morreu para o pecado para poder viver em novidade de vida para Deus.
“E os que são de Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e concupiscências.” (Gál 5.24).
Ser cristão significa ser transformado progressivamente pelo poder da graça à imagem e semelhança de Jesus, e estar numa aliança com Deus para a santificação total de corpo, alma e espírito (I Tes 5.23).
Não cabe portanto qualquer dúvida quanto a ser um dever de todo cristão a mortificação da carne, para um progressivo e cada vez maior revestimento de Cristo (Rom 13.14).
Assim, não é bastante que deixemos de praticar o mal, porque é também necessário aprender a fazer aquilo que é bom e agradável a Deus.
O cristianismo não somente nos obriga a mortificar o pecado mas também a viver em retidão; não somente a nos opormos às obras da carne, mas também produzir o fruto do Espírito.
“Como a cidade derrubada, sem muro, assim é o homem que não pode conter o seu espírito.” (Pv 25.28)
“Melhor é o que tarda em irar-se do que o poderoso, e o que controla o seu espírito do que aquele que toma uma cidade.” (Pv 16.32)
Silvio Dutra Alves
Enviado por Silvio Dutra Alves em 30/06/2014