O Respeito Devido às Autoridades Constituídas por Deus
A narrativa que encontramos no 16º capítulo do livro de Números sobre a rebelião de Coré, Datã e Abirão, talvez seja o maior exemplo que temos na Bíblia quanto ao ensino do princípio relativo ao respeito às autoridades que são constituídas por Deus.
Estas autoridades são constituídas para o nosso próprio bem, e, portanto, quando nos opomos a elas estamos resistindo ao próprio Deus, e nos privando de um viver abençoado, por não honrarmos e termos em alta estima aqueles que Ele chama para gastarem as suas vidas para intercederem por nós, para nos ensinarem a andar nos Seus caminhos, e que são levantados como modelos de vida e de fé que devemos imitar.
Muito desta resistência às autoridades constituídas por Deus é motivada por inveja, por cobiça e por outros sentimentos malignos que não provêm de modo algum daquilo que é devido à santidade e a uma vida verdadeiramente piedosa.
Isto foi o que sucedeu com Coré, que era também um coatita, da tribo de Levi, assim como Moisés e Arão.
Certamente ele estava pensando em tomar o sumo sacerdócio de Arão para si, e a posição de liderança de Moisés para Elisafã, o príncipe líder dos coatitas (Nm 3.30), e para buscar apoio político aliou-se a Datã e Abirão, príncipes da tribo de Rúben, e juntamente com estes estavam associados outros 250 príncipes de Israel, que eles haviam conseguido atrair para a sua causa, mas não há dúvida que Coré era o líder daquela rebelião, conforme citado em Judas 11, em relação aos falsos mestres que intentavam tomar o lugar da liderança dos apóstolos, referindo-se a eles nos seguintes termos:
“Ai deles! porque foram pelo caminho de Caim, e por amor do lucro se atiraram ao erro de Balaão, e pereceram na rebelião de Coré.” (Jd 11).
Assim a insatisfação manifesta de um só homem revelaria a de muitos outros e lhes traria destruição. Daí se dizer “a rebelião de Coré.”
É preciso ter muito cuidado com aqueles que nos apresentam argumentos convincentes que parecem ser para o nosso bem e liberdade, e que no final acabam nos conduzindo a caminhos de morte, por nos levarem a confrontar a vontade do próprio Deus.
Eles devem ter prometido ao povo que os libertaria dos pesados mandamentos da lei de Moisés e da inflexibilidade dos seus juízos, como o que havia sido proferido sobre o homem que havia catado lenha num dia de sábado, e que fora morto por apedrejamento.
Eles hastearam a bandeira da igualdade, proclamando que todos eram santos em Israel e tinham o direito de exercer a liderança pela escolha do povo.
A causa estava quase ganha, na perspectiva deles, porque naquela conspiração, que deve ter sido montada astuciosamente, longe das vistas de Moisés e Arão, haviam conseguido juntar um grande número de aliados, dos quais a Palavra nos dá conta de serem “duzentos e cinquenta homens dos filhos de Israel, príncipes da congregação, chamados à assembleia, varões de renome;” (Nm 16.2).
Por influência destes líderes a insatisfação de toda a congregação foi revelada e manifestada, pois a causa deles era também a sua, porque queriam liberdade para fazerem o que era da própria vontade, contra a ordenança expressa de Deus para eles de que deveriam “lembrar de todos os mandamentos do Senhor, e os observarem; para que não se deixassem arrastar pela infidelidade dos seus corações ou pela sua vista, como antes o faziam”, conforme está registrado no final do décimo quinto capítulo de Números.
Havia, portanto uma batalha declarada da parte de Deus contra eles, da Sua santidade contra a carnalidade dos israelitas.
A luta do Espírito contra a carne estava aqui bem representada.
A natureza terrena nos puxando para baixo, e a vontade do Senhor tentando nos puxar para cima.
Israel teria que pagar um preço elevado em vidas, até que aprendesse quão dura coisa é resistir contra a vontade do Senhor.
O que fez Moisés diante do protesto deles?
Mais uma vez ele se prostrou com o rosto em terra (v.4), procurando alento e instrução no Senhor.
Ele teria resignado humildemente ao seu cargo se fosse esta a vontade de Deus.
Ele estava constrangido em seu espírito em ter que obedecer ao Senhor, assim como Davi em seu reinado e Paulo em seu apostolado.
Eles não se tinham feito líderes, reis, apóstolos, senão pelo Senhor que os havia chamado.
Do mesmo modo não foi Moisés quem indicou Arão e sua família para o sacerdócio, mas o próprio Deus.
Certamente que isto era um grande privilégio, mas antes de tudo era uma tremenda responsabilidade que eles carregavam sobre os seus ombros, e que lhes fora imposta pela vontade do Senhor.
A demanda de Coré, Datã e Abirão não era, pois contra Arão e Moisés, e sim contra o próprio Deus, e por isso, foi nEle que Moisés foi buscar resposta para aquela situação.
Ele a recebeu, e transmitiu a Coré e aos que o acompanhavam na sua rebelião o que deveriam fazer na manhã do dia seguinte, para que o Senhor confirmasse quem havia escolhido para o sacerdócio.
Eles deveriam acender incensários diante do Senhor no tabernáculo, e Deus indicaria a quem escolheria dentre eles.
Após tê-los repreendido pelo fato de estarem buscando o sacerdócio, rebelando-se contra a vontade de Deus e contra Arão, mandou chamar Datã e Abirão, mas estes se recusaram a ir ter com ele, e disseram que lhes havia feito retornar de uma terra que manava leite e mel para matá-los no deserto, e assim contestaram com que direito Moisés queria se fazer príncipe sobre eles.
E disseram ainda expressamente o seguinte:
“Ademais, não nos introduziste em uma terra que mana leite e mel, nem nos deste campos e vinhas em herança; porventura cegarás os olhos a estes homens? Não subiremos.” (v. 14).
Aqui eles revelaram que almejavam somente a herança.
Eles não queriam ao Deus da herança e nem a Sua vontade.
Tal como muitos esperam ir para o céu sem Jesus Cristo e sem cumprir a Sua vontade.
Datã e Abirão estavam alegres no meio do povo enquanto tinham a esperança de lançar logo mão nos bens prometidos na terra de Canaã, mas era algo muito insuportável para eles terem que peregrinar no deserto, com a sentença de não entrarem na terra por causa da sua incredulidade.
A sandália dos pés dos israelitas não se gastou naqueles quarenta anos de peregrinação, Deus não deixaria de lhes fazer o bem, se tão somente guardassem os Seus mandamentos, mas eles não queriam saber de fidelidade senão fazer o que era da própria vontade.
Eles tinham fixado um alvo e não queriam pagar o preço e assumir a responsabilidade que seria necessária para atingir aquele alvo, e agora se queixavam de não terem entrado na posse das coisas que eles próprios haviam desprezado.
A ira de Moisés se acendeu quando Datã e Abirão alegaram que ele havia se constituído num líder ambicioso e autoritário sobre eles, e quanto a isto não prostrou seu rosto em terra, mas pediu a Deus que defendesse a sua integridade; considerando que eles o acusaram de ser ambicioso, cobiçoso, e opressivo, fazendo-se um príncipe sobre eles, pois Deus era sua testemunha que nunca havia adquirido qualquer coisa deles, nem mesmo um jumento, nem nunca havia usado de suborno e extorsão, e não vivia com os tributos devidos a um príncipe.
Quando Coré se apresentou com os duzentos e cinquenta príncipes, e Arão, todos eles com os seus incensários, ele fez ainda uma agitação da congregação contra Moisés e Arão, à porta do tabernáculo, e isto fez com que a glória do Senhor aparecesse a toda a congregação, não para alegria deles, mas para convencimento de que o que aconteceria viria da parte dEle e não do homem, e aquela glória era glória de juízo e não de salvação, pronta a destruí-los, pois mais uma vez o Senhor disse a Moisés para se apartar da congregação de Israel, porque os consumiria a todos num só momento (Nm 16.21).
Mas novamente Moisés intercedeu em favor deles, para que lhes perdoasse, sob a alegação que não deveriam ser destruídos por causa do pecado de um só homem (v.22).
As massas, muitas vezes são dadas a seguir ignorante e impensadamente as bandeiras de promessas que algumas lideranças desviadas lhes apresentam.
Assim como nos dias de Jesus gritavam para que fosse crucificado por terem sido emuladas a isto pelos líderes de Israel, e nisto, Moisés agiu como tipo de Jesus, que rogaria ao Pai para que lhes perdoasse, por não saberem o que faziam, isto é, agiam por ignorância de tudo o que estava realmente envolvido em Sua morte pelas intenções invejosas e políticas dos líderes de Israel, e muito menos sabiam do significado de que naquela morte estava a única esperança da salvação das suas almas.
Mas a ira de Deus permanece sobre aqueles que não se arrependem dos seus pecados, ainda que os poupe temporariamente, por causa da Sua longanimidade, na expectativa de que venham a se arrepender e assim alcancem a vida eterna.
Contudo, no caso de Coré, Datã e Abirão, trouxe-lhes um juízo inaudito, de modo que ficasse claro para todos os israelitas, qual é o fim daqueles que se opõem à Sua vontade e se rebelam contra Ele.
Datã e Abirão haviam se recusado a ir ter com Moisés, este foi ter com eles, e foi ordenado por Deus que toda a congregação saísse das proximidades das tendas daqueles homens ímpios, para que não fossem consumidos juntamente com eles, por causa dos seus pecados (v. 26).
E, disse a todos que caso eles morressem de um modo comum, o Senhor não o teria enviado, mas se eles morressem de uma forma inaudita, com a terra abrindo a sua boca e lhes tragando com tudo o que lhes pertencia, descendo vivos ao Seol, então compreenderiam o quanto aqueles homens haviam desprezado o Senhor (v. 27-30).
Mal acabou de falar, a terra que estava debaixo deles se fendeu e os tragou com as suas famílias, como também a todos os homens que pertenciam a Coré, e a toda a sua fazenda, e a terra os cobriu. Vendo isto os israelitas fugiram pelo temor de serem também tragados (v. 34).
É provável que quando a terra se abriu para engolir Datã e Abirão e tudo que lhes pertencia, que o fogo procedente do Senhor consumiu os duzentos e cinquenta homens que ofereciam o incenso diante do tabernáculo, tendo sido deixado com vida dentre os que ofereciam o incenso, apenas Arão (v. 35).
Deus fizera a seleção e confirmação do seu escolhido de um modo excepcional, pois eliminou todos aqueles que não deveriam assumir o sacerdócio, consumindo-os com o fogo, em razão de terem feito aquilo que não lhes era lícito fazerem, e que não temeram sequer fazer, isto é, queimar incenso, função exclusiva dos sacerdotes, e eles descaradamente se apresentaram para fazer o que não deveriam de modo nenhum fazer.
Sempre que alguém tentar usurpar a função que foi designada por Deus a outro, esta pessoa terá que arcar com as consequências da sua presunção.
Deus revelou que é um fogo consumidor, que queima toda rebelião que se levante contra a Sua vontade.
Deus ordenou que se fizesse daqueles duzentos e cinquenta incensários de bronze, chapas para cobrirem o altar do holocausto, de forma que servissem de sinal para os israelitas, no sentido de que nenhum estranho, senão da descendência de Arão se aproximasse do Senhor para queimar incenso (v. 36-40).
Mas o que era esperado aconteceu, porque toda a congregação de Israel tinha se identificado com a causa dos rebeldes, e assim, no dia seguinte murmuraram contra Moisés e Arão lhes acusando de serem os culpados da morte daqueles homens, só que em vez de lhes dar o título apropriado de rebeldes, referiram-se aos mesmos como “o povo do Senhor”.
Mais uma vez a nuvem cobriu o tabernáculo e a glória do Senhor apareceu, e tendo Moisés e Arão vindo à frente do tabernáculo Deus disse a Moisés que saísse do meio deles, porque os consumiria num só momento.
Moisés e Arão caíram com o rosto em terra, e dessa vez Moisés nem teve tempo para interceder junto ao Senhor porque Ele fizera irromper uma grande praga entre o povo, então Moisés ordenou a Arão que pegasse o seu incensário e queimasse incenso nele com o fogo do altar, e que fizesse expiação com aquele incenso sobre toda a congregação, porque a sua intercessão como sumo sacerdote por eles seria a única forma de fazer cessar aquela praga, que se não fosse detida, consumiria toda a congregação de Israel.
Nós estamos observando que o caráter da ordenança para que não murmuremos, constante de I Cor 10.10, seguindo o exemplo dos israelitas: “E não murmureis, como alguns deles murmuraram, e pereceram pelo destruidor”, se refere não somente à insatisfação e queixa nas provas a que somos submetidos pela vontade de Deus, como também a este espírito de rebelião, especialmente contra aqueles que têm sido constituídos pelo Senhor como líderes sobre as nossas vidas.
Tendo Arão obedecido a Moisés, a praga cessou, mas não sem antes ter matado a 14.700 pessoas, sem contar os que haviam sido mortos antes, por causa da rebelião de Coré (v 41-50).
É por causa da oração do nosso Sumo Sacerdote, da qual o incenso de Arão era figura, que não somos consumidos pelos juízos de Deus, em razão dos nossos pecados.
Jesus intercede à direita do Pai como nosso Advogado, e ainda que não fôssemos condenados eternamente, por estarmos debaixo da cobertura do Seu precioso sangue, no entanto, poderíamos ser visitados com muitos julgamentos de Deus, por causa dos nossos pecados.
A nossa confissão e arrependimento são aceitáveis a Deus, porque temos a Jesus intercedendo por nós à Sua direita, dia e noite, como nosso Advogado e Sumo Sacerdote.
Por isso foi revelado a Moisés, naquela ocasião, que somente a intercessão de Arão, na condição de sumo sacerdote de Israel poderia livrar o povo do castigo determinado contra os seus pecados, para que servisse de figura desta intercessão eficaz que é feita por Jesus em nosso favor, e por causa da qual não somos consumidos.
Por isso somos lembrados pelo apóstolo, que sempre que viermos a pecar eventualmente, devemos confessar os nossos pecados, sabendo que temos um Advogado junto ao Pai (I Jo 2.1).
Também nisto todos os ministros do Senhor devem ser seus imitadores, e seguirem também o bom exemplo de Arão, que estava intercedendo em favor daqueles que o odiavam e invejavam.
Deus estava confirmando a chamada de Arão para o sumo sacerdócio, revelando a Israel, que assim como fizera com o rei Davi, fizera a escolha por conhecer o coração, e não pela aparência exterior, por saber que Arão tinha um amor verdadeiro pelo seu povo, e que tinha um coração misericordioso, que se compadecia daqueles que estavam debaixo do seu cuidado, e demonstrou isto intercedendo e agindo pelo bem daqueles que estavam buscando o seu mal.
É da natureza do Senhor que a misericórdia sempre triunfe no juízo, e que no juízo Ele sempre se lembre da misericórdia, porque a glória do Senhor está em ser bondoso, misericordioso e perdoador, pois não tem prazer na morte dos ímpios, senão que se convertam e vivam, e até mesmo quando está exercendo juízos em Sua ira contra o pecado, a oração detém o juízo, porque Deus se lembra da misericórdia em plena manifestação da Sua ira.
Foi por pura misericórdia que Ele fez cessar a praga com a intercessão de Arão, porque não se fala em qualquer ponto das Escrituras, que os israelitas haviam se arrependido das suas rebeliões e da sua injustiça, quando canonizaram os rebeldes Coré, Datã e Abirão, bem como os duzentos e cinquenta rebeldes, ao mesmo tempo em que acusavam Moisés e Arão de assassinos do povo do Senhor.
Assim, revelou-se que a misericórdia do Senhor é a causa de não sermos consumidos, até porque, por um só pecado, ao curso de toda a nossa vida, já seríamos merecedores da morte e da condenação eternas.
Nunca é demais lembrar que por um só ato de injustiça (de Adão) muitos se tornaram pecadores e toda a criação ficou sujeita à vaidade.
Tudo morre no mundo por causa daquele único pecado original de Adão, e se Deus intervém dando graça e vida a pecadores, sem que o mereçam, é então por pura misericórdia.
Todavia, estes que são salvos pela misericórdia devem andar com temor e tremor diante do Senhor, com verdadeira humildade prática diante dEle, por obedecerem a tudo que lhes é ensinado por aqueles que Ele tem levantado para dirigir o Seu povo. Foi nesse sentido que Jesus afirmou expressamente que todo aquele que rejeita e resiste àqueles que são por Ele enviados a pregar e ensinar o evangelho. resistem não propriamente a eles, mas Àquele que os enviou, e Deus haverá de julgá-los por Sua rebelião, assim como podemos aprender do exemplo do que fizera com Datã, Coré, Abirão e todos que os seguiram na sua loucura de desprezar a autoridade de Deus.