Legado Puritano
Quando a Piedade Tinha o Poder
Textos

 

“Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um, individualmente".

"Porque, assim como o corpo é um e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, constituem um só corpo, assim também com respeito a Cristo".

"Pois, em um só Espírito, todos nós fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos nós foi dado beber de um só Espírito".

"Porque também o corpo não é um só membro, mas muitos”. [I Coríntios 12: 11-14]


Crer que devemos ser dirigidos, somente pelo que dita a nossa consciência pode parecer um bom e correto critério, para se viver de modo santo e agradável a Deus. Todavia, dizemos parecer, e não ser, porque o único critério infalível pelo qual devemos ser guiados, é o conhecimento e prática da verdade da Palavra de Deus.

Devemos adquirir uma boa consciência pela Palavra, para que possamos estar seguros quanto a tudo o que a consciência nos indicar como aprovado ou reprovado.

 

J. I. Packer define consciência, como “o poder embutido de nossas mentes, de executar julgamentos morais sobre nós mesmos, aprovando ou desaprovando nossas atitudes, ações, reações, pensamentos e planos, dizendo-nos, em caso de desaprovação, que devemos sofrer por isto”.

Contudo, contrário ao que algumas pessoas ensinam, não é verdade que alguém sempre fará a coisa certa, se ouvir sua consciência, isso, porque a consciência é meramente uma função moral da mente, e não um padrão moral infalível — a Escritura é o único padrão moral infalível.

Paulo escreve que algumas pessoas “têm a consciência cauterizada”. [1 Tm 4: 2]

A consciência “pode ser mal informada, ou condicionada a considerar o mal como bem”, e “pode levar uma pessoa a ver como pecaminosa, uma ação que a Palavra de Deus declara como não pecaminosa”.

 

O que a consciência aprova não é necessariamente bom, e embora não seja seguro violar a consciência de alguém, o que ela desaprova não é necessariamente mal. [Rm 14: 1, 2; 23]
Somente os preceitos morais de Deus, como revelados na Escritura carregam autoridade final para fazer julgamentos morais, e não uma avaliação subjetiva baseada nessa função inata da mente - porém, à medida que a consciência de uma pessoa é mais informada e treinada pelas palavras da Escritura, ela se tornará crescentemente mais confiável ao fazer decisões morais.

Além disso, não somente a consciência bem informada e educada pela Palavra, é tudo quanto necessitamos, pois precisamos também de uma fé viva, atuante, e um coração e mente purificados e transformados, para que possamos experimentar e viver no amor sobrenatural de Deus, a Ele e ao próximo.

 

Em Ef 4: 15, 16, a relação dos crentes com Cristo é declarada, exatamente correspondendo à relação e união dos membros do corpo com a cabeça.

Afirma-se expressamente que, assim como há suprimentos de alimentos no corpo natural, comunicados da cabeça para os membros pela subserviência de todas as partes do corpo, destinadas para o crescimento e aumento do todo, em todas as partes - portanto, de Cristo, o cabeça da igreja (que Ele é em sua pessoa divina como Deus e homem), um suprimento de vida espiritual, força e nutrição é feito para cada membro do corpo para seu crescimento e edificação. Porque;

"nós somos membros de seu corpo, de sua carne e de seus ossos", [Ef 5: 30]

Somos feitos de Cristo, como Eva foi feita de Adão, mas continuando assim nEle como para ter todos os nossos suprimentos dEle;

"nós nele, e ele em nós", como o apóstolo diz em João 14: 20.

É expressamente afirmado que dEle, a cabeça, há nutrição.

"e não retendo a cabeça, da qual todo o corpo, suprido e bem-vinculado por suas juntas e ligamentos, cresce o crescimento que procede de Deus". [Cl 2: 19]

A nossa comunhão com Cristo é a fonte geradora de pensamentos espirituais em nós, pelo Espírito Santo.

Não somos espirituais se não abundarmos em pensamentos espirituais.

Como podemos saber, que estamos abundando em pensamentos espirituais?

Entre outros textos da Bíblia, o Salmo 119 nos dá este entendimento.

Considere o que o salmista expressa, como sendo sua delícia constante em ter pensamentos ininterruptos da lei de Deus; que era o único meio da revelação divina naquela época.

Tentem dirigir a si mesmos por aquele padrão; examinem a si mesmos se podem falar verdadeiramente as mesmas palavras juntamente com ele, pelo menos se não no mesmo grau de zelo, contudo com a mesma sinceridade de graça.

Você dirá:

“Mas esse era Davi! Eu não posso ser como ele”.

A isto eu respondo:

Estas coisas não estão escritas na Bíblia para mostrar o que eles eram, mas o que nós deveríamos ser. Todas as coisas relativas a eles, foram escritas para nossa advertência [I Co 10: 11] - e, se nós não temos o mesmo gozo em Deus que eles tiveram, a mesma espiritualidade em pensamentos e meditações das coisas divinas, nós não podemos ter nenhuma evidência de que agradamos Deus como eles fizeram, ou de que iremos para o lugar onde eles estão.

 

A profissão da vida com Deus, se tornou para muitos, numa fácil e baixa taxa; seus pensamentos são em sua maior parte, vãos e terrenos, e a comunicação deles sem gosto, e às vezes corrompe suas próprias vidas.

Os homens santos antigos, que obtiveram testemunho de terem agradado a Deus, não caminharam assim diante dEle.

Eles meditaram continuamente na lei; pensavam em Deus dia e noite, e em todos os momentos de suas vidas o serviram, o louvaram, e fizeram dEle o motivo de suas vidas. 

Não seria então, de se supor que a maioria de nossos pensamentos deveriam ser relativos a tais coisas espirituais, divinas e eternas?

Mas, onde estiver o nosso tesouro, lá estará também o nosso coração.

O que os homens consideram realmente, como seu tesouro?

Como eles consideram seu comércio, famílias e demais interesses terrenos?

Não é geralmente nisto, que costuma repousar a preocupação principal deles em comparação com outras coisas?

Os afetos de nossos corações atuam pelos pensamentos de nossas mentes, portanto se nosso tesouro principal é, como nós professamos, coisas espirituais e divinas (e que aflição será para nós, se não é assim!) neles estarão nossos afetos; por conseguinte, onde nossos desejos e pensamentos estarão fixados principalmente.

 

Se nós fizermos um exame melhor de nós mesmos por esta regra, nós temos que considerar os seguintes pontos principais, quanto aos nossos pensamentos:

(1) Há que se considerar especialmente, o grupo de homens que levantam cedo, vão tarde para a cama, e comem penosamente o pão que granjearam [Sl 127: 2], e que são particularmente industriosos e diligentes em seus negócios.

Estes homens, geralmente consideram, que seus pensamentos se encontram no devido lugar e em boa medida, mas a quase totalidade dos seus pensamentos se referem apenas, às coisas do  próprio interesse particular, que pode ser notado em suas conversações.

Eles se afirmam nisto, porque são louvados pelos demais homens pela sua diligência industriosa.

Que evidência então, podem ter de que são espirituais, quando o coração deles se recusa continuamente a atender o chamado do Senhor, a participar do seu banquete espiritual, porque estão compromissados com seus próprios negócios ?

 

Qual incompatibilidade haveria em terem seu coração continuamente no Senhor, enquanto cuidam dos seus próprios negócios?

Davi era um homem cheio de responsabilidades, pois tinha todo um reino para administrar, mas não se permitiu ficar afastado do seu Deus por um só dia, ou mesmo por horas, porque O louvava pelo menos três vezes ao dia, e sabia por experiência, que um só dia na presença do Senhor valia mais do que mil.

A industriosidade não pode ser uma justificativa para que o homem não seja espiritual, e que a abundância de seus pensamentos não seja, portanto relativa às coisas espirituais, divinas e eternas.

Todos nós professamos que estamos no rumo do céu, da imortalidade, e da glória; mas há qualquer evidência que nós realmente projetamos isto, se todos nossos pensamentos são consumidos sobre as ninharias deste mundo, nos deixamos dominar por elas, e se temos somente pensamentos ocasionais sobre as coisas de cima?

Esta regra inteira está fundamentada naquilo que nosso Salvador diz em Mt 6:31-34:

“Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos"?

"Porque os gentios é que procuram todas estas coisas, pois vosso Pai celeste sabe que necessitais de todas elas";

"buscai pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas".

"Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal”.

E, para nos deixar um exemplo prático quanto a isto, o Senhor exigiu de todos os seus apóstolos que deixassem tudo e todos, e O seguissem. Temos este testemunho na boca do próprio Pedro, que disse:

“ E disse Pedro: Eis que nós deixamos nossa casa e te seguimos.”

[Lc 18: 28]

 

Assim, Jesus nos proíbe que tenhamos qualquer pensamento sobre estas coisas terrenas, não de modo absoluto, mas com uma limitação dupla, a saber:

1º - Que não devemos ter qualquer pensamento sobre elas que nos levem a uma ansiedade de mente, por causa de uma desconfiança do cuidado paternal e providência de Deus. Este é o propósito do contexto.

2º - Nenhum destes pensamentos deve ter a constância e compromisso de nosso espírito, porque isto é devido somente às coisas espirituais.

“Buscai pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça”.

Deixe isso ser a coisa principal em seus pensamentos e consciências. Nós podemos então concluir ao menos, que eles têm que estar em nós numa proporção excedente, relativamente aos demais.

Ninguém se engane portanto, porque assim como o homem pensa em seu coração, assim ele é. E, de um coração que é governado por uma mente que tem pensamentos abundantes nas coisas divinas e eternas, é cheio de boas palavras de edificação.

Se pela minha industriosidade sou impedido disto, nada me justificará, porque o Senhor dá o pão àqueles que O amam, enquanto dormem. Não somos nós, mas Ele, que tem o governo sobre todas as coisas, e não seria sensato tentarmos prover para nós mesmos sem contar com a providência de Deus.

Assim há muita industriosidade que não passa afinal, de incredulidade no cuidado providencial do Senhor - que não passa de demonstração do orgulho e da arrogância de corações altivos que, cheios de dura amargura procuram edificar a cidade de suas vidas, sem contar com a graça e o amor de Deus.

A torre de babel não foi destruída pelo Senhor, porque sempre haverá muitos que empreenderão a continuidade da sua construção em seus corações. Aquela torre é símbolo da tentativa do homem, em colocar seu reino acima do reino de Deus.

Além disso, quando não buscamos primeiro o reino de Deus e sua justiça, será conhecido com grande frequência, quando nós estivermos comprometidos em deveres espirituais, que outros pensamentos se interporão, e se imporão às nossas mentes.

Esses pensamentos sobre coisas seculares terão o domínio do nosso coração - mesmo em nossas orações poderá ser visto onde está o nosso tesouro.

 

Nossas petições ansiosas em busca de coisas temporais, de sucesso terreno serão a tônica principal de nossas orações, mesmo que haja pensamentos espirituais se interpondo; ainda assim tal pessoa estará comprometida com seus interesses e negócios terrenos.

Ela nunca estará disposta a ceder qualquer espaço ou tempo, assim como fizeram os apóstolos, para cuidarem dos interesses do reino de Deus, porque não é isto que estão buscando primeiro, mas todas as coisas que as pessoas que não conhecem a Jesus (gentios) estão buscando no mundo.

A alegria que o crente estará buscando neste caso, é a mesma alegria que o ímpio busca no mundo.

O seu prazer não está nas coisas de Deus, como afirma o salmista no Salmo 119, porque a maioria dos seus pensamentos não são para o Senhor, mas para o que é terreno.


 

Silvio Dutra Alves
Enviado por Silvio Dutra Alves em 28/01/2022
Alterado em 30/08/2022
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