Comentário de Efésios 1.3
Por João Calvino
“Efs 1:3 Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo,”
“Bendito seja Deus”. O apóstolo enaltece sublimemente a graça de Deus para com os efésios, buscando incitar seus corações à gratidão com o fim de deixá-los todos inflamados, e assim invadi-los e enchê-los com essa ideia. Aqueles que reconhecem em si mesmos uma efusão tal da bondade de Deus, tão plena e absolutamente perfeita, e que se exercitam nela com fervorosa meditação, jamais abraçarão novas doutrinas, as quais obscurecem a própria graça que sentem tão poderosamente em seu interior. O propósito do apóstolo, portanto, ao afirmar a imensurabilidade da graça divina para com os efésios, era prepará-los a fim de que não permitissem que sua fé fosse abalada pelos falsos apóstolos, como se seu chamamento fosse algo duvidoso, ou como se sua salvação devesse ser vista por outro prisma. Ele lhes assegura, ao mesmo tempo, que a plena certeza da salvação consiste no fato de que, através do evangelho, Deus revela, em Cristo, seu amor para conosco. A fim de confirmar, porém, a questão mais plenamente, ele chama sua atenção para a causa primeira, para a fonte, ou seja, a eterna eleição divina, por meio da qual, antes que houvéssemos nascido, fomos adotados como filhos. E isso para que soubessem eles [e nós!] que já estavam salvos, não por meio de qualquer ocorrência fortuita ou prevista, mas por meio do eterno e imutável decreto de Deus.
O verbo abençoar é aqui usado em mais de um sentido, tanto em se referindo a Deus como em se referindo aos homens. Encontro na Escritura uma quádrupla significação para ele. Bendizemos a Deus quando O louvamos, declarando Sua bondade. Diz-se, porém, que Deus nos abençoa, quando Ele torna nossas atividades bem sucedidas, e em Sua benevolência nos concede felicidade e prosperidade; e a razão é que somos abençoados unicamente em Seu beneplácito. Notemos como ele expressa o grande poder que habita em toda a Palavra de Deus para a Igreja e para cada crente individualmente. Os homens abençoam uns aos outros através da oração. A bênção sacerdotal é mais do que uma oração, visto ser ela um testemunho e garantia da bênção divina; porquanto os sacerdotes receberam a incumbência de abençoar no Nome do Senhor. Portanto, Paulo, aqui, bendiz a Deus com uma confissão de louvor, porque Deus nos abençoou, ou seja, nos enriqueceu com toda sorte de bênção ou graça.
Não faço objeção alguma contra a observação de Crisóstomo, quando ele diz que a palavra “espirituais” traça um contraste implícito entre a bênção de Moisés e a de Cristo. A lei continha suas bênçãos, mas é só em Cristo que a perfeição é encontrada, porquanto é Ele a perfeita revelação do reino de Deus, que nos conduz diretamente ao céu. Quando a própria substância é revelada, as figuras não são mais necessárias.
Quando ele diz celestiais, pouco importa se antepomos “lugares” ou “benefícios”. Ele simplesmente desejava expressar a superioridade daquela graça que nos é concedida através de Cristo; que sua felicidade não está neste mundo, e, sim, no céu e na vida eterna. A religião cristã, sem dúvida, como ensinamos alhures [1 Timóteo 4:8], contém promessas não só referentes à vida futura, mas também com referência à vida presente; seu alvo, porém, é a felicidade espiritual, quanto mais sendo o reino de Cristo espiritual. O apóstolo contrasta Cristo com todos os símbolos judaicos, nos quais está contida a bênção sob o regime da lei. Porque, onde Cristo se faz presente, todas aquelas coisas se fazem supérfluas.
João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 07/09/2014