Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos
Comentário de I Tessalonicenses 2.16
Por João Calvino
“E nos impedem de pregar aos gentios as palavras da salvação, a fim de encherem sempre a medida de seus pecados; mas a ira de Deus caiu sobre eles até ao fim.” (I Tessalonicenses 2.16)
“Que nos impedem de pregar aos gentios”. Não é sem um bom motivo que, conforme foi observado, ele entra em tantos detalhes ao expor a malícia dos judeus. Como eles se opunham furiosamente ao evangelho em toda a parte, surgia disto um grande obstáculo, mais especificamente quando exclamavam que o evangelho era profanado por Paulo, quando o publicava entre os gentios. Por esta calúnia eles causavam divisões nas igrejas, tiravam dos gentios a esperança da salvação, e obstruíam o progresso do evangelho. Paulo, portanto, acusa-os deste crime – de que viam a salvação dos gentios com inveja, mas acrescenta que as coisas são assim para que a medida dos seus pecados se encha, a fim de remover deles toda a reputação de piedade; assim como, ao dizer antes que eles não agradavam a Deus (1 Ts 2:15), ele queria dizer que eram indignos de serem considerados entre os adoradores de Deus. Contudo, deve-se observar o modo de expressão, implicando que aqueles que perseveram em um caminho mau enchem deste modo a medida do seu juízo, até que façam dela um montão. Este é o motivo pelo qual o castigo dos ímpios é geralmente adiado – porque suas impiedades, por assim dizer, ainda não estão maduras. Através disto somos alertados de que devemos ter toda a cautela para que não ocorra que, acrescentando, de tempo em tempo, pecado a pecado, como geralmente acontece, o montão finalmente chegue até o céu.
“Mas a ira caiu”. Ele quer dizer que eles se encontram em um estado absolutamente desesperado, porquanto são vasos da ira do Senhor. “A justa vingança de Deus os oprime e os persegue, e não os deixará até que pereçam – como é o caso com todos os réprobos, que correm precipitadamente para a morte, para a qual estão destinados”. Contudo, o apóstolo faz esta declaração quanto a todo o corpo do povo, de tal modo a não privar os eleitos de esperança. Pois, como a maior parte resistiu a Cristo, ele fala, é verdade, de toda a nação em geral; mas devemos ter em vista a exceção que ele mesmo faz em Rm 11:5 – de que o Senhor sempre terá alguma semente remanescente. Devemos sempre ter em vista o propósito de Paulo – de que os fiéis devem cuidadosamente evitar a associação com aqueles que a justa vingança de Deus persegue, até que pereçam em sua obstinação cega. Ira, sem qualquer termo adicional, significa o juízo de Deus, como em Rm 4:15 – a lei opera a ira; também em Rm 12:19 – não deis lugar à ira.
(Nota do Pr Silvio Dutra: Tomemos por assentado, que nesta dispensação da graça, que tem durado desde a morte e ressurreição de Jesus, que a nenhuma pessoa, e a nenhuma instituição tem sido dado por Deus, que em nome da religião, se faça acepção, ou injúria, maldição ou condenação de quem quer que seja, e muito menos que se use de violência seja ela moral ou física em nome de se defender a santidade e justiça de Deus. Ao contrário é ordenado aos que amam e conhecem a Deus em espírito, que amem a todos, inclusive a seus inimigos, e que perdoem e bendigam os que lhes amaldiçoam, injuriam ou perseguem.
Quando encontramos em comentários bíblicos o terrível destino que está reservado àqueles que se opuserem a Deus até o final de suas vidas, como vemos por exemplo não apenas nos comentários de Calvino, mas nos de todos aqueles que são fiéis à pregação e ensino da verdade revelada nas Escrituras, o que se tem em foco não é uma ameaça ou um aborrecimento declarado da parte de homens, senão um alerta misericordioso da parte do próprio Deus, que é quem o afirma, pela boca dos seus ministros o que há de suceder no dia do juízo final, de modo que pelo arrependimento, possam se converter e serem livrados da condenação.)
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João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 04/09/2014