Abençoar quem Amaldiçoa
Por João Calvino
“abençoai os que vos perseguem, abençoai e não amaldiçoeis.” (Romanos 12.14)
“Abençoai, etc”. Eu gostaria, de uma vez por todas, lembrar ao leitor, que o apóstolo Paulo não está buscando escrupulosamente uma ordem precisa quanto aos preceitos aqui estabelecidos neste 12º capítulo de Romanos, senão que devemos nos contentar em ter preceitos curtos, desconexos, embora adequados para a formação de uma vida santa, tal como são deduzidos a partir do princípio que o apóstolo afirma no início do capítulo.
Ele daria presentemente uma direção relativa à retaliação das injúrias que podemos sofrer: mas aqui ele exige algo ainda mais difícil, - que não devemos imprecar males sobre os nossos inimigos, mas desejar e orar a Deus para tornar todas as coisas prósperas para eles, por mais que eles possam nos perseguir e cruelmente nos tratar; e esta bondade, por ser muito difícil de ser praticada, devemos, portanto, com o desejo mais intenso lutar por isto; porque o Senhor nada ordena, em relação ao que ele não exige a nossa obediência; nem há qualquer desculpa para ser autorizada, se estamos destituídos daquela disposição, pela qual o Senhor deseja que seu povo seja diferente dos ímpios e dos filhos deste mundo.
Árduo é isto, eu admito, e totalmente contra a natureza do homem; mas não há nada muito árduo para ser superado pelo poder de Deus, que nunca nos faltará, desde que não deixemos de procurar por isto. E mesmo que você possa dificilmente encontrar alguém que tenha feito tais avanços na lei do Senhor, que ele cumpra esse preceito, ainda assim ninguém pode afirmar que é filho de Deus ou se gloriar no nome de um cristão, que não tenha em parte atingido esta mente, e que não resista diariamente à disposição oposta.
Eu disse que isso é mais difícil do que deixar a vingança quando alguém é injuriado, porque embora alguns retenham suas mãos e não são conduzidos pela paixão de fazer o mal, eles ainda desejam que alguma calamidade ou perda acontecesse, de alguma forma, aos seus inimigos; e, mesmo quando eles são pacificados a ponto de não desejarem o mal, há ainda quase um em cada cem que deseja o bem àqueles dos quais recebeu injúrias; ou melhor, a maioria dos homens ousadamente explodem em imprecações. Mas Deus, por sua palavra, não somente restringe as mãos de fazer o mal, como também domina os sentimentos amargos interiores; e não somente isso, senão que faz com que sejamos solícito para o bem-estar daqueles que injustamente nos incomodam e buscam a nossa destruição.
Erasmo estava enganado quanto ao significado do verbo γεῖν - abençoar; porque ele não percebeu que ele se opõe a praguejar e amaldiçoar; porque Paulo tinha Deus em ambos os casos para ser uma testemunha da nossa paciência, e ver que não somente somos freados em nossas orações quanto à violência de nossa ira, como também mostrar compaixão por orar por perdão para aqueles que, dentre os nossos inimigos nos afligem; quando eles deliberadamente arruínam a si mesmos.
Traduzido e adaptado por Silvio Dutra.
João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 10/09/2014