Comentário de I Tessalonicenses 4.16
Por João Calvino
“Porque o Senhor mesmo descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro.
“Porque o Senhor mesmo”. Ele emprega o termo keleusmatos (alarido), e depois acrescenta: a voz do arcanjo, a propósito de explicação, sugerindo qual deva ser a natureza desse alarido despertador – que o arcanjo desempenhará o ofício de uma arauto, convocando os vivos e os mortos para o tribunal de Cristo. Pois, embora isto será comum a todos os anjos, como é de costume entre diferentes escalões, ele designa um no primeiro lugar que assume o comando dos outros. Quanto à trombeta, porém, deixo para outros disputarem com maior sutileza, pois não tenho nada a dizer em acréscimo ao que observei brevemente na Primeira Epístola aos Coríntios. O Apóstolo sem sombra de dúvida não tinha nada mais em vista aqui do que dar um gosto da magnificência e venerável aparição do Juíz, até que a contemplemos plenamente. Com este gosto, convém-nos ficar, enquanto isso, satisfeitos.
“Os que morreram em Cristo”. Ele afirma novamente que os que morreram em Cristo, ou seja, que estão incluídos no corpo de Cristo, ressuscitarão primeiro, para que saibamos que a esperança da vida está depositada no céu para eles não menos do que para os vivos. Ele nada diz quanto aos réprobos, porque isto não serviria à consolação dos piedosos, da qual agora está tratando.
Ele afirma que aqueles que estiverem vivos serão juntamente arrebatados com eles. Quanto a estes, não faz menção da morte; por isso, parece que ele pretendia dizer que seriam isentos da morte. Aqui Agostinho se dá a muitas angústias, tanto no livro vinte sobre a Cidade de Deus, como na sua Resposta a Dulcitius, porque Paulo parece se contradizer, quando diz em outra parte que a semente não pode nascer se primeiro não morrer (1 Co 15:36). Contudo, a solução é fácil, porquanto uma súbita mudança será como a morte. É verdade que a morte ordinária é a separação da alma do corpo; mas isto não impede que o Senhor destrua em um momento esta natureza corruptível, criando-a de novo pelo seu poder, pois assim se cumpre o que o próprio Paulo ensina que deve acontecer – que a mortalidade será tragada pela vida (2 Co 5:4). O que é declarado em nossa Confissão, que “Cristo será o Juíz dos vivos e dos mortos”, Agostinho admite ser verdadeiro sem uma figura. Ele está perdido somente quanto a isto – como aqueles que não tendo morrido ressuscitarão novamente. Mas, conforme eu disse, é uma espécie de morte, quando esta carne é reduzida a nada, assim como agora está sujeita à corrupção. A única diferença é que aqueles que dormem se despem da substância do corpo por um período de tempo, mas aqueles que serão subitamente transformados não se despirão de nada senão da qualidade.
João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 05/09/2014
Alterado em 05/09/2014